Se
cada um brasileiro se dispuser a falar e a agir, é de esperar-se um futuro
melhor
A
única vantagem que os mais velhos podem eventualmente ter é que já viveram
situações difíceis. Elas não deixaram saudades. Os que se aproximam dos 90 anos
(questão de três meses no meu caso) passaram pela Segunda Grande Guerra; viram
a migração do Nordeste tocada pela pobreza e, mais tarde, a do Sul, abrindo
fronteiras no Oeste e ocupando terras; passaram pelo golpe de 1937, viram outra
vez, de lado político distinto, o movimento de 1964 (em ambos os momentos,
carreiras foram cortadas, e mesmo vidas ceifadas, às vezes pela tortura) e
viram a democracia voltar a ser um valor. A liberdade é como o ar que
respiramos: sem dar-nos conta, é dele que vivemos. Basta cortá-lo para
aparecerem consequências nefastas.
Daí
que veja com apreensão o momento atual. O país sofre de uma crise sanitária
gravíssima (talvez só comparável com o que ocorreu na “gripe espanhola¨ em
1918/9); ainda está com as dificuldades econômicas, devidas não apenas à
recessão, mas também à utilização de tecnologias poupadoras de mão de obra, as
quais, sem que haja dinamismo na produção, mostram com clareza as dificuldades
para a obtenção de empregos. E ainda por cima, temos um governo que não oferece
o que mais precisamos: serenidade e segurança no rumo que estamos seguindo.
Nem tudo se deve à condução política do presidente. Convém repetir: ele foi eleito pela maioria e disse o que faria.... Fez; e não deu certo. Em função disso, para onde vai o país? Primeiro, não julgo que seja suficiente distribuir “culpas”. Há várias culpas e vários culpados, interna e externamente. Sejamos realistas: ainda que o residente fosse capaz de conter seus ímpetos, não nos livraríamos do vírus que nos atormenta. Mas poderia haver menos mortos. A credibilidade dos que mandam é quase tão eficaz para conter desatinos como a competência dos serviços de saúde para evitar mortes.
A
semana que passou dava a sensação (a meu ver, falsa) de que corríamos o risco
da volta ao autoritarismo. O símile com situações autoritárias do passado não
ajuda a entender as opções disponíveis. Houve, sim, uma forte movimentação de
comandos militares. Mas, para dizer em termos simples: trocamos seis por meia
dúzia. Cada chefe militar tem, é natural, suas características e manias. Nenhum
dos atuais comandantes, antigos ou novos nos postos, imagina que “um golpe”
resolve a situação. Não sei o que se passa na cabeça presidencial, mas ainda
que desejasse um “golpe”, com que roupa? Basta ler as declarações dos militares
que partiram ou dos que chegaram: quase todos falam em respeitar a Constituição
e agir dentro da lei.
Não
me parece haver clima, no país e na parte do mundo a que estamos mais
vinculados, para aventuras. Dado o porte de nossa economia e a quantidade de
questões sociais e econômicas a serem enfrentadas, por que uma pessoa razoável
aumentaria nossas angústias? E as que não são razoáveis? Estas precisam dispor
de um clima favorável a suas loucuras, o que não me parece ser o caso.
Sendo
assim, aumenta a responsabilidade de cada um dos cidadãos: devemos dizer, com
firmeza, sim ao que queremos, e não ao que nos assusta. Não é hora de calar,
nem de fazer algazarra. Aproveitemos o quanto possível para, com equilíbrio,
mostrar a insensatez de concentrar poderes nas mãos de quem quer que seja,
pessoa ou instituição.
Defendamos
a Constituição, que é democrática, e saudemos os políticos que creem que é
melhor apoiar quem possa chegar à Presidência sem representar um extremo.
Apresentemos aos brasileiros, quanto antes, um programa de ação realista, que
permita juntar ao redor dele os partidos e as pessoas para formar um centro,
que seja progressista, social e economicamente. Centro que não pode ser
anódino: terá lado, o da maioria, o dos pobres; mas não só, também o dos que
têm visão de Brasil e os que são aptos para produzir.
Quem
personificará este centro? É cedo para saber. É cedo para “fulanizar”, como
diria Ulysses Guimarães. Mas é hora de promover a junção das forças capazes de
se contraporem a eventuais estrebuchamentos autoritários, antes que surjam
propostas que nos levem a eles. Vejo que alguns políticos se dispõem a agir
para evitar que a mesmice predomine. Pelo menos é o que deduzo das declarações
recentes de vários líderes da vida brasileira. A eles juntarei minha voz. Sei
das minhas limitações e não tenho a ilusão de que, ao escrever que a eles me
juntarei, a situação mudará. Mas, se cada um brasileiro se dispuser a falar e a
agir, é de esperar-se um futuro melhor.
Na política, como na vida, ou se acredita que é possível mudar e obter algo melhor, ou se morre por antecipação. Continuemos, pois, vivendo: propondo mudanças, sempre com a expectativa de que elas podem ocorrer e com elas o Brasil ficará melhor.
Um comentário:
Sr Fernando Henrique por que não inclui entre os culpados da gravíssima recessão que o país enfrenta os desmandos,incompetência e avassaladora corrupção das administrações petistas??
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