quinta-feira, 20 de abril de 2017

Câmara mantém contrapartidas

Contrapartidas na berlinda

Câmara e Alerj discutem obrigações que estados devem cumprir para receber ajuda da União

Bárbara Nascimento, Rafael Galdo, Luiz Ernesto Magalhães | O Globo

Depois da aprovação anteontem do socorro financeiro da União aos estados em grave situação financeira, na Câmara dos Deputados, o foco, agora, são as contrapartidas. O texto base recebeu 16 destaques, que começaram a ser votados ontem em Brasília, e todos tentam modificar o projeto, suprimir ou amenizar as obrigações ou requisitos que devem ser cumpridos pelos estados para se serem incluídos no Regime de Recuperação Fiscal. Entre os benefícios em jogo, está a possibilidade de suspender por três anos (prorrogáveis por mais três) o pagamento das dívidas com o governo federal, o que, no caso do Rio, representa a postergação de uma despesa que só este ano seria de R$ 5 bilhões. Também devem se beneficiar com as medidas os estados de Minas e do Rio Grande do Sul.

Durante a sessão de ontem, dois destaques ficaram prejudicados, dois foram retirados de pauta e dois foram rejeitados com resultado favorável ao governo, que conseguiu derrubá-los com uma ampla margem: o primeiro por 302 a 98 votos e o segundo por 303 a 51 votos. Outros destaques que estão na lista para serem votados ainda tentam alterar o artigo que impede novos reajustes, concursos e criação de cargos pelos três anos de vigência do regime. Há ainda o que permite aos governadores que aderirem ao programa de socorro não cumprirem alguns artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

ALÍQUOTA DE 14% DIVIDE OPINIÕES
O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, terá que lançar mão de toda sua habilidade política. Além do Congresso — outros 10 destaques ainda serão votados na semana que vem e o projeto ainda será apreciado pelo Senado —, ele terá que negociar com o presidente da Assembleia Legislativa do Rio, Jorge Picciani (PMDB), que tem se recusado a pôr na pauta, justamente, a votação de contrapartidas importantes. Picciani disse que só retomaria as votações do pacote de ajuste fiscal depois que os servidores estaduais recebessem os salários atrasados. O governo, por sua vez, só terá os recursos para colocar em dia a folha de pessoal se conseguir os empréstimos, mas para obtê-los precisa fazer o ajuste. Entre as principais contrapartidas, está o aumento da alíquota de contribuição previdenciária do funcionalismo público de 11% para 14%, que poderá garantir novas receitas para o Tesouro estadual. Picciani, que se recupera de uma cirurgia para a retirada de um tumor na bexiga, disse que pode rever sua posição sobre a pauta de votação.

Entre os deputados, tanto da base governista quanto da oposição, a expectativa é otimista, mas eles preveem dificuldade para obter consenso em alguns pontos. Para eles, está fora de cogitação, por exemplo, qualquer tentativa de aprovar, além do aumento da contribuição previdenciária, uma alíquota extra de 8%, proposta que chegou a tramitar no ano passado na Casa.

Apesar de todas as discussões e protestos gerados pelas tentativas anteriores de aumentar as alíquotas previdenciárias, André Ceciliano (PT), integrante da Mesa Diretora da Casa, que ocupa a presidência interinamente, acredita que, desta vez, a proposta deve ser aprovada.

— Acho que a alíquota de 14% passa. Agora há propostas como a obtenção de empréstimo e o adiamento da dívida com a União, que não existiam antes. As condicionantes hoje são duras? São. Mas acredito que, para o funcionalismo, é importante colocar os salários em dia — disse.

Colega de bancada e líder do PT, o deputado Gilberto Palmares tem opinião diferente:

— O PT é contrário a qualquer medida que cause prejuízos para os servidores ou que leve à redução de investimentos. Somos quatro deputados e três já votaram contra a autorização para vender a Cedae. Mas eventualmente podem surgir opiniões divergentes — disse Palmares, referindo-se ao aval que o Legislativo deu para a venda da Cedae.

Rafael Picciani (PMDB), que lidera a maior bancada da Alerj (14 deputados), disse que é preciso aguardar a votação do Senado. Ele, no entanto, não descarta que o partido vote favorável à proposta de aumentar a alíquota previdenciária mesmo sem que o estado tenha normalizado o pagamento dos salários. O Estado do Rio ainda não pagou o 13º dos servidores de 2016 e apenas servidores da área de Segurança (da ativa e aposentados) e professores (da ativa) já tiveram seus vencimentos de março pagos. O salário saiu na sexta-feira passada. O pagamento dos demais servidores relativos ao mês de fevereiro só foi efetuado na última segunda-feira.

— Quando o estado propôs em 2016 medidas de ajuste fiscal com aumento de alíquotas de contribuição, o quadro era outro. Não havia clareza sobre como aquelas medidas poderiam ajudar a reequilibrar as contas. Agora, com o acordo negociado com a União, o cenário é outro — observou Rafael Picciani.

Também membro da Mesa Diretora, Samuel Malafaia (DEM) não acredita que passe qualquer medida que possa impor mais sacrifícios ao servidor.

— Com notícias de corrupção todos os dias, vão propor aumentar o imposto do trabalhador assalariado? Eu vou votar contra. Acredito que não vai passar — criticou.

Para o líder do PSDB, Luiz Paulo Corrêa da Rocha, os quatro integrantes da bancada tucana deverão votar contra a aprovação de boa parte das contrapartidas:

— É um pacote de maldades contra os servidores, que não são responsáveis por essa situação. Não haverá reajuste salarial, o que já não acontece há dois anos, o estado fica impedido de fazer concurso público e também não poderá fazer novos planos de cargos e salários.

O líder do governo na Alerj, Édson Albertassi (PMDB), disse que pedirá urgência para a votação do projeto ao presidente da Alerj, Jorge Picciani.

— O importante é que o estado comece a sair da situação dramática que se encontra, voltando a pagar os servidores em dia e restabelecendo a normalidade dos serviços prestados à população — afirmou Albertassi.

BANCOS QUEREM GARANTIAS
Até agora, a principal contrapartida votada pela Alerj foi a autorização para a venda da Cedae, que recebeu 41 votos favoráveis e 28 contrários. A venda da companhia estadual é considerada fundamental para garantir um empréstimo inicial de R$ 3,5 bilhões junto a instituições financeiras. O dinheiro arrecadado com a privatização será usado para pagar salários atrasados de servidores do estado. Pezão estima que a operação possa estar concluída dentro de 60 dias.

Mas, segundo fontes do governo, as chances de o estado regularizar sua folha salarial, antes de as contrapartidas serem aprovadas, são praticamente nulas. O cenário, considerado improvável, só poderia ser revertido se o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux concedesse uma liminar, autorizando o estado a contrair empréstimos. Porém, mesmo isso, não solucionaria os problemas porque os bancos se ressentem de segurança jurídica para concretizar as operações. Há interesse do mercado financeiro em fazer os empréstimos, desde que sejam avalizados pela União para evitar o risco de um calote.

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