Como esperado, voto da ministra Rosa Weber, que era incógnita, foi decisivo para desfecho
Reynaldo Turollo Jr., Letícia Casado | Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Por 6 votos a 5, os ministros do Supremo Tribunal Federal negaram nesta quarta-feira (4), em sessão que durou quase 11 horas, o pedido de habeas corpus preventivo para evitar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A partir do quinto voto, da ministra Rosa Weber, o resultado contrário ao petista já era esperado. Rosa era vista como o fiel da balança para desempatar o resultado porque as posições dos magistrados já eram conhecidas. Seu voto era uma incógnita, e ela negou o pedido da defesa de Lula.
O pano de fundo da discussão do HC de Lula era a execução provisória da pena, a possibilidade de prender antes de esgotados os recursos nos tribunais superiores.
A ministra disse que, apesar de pessoalmente ser contra a execução provisória da pena, deveria seguir o entendimento da maioria que foi firmado em 2016. Naquele ano, o Supremo passou a autorizar a prisão de condenados em segunda instância.
Rosa acompanhou o relator, Edson Fachin, assim como Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello votaram por conceder o habeas corpus. Os dois primeiros votaram para que Lula não pudesse ser preso até julgamento dos recursos pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), a terceira instância da Justiça. Os três últimos, até o trânsito em julgado (fim dos recursos no STF).
A divergência em relação ao relator foi aberta por Gilmar, que pediu para antecipar seu voto porque tinha voo marcado para Lisboa no final da tarde.
Ao final, José Roberto Batochio, advogado de Lula, pediu que Cármen não votasse, por ser presidente da corte. A votação estava empatada em 5 a 5 e favoreceria o petista, mas os ministros discordaram do pleito.
Marco Aurélio, por fim, propôs que se mantivesse a liminar concedida no último dia 22 para proibir a prisão até a publicação do acórdão do julgamento desta quarta. Por maioria, a corte negou e cassou a liminar —Marco Aurélio e Lewandowski foram vencidos.
Em 2016, quando o Supremo passou a permitir a prisão após condenação em segundo grau, Rosa votou contra, e foi vencida. Nesta quarta, ela considerou que, como a defesa de Lula estava questionando uma decisão do STJ —que, em março, negou habeas corpus ao petista—, seu voto deveria seguir o entendimento da maioria, em respeito à posição do tribunal.
“Tendo integrado a corrente minoritária [em 2016], passei a adotar a orientação hoje prevalecente de modo a atender [...] o princípio da colegialidade, que é meio de atribuir institucionalidade às decisões desta Casa”, disse a ministra ao votar.
“Nessa linha, e sendo prevalecente o entendimento de que a execução provisória não compromete o princípio constitucional da presunção da inocência [...], não tenho como reputar ilegal, abusivo ou teratológico o acórdão [do STJ] que, forte nesta compreensão do próprio STF, rejeita a ordem de habeas corpus, independentemente da minha posição pessoal.”
Marco Aurélio e Lewandowski tentaram questionar o voto de Rosa, sob o argumento de que a fundamentação citada por ela engessa o tribunal ao inviabilizar mudanças de jurisprudência.
“Quem me acompanha nesses 42 anos de magistratura não poderia ter a menor dúvida com relação ao meu voto, porque eu tenho critérios e procuro manter a coerência das minhas decisões”, respondeu a ministra.
AÇÕES DE CONSTITUCIONALIDADE
O posicionamento de Rosa no caso concreto de Lula não significa que, mais adiante, ela não possa votar contra a execução provisória da pena, se a corte vier a discutir de forma abstrata a constitucionalidade da medida.
Há duas ADCs (ações declaratórias de constitucionalidade) sobre o tema, de relatoria do ministro Marco Aurélio. Ele as liberou para julgamento em dezembro, mas a presidente do STF, Cármen Lúcia, tem se recusado a incluí-las na pauta.
Duas semanas atrás, Marco Aurélio pretendia levar ao plenário uma questão de ordem para pedir a Cármen para votar as ADCs. Ele disse que desistiu da ideia após a presidente anunciar que o habeas corpus de Lula seria julgado, pois acreditava que cada ministro votaria conforme sua convicção.
“Se arrependimento matasse, eu seria um homem morto”, desabafou nesta quarta.
O mandato de Cármen como presidente da corte termina em setembro. Ela será substituída por Toffoli, que poderá, então, marcar o julgamento das ADCs para rever a jurisprudência.
Lewandowski disse que o dia foi paradigmático. “É um dia em que esta Suprema Corte colocou o sagrado direito à liberdade a um patamar inferior ao direito de propriedade. Uma pessoa pode ser levada à prisão antes de decisão condenatória transitada em julgado, em franca e frontal afronta ao que estabelece de forma clara e taxativa a nossa lei maior”, disse.
Ao votar, Celso de Mello foi o único que comentou as declarações do comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, que disse na terça (3) em uma rede social ser contra “a impunidade” --frase entendida como uma pressão sobre o STF.
Sem citar nomes, o decano falou que “insurgências de natureza pretoriana” fragilizam as instituições democráticas, e que o regime militar trouxe “dias sombrios” que sufocaram o poder civil.
A decisão contrária a Lula não significa que sua prisão será imediata. O processo do tríplex de Guarujá (SP), que levou à sua condenação, ainda cumpre formalidades no Tribunal Regional Federal da 4ª Região e não esgotou sua tramitação na corte de segunda instância.
No último dia 26, o TRF-4 julgou recursos chamados embargos de declaração e manteve a condenação. O prazo para a defesa tomar conhecimento do julgamento termina na sexta (6).
Depois, os advogados têm dois dias úteis —até terça (10)—para protocolar novo recurso. O costume do TRF-4 é de rejeitar esse novo recurso, mas, até lá, considera-se que o processo ainda corre na segunda instância. Após a rejeição, um ofício é encaminhado ao juiz Sergio Moro, responsável por ordenar a prisão.
PRÓXIMOS PASSOS
O que Lula pode fazer a partir de agora, com o habeas corpus negado
RECURSOS
A defesa de Lula pode apresentar novo recurso, conhecido como embargos dos embargos, ao TRF-4 até terça-feira (10)
Outra opção é não apresentar os embargos dos embargos e recorrer de uma vez aos tribunais superiores, mas isso é pouco provável, pois aceleraria o processo, decretando logo a conclusão do trâmite em segunda instância, e a provável prisão de Lula
Se ele apresentar, o TRF-4 deve rejeitar o recurso sem julgar, conforme histórico do tribunal. O trâmite é esgotado na 2ª instância
PRISÃO
O juiz Sergio Moro poderá, então, executar a prisão
TRIBUNAIS SUPERIORES
A defesa pode apresentar ao TRF-4 os recursos para o STJ e STF. É a vice-presidência do TRF-4 que deve se manifestar sobre os argumentos para que o caso seja enviado para os tribunais superiores
Se o TRF-4 negar a solicitação, a defesa pode encaminhar um agravo ao STJ pedindo que o caso seja apreciado em Brasília
ELEIÇÃO
Condenado em 2ª instância, Lula está sujeito à Lei da Ficha Limpa. A proibição para a candidatura só ocorreria após registro no TSE, que pode ser feito até 15.ago
Mesmo se estiver preso, Lula pode registrar candidatura; o TSE terá que considerar se ela é válida, já que o candidato precisa estar no pleno exercício dos direitos políticos
Caso tenha seu registro de candidatura negado, Lula poderia recorrer ao STF. Em tese, ele poderia concorrer e fazer campanha até 17.set, data limite para o PT trocar de candidato
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