domingo, 6 de maio de 2012

Sob a sombra da crise, socialista chega como favorito para desbancar Sarkozy

Andrei Netto

PARIS – Convidado a apresentar suas primeiras medidas caso seja eleito o novo ocupante do Palácio do Eliseu, durante o debate televisivo realizado entre os candidatos à presidência da França, na quinta-feira, o líder do Partido Socialista (PS), François Hollande, repetiu 15 vezes a frase: "Eu, como presidente da República...". Hoje, a previsão tem tudo para se realizar.

Depois de 17 anos ausentes, desde o fim do mandato do ex-presidente François Mitterrand, os socialistas devem enfim recuperar o comando da França, batendo o atual presidente, Nicolas Sarkozy.

Embora alguns cientistas políticos ainda hesitam em reconhecer em público o amplo favoritismo de Hollande, o deputado e ex-secretário-geral do PS lidera todas as pesquisas de opinião sobre o segundo turno feitas pelo menos desde janeiro. Após vencer o primeiro duelo das urnas, há duas semanas, o socialista chega com escores que variam de 52% a 48% a 54% a 46% - consideradas amplas vantagens nas eleições francesas. Nessa configuração do eleitorado, dizem os institutos de pesquisa Ipsos, Ifop, TNS-Sofres, CSA, BVA, LH2 e OpinionWay, nunca um candidato a presidente foi surpreendido, perdendo a eleição para seu rival - no caso atual, o presidente Sarkozy - a 48 horas do voto.

A eventual vitória, se confirmada nas urnas às 20 horas de hoje, horário de Paris (15 horas, horário de Brasília), também representará a superação de um drama na história do PS. Há 10 anos, em 2002, o candidato à presidência pelo partido, Lionel Jospin, foi eliminado ainda no primeiro turno pelo extremista Jean-Marie Le Pen. O resultado foi uma década de falta de liderança, de desestruturação e de desunião no partido.

Para se reerguer, o Partido Socialista teve de se reinventar, o que fez em 2008, adotando uma nova "Declaração de Princípios" e abandonando termos como "revolução", "propriedade primitiva dos meios de produção" e "operariado". Nessa época, o partido reconheceu a ideia do "livre mercado" e da "economia mista", abandonando de vez as terminologias clássicas de um partido socialista. Um dos artífices desta reforma foi François Hollande, então secretário-geral do PS. Quatro anos depois, é o socialista o maior beneficiado pela reforma realizada no interior do partido. Desde que renovaram seu linguajar, os socialistas vinham traçando estratégias para assumir o poder nas eleições de 2012.

O sucesso da candidatura de Hollande, dizem analistas políticos, é fruto da modernização do partido, que voltou a ampliar sua base de eleitores. Mas também é produto de uma conjuntura econômica negativa na Europa, marcada pelo desemprego elevado, pela recessão aguda e pela contestação feroz e crescente sobre a eficácia dos planos de austeridade, defendidos pela chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e por Sarkozy. Outro forte motivo é a rejeição ao estilo pessoal - e personalista - do atual presidente, o mais impopular da história da Quinta República, inaugurada em 1956.

"Sarkozy parece definitivamente ter perdido porque foi incapaz de mudar sua imagem nas poucas semanas de campanha, depois de construí-la em cinco anos de governo", analisa Philippe Moreau-Defarges, cientista político do Instituto Francês de Relações Internacionais (Ifri).

Embora a imensa rejeição do atual chefe de Estado contribua para o resultado final, analistas políticos se mostram surpreendidos com o percurso sem falhas do socialista nos últimos 18 meses. Após ter liderado o partido por mais de uma década, entre 1997 e 2008, François Gérard Georges Hollande, de 57 anos, militante do PS desde 1979, deixou o comando sob críticas. Um ano e meio atrás, era dado como enterrado no partido. Saiu de cena, emagreceu, reconstruiu sua vida privada - depois de se separar da ex-candidata à presidência Ségolène Royal - e se preparou física e intelectualmente com o auxílio de especialistas para retornar à vida pública.

Em 2011, lançou sua pré-candidatura à presidência pelo PS, decidido a enfrentar o então favorito, o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, preso em maio em um escândalo sexual. Desde então, assumiu ele mesmo o favoritismo diante de Sarkozy, sempre se valendo o exemplo de François Mitterrand, que usou em discursos e gestos ao longo da campanha de 2012. Tido como "mole" por seus críticos, peitou Sarkozy no último momento da campanha, o debate de quarta-feira, garantindo o favoritismo. "Não podemos esquecer que votar Hollande não é votar contra Sarkozy", disse, orgulhoso, David Dumont, militante socialista que fazia campanha na sexta-feira, ainda impressionado pelo desempenho de seu campeão na campanha de 2012.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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