- Folha de S. Paulo
Antes de demitir secretário, presidente reclamou de devassa na vida de parentes
O presidente fez um baita alarde ao anunciar que havia demitido o chefe da Receita para impedir a volta da CPMF. Se a criação do tributo fosse mesmo uma ideia inadmissível, Jair Bolsonaro também deveria mandar embora o ministro Paulo Guedes. Poderia pensar até em renunciar ao cargo.
Bolsonaro sempre atacou a CPMF, mas admitiu à Folha, na semana passada, a possibilidade de apoiá-la desde que houvesse "uma compensação para as pessoas". Em outra entrevista, publicada há dois dias pelo jornal Valor Econômico, Guedes celebrou o tributo e disse que poderia arrecadar R$ 150 bilhões com ele.
A contribuição sobre movimentações financeiras era uma pílula amarga para o presidente, mas Marcos Cintra não era seu único simpatizante. A defesa que ele fazia do tributo pode ter justificado a demissão, mas foi apenas a gota d'água.
O secretário da Receita estava há tempos à beira do precipício. Cintra sofria pressões do Palácio do Planalto pela substituição de servidores em postos do comando no Rio, e Bolsonaro reclamava abertamente de uma "devassa" que era feita pelo órgão sobre as vidas de seus parentes.
A Receita virou motivo de problema para o presidente. A dor de cabeça aumentou quando Cintra passou a dar contornos mais nítidos à nova CPMF, expondo o presidente a ataques de sua própria base política.
O plano de cobrar um tributo sobre cada pagamento feito pelos cidadãos incomodou tanto o Congresso (que deu bola preta para a ideia) quanto os apoiadores fiéis do governo nas redes sociais. Bolsonaro agiu como de praxe e fritou o auxiliar.
A mudança dá ao presidente a oportunidade de retomar as rédeas da reforma tributária, que quase se perdeu na confusão. Resta saber se o governo vai aproveitar para saciar a vontade de interferir nas atividades de investigação do órgão.
Na semana passada, o presidente mandou recado ao secretário. "O Cintra às vezes levanta a cabeça, mas eu vou lá e dou uma nele", disse. Chegou a hora da pancada definitiva.
Nenhum comentário:
Postar um comentário