A Advocacia-Geral da União (AGU) expediu, em fevereiro, uma orientação normativa a respeito da não necessidade da intervenção do Poder Judiciário para coibir a invasão e a ocupação irregular de prédios públicos. A medida não tem nenhum pendor autoritário. Trata-se da prudente aplicação do Direito na proteção do patrimônio e da continuidade dos serviços públicos. O Estado e a população não podem ficar reféns de quem, afrontando a lei, usa a violência para fazer pressão política, difundir suas bandeiras ou apropriar-se de bens públicos para fins particulares.
Apesar de não encontrar respaldo na legislação, o entendimento contrário – de que, diante, por exemplo, de uma invasão de uma repartição pública, a autoridade nada podia fazer sem antes recorrer à Justiça – deu azo a omissões da administração pública e serviu de estímulo para outras tantas desordens. Se o invasor tem a certeza de que não enfrentará resistência para ocupar um prédio público e de que só um mandado judicial poderá retirá-lo de lá, ele tem a garantia de que, ao menos por um tempo, seus atos criminosos prevalecerão sobre a boa ordem.
No caso da administração pública federal, antes da nova orientação, a praxe era que os administradores de prédios públicos deviam recorrer à AGU para que ela tentasse junto ao Poder Judiciário obter medida liminar de reintegração de posse. Evidentemente, não era um modo muito eficiente de proteção do patrimônio público.
Produzida pela Consultoria-Geral da União (CGU), um órgão da AGU, a nova orientação possibilita que os gestores de prédios públicos atuem com mais segurança jurídica e mais eficiência. Eles poderão tomar providências – acionar a autoridade policial, por exemplo – ainda nos primeiros momentos de uma invasão, evitando assim que ela se consolide. “A relevância desse entendimento é impedir que se crie mais uma demanda judicial, para desafogar o Poder Judiciário de uma demanda desnecessária, além de preservar com mais eficiência o patrimônio público e a continuidade da prestação dos serviços públicos. Isso dará maior eficiência à administração e resguardará melhor o patrimônio dos danos decorrentes de ocupações, afirmou Victor Ximenes Nogueira, diretor do Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos da CGU.
Aprovada pelo advogado-geral da União, André Mendonça, a orientação normativa deve ser observada por toda a administração pública federal. Está claro, portanto, que a autoridade pública tem o direito e o dever de atuar para proteger o patrimônio público e a continuidade dos serviços.
“Impedir a invasão ou ocupação dos imóveis públicos é dever do gestor, para fins de garantir sua utilização adequada, sua preservação, a manutenção de sua finalidade legal ou contratual”, diz o documento da AGU. Cabe, portanto, ao administrador do prédio público acionar as forças policiais a fim de prevenir e repelir atos de invasão e ocupação ou de utilização diversa da destinação prevista pela autoridade competente.
Seria incongruente que o particular, na defesa do seu patrimônio pessoal, pudesse realizar atos de autodefesa, enquanto o poder público tivesse de assistir passivamente a agressões ao patrimônio público. O Direito assegura meios de proteção tanto do patrimônio particular como do público. Nos dois casos, como é lógico, os atos de proteção devem ser moderados e proporcionais à agressão sofrida. Eventuais abusos no exercício desse direito de autodefesa devem ser investigados e punidos. O que não faz sentido é que esse direito – que, no caso da administração pública, é um dever – de repelir a violência seja tolhido a priori por receio a um possível abuso. É essa estranha lógica que a AGU veio corrigir.
O dever por parte da administração pública de prevenir e repelir atos ilegais contra prédios públicos, sem precisar recorrer à Justiça, não é uma opção pela eficiência em detrimento do bom Direito. É antes o cabal cumprimento de dois importantes princípios do Direito – o da indisponibilidade dos bens públicos e o da continuidade dos serviços públicos. O interesse público agradece esse cuidado.
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