Alheio
ao precipício fiscal, Bolsonaro segue sua aposta na balbúrdia
O
presidente da República é um galhofeiro. Em visita oficial a um dos Estados
mais pobres do País, em plena pandemia, o máximo que seu repertório
intelectual, humano, administrativo e social permite é fazer piada homofóbica com a cor de um refrigerante.
Isso
um dia depois de seu ministro do Meio Ambiente, o mesmo que já carrega na
capanga dois acidentes ecológicos graves, sucessivos recordes de desmatamentos
e queimadas na Amazônia e o Pantanal incinerado, ter usado um apelido de humorístico mexicano para responder a uma
cobrança política feita a ele pelo presidente da Câmara por outra infantilidade
parecida.
Esse estado de infantilismo governamental já vem cobrando um preço alto nos excruciantes 22 meses deste governo, mas olhar a balbúrdia comendo solta quando o que se avizinha é o precipício fiscal, tão bem descrito em artigo recente aqui no Estado por Nathan Blanche, da Tendências, é ainda mais assustador.
O
ministro Paulo Guedes falou em audiência virtual ao Congresso nesta
semana que passou. Tentou de novo fazer o Jogo do Contente que já lhe rendeu
memes e perfis satíricos nas redes sociais com previsões tão otimistas quanto
furadas.
Pediu
aos deputados e senadores a votação de projetos que podem ajudar, no seu
entender, a destravar a academia. O que mais repercutiu, no entanto, foram seus
renovados ataques ao colega Paulo Marinho.
A
insistência nessa briga com um ministro de pasta claramente menos apetrechada
que a poderosa Economia, além da defesa subsequente de Bolsonaro a Marinho e
episódios em que a equipe de Guedes fica falando sozinha, como o do decreto
revogado de estudos para parcerias público-privadas em saúde, são reveladores
da tibieza do ministro hoje.
Tanto
que o mercado se preocupou mais com a briga pública entre Rodrigo Maia e Roberto
Campos Neto, justamente pela pauta travada, que com de Guedes.
Aturdidos com a inação do governo diante da pressão inflacionária, da dívida
insustentável, do desemprego recorde, da falta de saída para a reforma
tributária, da iminente implosão do teto de gastos, da falta de saída para o
fim do auxílio emergencial e outras bombas econômicas, investidores,
economistas, banqueiros, analistas econômicos e empresários já veem Campos Neto
como um sucessor possível, com menos disposição a vender quimeras e mais
sobriedade para negociar o que é preciso ser feito e nunca sai do papel.
Acontece
que há algo que precede qualquer eventual mudança ministerial: o presidente.
Bolsonaro não está nem aí para a emergência fiscal e econômica. Isso só o abala
quando e se mexe no ponteiro de sua popularidade, algo a que ele se agarra com
o afinco de quem não percebe que ela nem é tão alta e nem é duradoura.
Foi
o presidente que deu ordem clara a Guedes para não criar nenhuma marola de
temas espinhosos enquanto durasse a eleição, porque achou que só porque voltou
a ser recebido por puxa-sacos em aeroportos iria “varrer o PT do mapa”, a única
questão que sua imaginação limitada é capaz de alcançar.
Não
rolou, até aqui. Aliás, nem para ele nem para o PT, num sinal de que 2020, com
todos os seus flagelos concretos, pode fazer o País começar uma caminhada rumo
a alguma racionalidade política.
Faltam
15 dias para o primeiro turno. Enquanto isso, a Comissão Mista de Orçamento
segue paralisada por uma briga intestina na capenga base bolsonarista, o que
nos deixa sem política fiscal clara para 2021, um ano que não será do
pós-pandemia, o que já seria um pesadelo, mas o ano 2 da pandemia.
Guedes
está com a caixa de ferramentas vazia. E Bolsonaro está mais preocupado em
sacudir o Guaraná Jesus e abrir para ver se espirra na cara do País. E se
possível em fazer algum gracejo nojento enquanto chacoalha.
*Editora do BR Político e apresentadora do programa Roda Viva, da TV Cultura
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