Antes do estrago econômico do vírus já havia os danos da gestão Bolsonaro
O Brasil se move, mas falta uma longa subida para a economia atingir o patamar de fevereiro, anterior à queda de 13,9% acumulada em março e abril. Mesmo com o crescimento de maio, de 0,7%, a situação ainda é de muita fragilidade, alertou o pesquisador Claudio Considera, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), ao apresentar os novos números do Monitor do PIB. Elaborado mensalmente, o Monitor tem sido, há anos, a antecipação mais detalhada e mais precisa dos dados oficiais do Produto Interno Bruto (PIB). No trimestre móvel terminado em maio a queda foi de 10,5% em relação ao período encerrado em fevereiro.
Consertar de fato a economia, no entanto, envolverá muito mais que anular os efeitos do último tombo. A queda em relação a 2019 também foi grande – e 2019 já foi muito ruim. Em maio, o PIB ficou 13,3% abaixo do nível de um ano antes. Quando a referência é o trimestre móvel, o confronto interanual mostra uma perda de 9,4%.
O coronavírus complicou, portanto, um quadro já muito desfavorável. No ano passado o PIB cresceu apenas 1,1%. A produção geral da indústria aumentou 0,5%. A da indústria de transformação aumentou mísero 0,1%. Serviços avançaram 1,3%, com expansão igual à da agropecuária. A economia fracassou no primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro e piorou no começo de 2020, quando encolheu 1,5% em relação aos três meses finais de 2019.
Foi esse o cenário – completado por amplo desemprego – atingido no fim de março pelo impacto inicial da pandemia. O presidente da República e sua equipe haviam adiantado a destruição. Ainda assim, o vírus tornou o quadro bem mais feio, espalhando medo, matando milhares, confinando famílias e arrasando uma economia já muito fraca.
Em maio, segundo a FGV, indústria de transformação, comércio e parte dos serviços começaram o retorno, depois da queda nos dois meses anteriores. A agropecuária, o setor mais eficiente da economia brasileira, continuou avançando.
Também no comércio exterior o agronegócio se distinguiu. No trimestre de março a maio o valor de suas vendas externas foi 33,8% maior que o de um ano antes. No conjunto, no entanto, as exportações de bens e serviços foram 1,3% menores que as de igual período de 2019. O recuo das importações foi bem maior (5,2%), puxado principalmente pela retração de 31,7% nas despesas com serviços, com destaque para a redução das viagens internacionais.
Do lado da demanda, o consumo das famílias no trimestre móvel foi 10,1% inferior ao do ano anterior. No caso dos bens semiduráveis, o recuo foi de 52,8%, puxado principalmente pela redução de gastos com roupas e calçados, um efeito nada surpreendente do distanciamento social. O investimento produtivo, medido como formação bruta de capital fixo, recuou 17,1% no mesmo tipo de comparação. A maior queda, de 30,1%, ocorreu nas compras de máquinas e equipamentos.
Em maio, o investimento equivaleu a 13,4% do PIB, com ligeira alta em relação a abril (12%). Mas continuou bem abaixo dos padrões históricos e muito longe do nível necessário a um crescimento econômico seguro. Taxas iguais ou superiores a 24% do PIB têm sido observadas em países emergentes mais dinâmicos do que o Brasil.
Não se espera, a curto prazo, uma retomada importante dos investimentos privados. As indústrias de transformação, hoje com muita capacidade ociosa, poderão atender o mercado, ainda por muitos meses, sem novas máquinas e equipamentos. Qualquer contribuição do investimento à retomada econômica, no curto prazo, terá de vir de outra fonte – de obras de infraestrutura, da reativação do programa habitacional ou de uma combinação dessas políticas.
Soluções como essas dependerão de um setor público muito mais ágil e mais eficiente do que tem sido desde o ano passado. O consumo privado também poderá contribuir para a dinamização dos negócios, mas as famílias precisarão estar menos apertadas e menos inseguras do que hoje. O governo está diante de um respeitável quebra-cabeça. Não deu sinal, por enquanto, de estar pronto para uma resposta realista e eficaz.
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