- O Estado de S.Paulo
O governo que demite Galvão do Inpe é o que nomeia Vélez e Weintraub para o MEC
Depois os bolsonaristas de internet reclamam, sejam eles robôs de carne e osso ou meramente robôs, mas que jeito? Como deixar de comentar as falas, os posts e os vexames do governo, se o presidente Jair Bolsonaro e um ministro daqui, outro dali, dão a chance de mão beijada?
O mesmo presidente que demitiu o cientista Ricardo Galvão do Inpe – e de forma humilhante, antecipando pela imprensa – nomeou o curioso e meteórico professor Ricardo Vélez Rodríguez para o MEC e o substituiu em meses por outro “olavista”, o igualmente curioso, mas aparentemente não tão meteórico Abraham Weintraub.
Galvão é formado em Engenharia, tem doutorado em Engenharia Nuclear nada mais nada menos no MIT e, não satisfeito, ainda é livre-docente em Física. Depois de demitido por Bolsonaro, encerrou 2019 como um dos dez cientistas do ano na revista Nature.
Mas o principal troféu do professor foi outro, ainda bem mais objetivo, concreto: a ratificação dos dados do Inpe sobre o desmatamento na Amazônia. O governo, que demitiu Galvão após desacreditar e desqualificar os dados do Inpe, agora confirma, acredita e qualifica os mesmos dados. Bolsonaro vai readmiti-lo por justa causa?
Do outro lado, Vélez Rodríguez virou motivo de piada e Weintraub tem demonstrado uma certa birra com a língua portuguesa. Errar uma palavra pode acontecer nas melhores famílias, mas o ministro da Educação errou a primeira vez, a segunda vez e, agora, a terceira vez. É reincidente. E, cá para nós, não foram errinhos banais.
“ParaliZação”? “SuspenÇão”? “ImpreCionante”? Sem falar em crases...
Já que os Bolsonaros têm uma milícia digital bastante ativa, poderiam destacar uns três ou quatro soldados para fazer a revisão do que o ministro escreve. Ou, quem sabe?, criar um corretor ortográfico particular para ele.
Afora esses erros crassos contra a língua pátria, o ministro já atacou as universidades que, segundo ele, são focos de balbúrdia e de plantio de maconha. Enquanto isso, o presidente Bolsonaro chama o patrono da Educação brasileira, Paulo Freire, de energúmeno, e anuncia a “descentralização (essa é com Z mesmo) de investimentos da área de Humanas, como filosofia, sociologia e, deduz-se, antropologia.
Nesse contexto, faz todo o sentido que o presidente tenha nomeado quem nomeou para a Secretaria Nacional de Cultura, um órgão que pula de galho em galho, está cada vez mais contaminado pelo viés evangélico e foi empurrado bruscamente para o Ministério do Turismo. O que uma coisa tem com a outra? Não se sabe. Perguntem ao presidente, por favor.
Universidades, filosofia, sociologia, antropologia, cultura, cinema, teatro e ortografia estão, portanto, dentro de um mesmo saco: o das desimportâncias, dos que não servem para nada e estão dominadas pelas esquerdas internacionais que só pensam naquilo: destruir o Ocidente cristão.
Assim como Paulo Freire é um “energúmeno”, os livros didáticos são também um horror, “um montão, um amontoado de muita coisa escrita”, como definiu Bolsonaro. E vem aí uma reforma para “suavizar” esses livros. A tal “raça em extinção” está de olho...
Com Bolsonaro xingando Paulo Freire e criticando livros com muitas “coisas escritas”, mais o ministro da Educação escrevendo “paraliZação, suspenÇão e impreCionante”, dá um frio na barriga imaginar as políticas de educação e cultura e como ficarão os livros didáticos.
Mas ainda há tempo. O presidente não nomeou o professor Mozart Neves Ramos para a Educação, mas por que não Ricardo Galvão? Professor, homem da ciência, belo currículo, cidadão do bem. E, aliás, com um português claro, direto e... correto.
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