- O Globo
Na contramão de Trump e Bolsonaro, o presidente de Portugal usou a tribuna da ONU para criticar o nacional-populismo e a xenofobia. Ouvir seu discurso é um alento em tempos bicudos
Há 45 anos, Portugal era um país atrasado, submetido a uma ditadura carola e fechado para o mundo. Hoje é uma nação moderna, que atrai imigrantes e cresce acima da média europeia. Virou o destino preferido de brasileiros que fogem do desemprego e da violência urbana.
Na terça-feira, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa representou o país na Assembleia Geral da ONU. Ele fez um discurso incisivo contra o nacional-populismo, a intolerância e a xenofobia. Sem citar nomes, criticou líderes que se dizem patriotas e fingem ignorar desafios urgentes, como as mudanças climáticas e a crise migratória.
Na contramão de Donald Trump e seus imitadores, o português disse que o mundo precisa de mais multilateralismo e cooperação internacional. “Há 80 anos, começava a Segunda Guerra. Vale a pena parar um minuto para tirar as lições desse passado próximo”, afirmou.
Ele lembrou que “ninguém é uma ilha”, nem os países mais poderosos. “É fundamental manter o diálogo, a prevenção de conflitos, as iniciativas pelo interesse comum. Há que resistir à tentação de olhar para o nosso ego, o nosso poder, a nossa próxima eleição”, advertiu.
Conhecido como professor Marcelo, o presidente reafirmou valores que andam fora de moda, como o respeito às minorias e aos direitos humanos. Ele condenou a tendência de “não aceitar os outros, rejeitar os outros, fazer de conta que o resto do mundo conta menos”.
“Somente aqueles que não conhecem a História, e portanto não se importam em repetir os erros do passado, minimizam o papel das Nações Unidas”, sentenciou.
Portugal disse estar fazendo a sua parte: participa de oito missões de paz, defende o Acordo de Paris e apoia o Pacto Global para Migração, torpedeado pelo Itamaraty da “nova era”. Elegante, o presidente só mencionou o Brasil para defender sua entrada no Conselho de Segurança da ONU — mais uma bandeira histórica que Jair Bolsonaro deixou de lado em Nova York.
Em tempos bicudos, é um alento ouvir as lições do professor Marcelo. Sem recorrer ao teleprompter, ele ocupou a tribuna por 16 minutos, metade do tempo usado pelo capitão. O discurso está no YouTube. Até Bolsonaro pode assisti-lo: o presidente falou em português.
Nenhum comentário:
Postar um comentário