Presidente deu relato falso sobre atuação na pandemia e disse que nunca xingou ministro, mas já chamou Moraes de 'canalha'
Matheus Teixeira, Renato Machado, Ricardo Della Coletta / Folha de
S. Paulo
BRASÍLIA - O presidente
Jair Bolsonaro (PL) colocou
condições para aceitar os resultados das eleições e mentiu, durante sabatina no
Jornal Nacional nesta segunda-feira (22), ao tratar de ações na pandemia da
Covid-19 e ao negar que tenha xingado ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).
Ele foi o primeiro candidato ao Planalto a
participar da série de entrevistas com presidenciáveis no programa da TV Globo.
Durante a sabatina, houve
panelaços em diversas capitais do país.
No ano passado, Bolsonaro chamou o
ministro Alexandre
de Moraes de "canalha". Além disso, diante de apoiadores,
já chamou
o ministro Luís Roberto Barroso de "filho da puta".
Após ter dito no JN que nunca xingou algum
magistrado do Supremo, o apresentador do programa, William Bonner, recordou do
episódio em que chamou
Moraes de "canalha".
Bolsonaro, então, admitiu que atacou o
magistrado, mas disse que o entrevero teria sido apenas com ele —e omitiu o
xingamento a Barroso.
No Jornal Nacional, Bolsonaro também mentiu
sobre as ações do governo na pandemia, ao negar ter barrado
a compra de vacinas.
O mandatário começou a entrevista mais calmo, dando respostas em um tom sereno. No decorrer do programa, porém, ficou mais irritado, principalmente após ser questionado se tinha algum arrependimento por ter imitado pessoas sem ar ao comentar os problemas da Covid-19.
Ele, porém, disse que foi solidário às
vítimas da pandemia. "A solidariedade eu manifestei conversando com o povo
nas ruas, visitando as periferias de Brasília, vendo pessoas humildes que foram
obrigadas a ficar em casa sem ter um só apoio de governador ou prefeito",
disse.
Bolsonaro também voltou a levantar dúvidas
sobre a segurança das urnas eletrônicas, citando informações que já foram
rebatidas pelo TSE (Tribunal Superior
Eleitoral) e pela própria PF.
O delegado Victor Neves Feitosa Campos,
responsável pelo inquérito sobre o ataque hacker ao sistema do TSE que o
presidente costuma citar, disse em depoimento à corporação que não encontrou
indícios de que a ação pudesse ter resultado em manipulação de votos, fraude ou
problemas na integridade das urnas.
O presidente foi cobrado pelos apresentados
a assumir um compromisso de que respeitará o resultado das eleições.
No entanto, novamente colocou uma
condicionante de que faria isso se considerar que as eleições foram
"limpas" —o que ele nega ocorrer, já que segue colocando em dúvida o
sistema eleitoral do país.
"Serão respeitados os resultados das
urnas desde que as eleições sejam limpas", afirmou o presidente.
Em outro momento, Bolsonaro foi questionado
sobre as ações antidemocráticas de seus apoiadores, como a recorrente defesa da
ditadura militar em manifestações em seu favor.
Respondeu que se trata de "liberdade
de expressão". "Quando alguns falam em fechar o Congresso, é
liberdade de expressão deles. Eu não levo para esse lado."
Bolsonaro tem feito neste ano seguidos
ataques ao sistema eleitoral e aos ministros do STF para acusar uma suposta fraude
caso não vença as eleições.
O sistema eletrônico de votação, porém, foi
exaltado e ovacionado diante de Bolsonaro na
posse do ministro Alexandre de Moraes como presidente do TSE, na semana
passada.
A retórica golpista do presidente inclui
ainda o flerte com as Forças
Armadas, que participam de uma comissão de transparência eleitoral e, na
prática, têm sido uma das linhas de frente do questionamento do presidente às
urnas.
O ataque mais grave às urnas ocorreu em 18
de julho, quando ele chamou embaixadores estrangeiros para expor suas mentiras
acerca das urnas e do processo eleitoral, repetindo argumentos já descartados
após sua exposição em uma live no ano passado.
A reação veio no último dia 11, com um ato
que reuniu milhares de pessoas para a leitura de duas cartas
de apoio à democracia na Faculdade de Direito da USP. A primeira carta
foi endossada por entidades como a Fiesp e centrais sindicais. Já a segunda,
inspirada na Carta aos Brasileiros de 1977, ultrapassou 1 milhão de
assinaturas.
No JN, Bolsonaro afirmou que não retardou a
compra de vacinas e repetiu as alegações de que a Pfizer pretendia impor
condições impraticáveis para fornecer os imunizantes. A CPI da Covid, no
entanto, apontou que as propostas da farmacêutica americana ficaram meses sem
resposta.
O presidente também se negou a afirmar que
a aliança com o centrão foi contraditória em relação à campanha de 2018, quando
costumava criticar duramente o grupo político composto por partidos de centro.
Bolsonaro aproveitou a oportunidade para
elogiar seus ministros, mas deixou de fora da lista expoentes desse bloco que
estão na Esplanada, como o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira,
e o chefe das Comunicações, Fábio Faria.
Ao ser questionado sobre desmatamentos, o
presidente respondeu que há 30 milhões de brasileiros vivendo na região e que
isso deve ser foco de preocupação do governo. Na sequência, Bolsonaro ainda
criticou o Ibama por destruir o maquinário das pessoas que devastam as
florestas.
"A destruição [dos equipamentos], como
está em lei, é se você não puder tirar o equipamento daquele local. O que vinha
acontecendo e ainda vem, infelizmente, é que o material pode ser retirado do
local, porque se chegou lá pode ser retirado e há o abuso de uma
parte...", afirmou o presidente, sendo questionado de quem partiria o
abuso. "Por parte do Ibama", acrescentou.
Bolsonaro também repetiu a estratégia usada
em debates de 2018 e foi à entrevista com anotações na mão, com as seguintes
palavras: Nicarágua, Argentina, Colômbia, Dario Messer. As críticas do
mandatário aos três países, que são comandados por governantes de esquerda, são
recorrentes.
Em relação a Messer, que ele não mencionou
na entrevista, a anotação ocorreu porque o doleiro já disse, em delação
premiada, que realizou repasses de dólares em espécie à família Marinho, dona
do Grupo Globo.
Em nota emitida na época, os proprietários
da emissora negaram as acusações de Messer e ressaltaram que o doleiro não
apresentou provas.
Ao final da entrevista ao JN, o presidente
transmitiu em suas redes uma live, a partir do carro onde estava. Nela, voltou
a chamar apoiadores para os atos do 7 de Setembro. Lembrou que haverá desfile
militar, pela manhã, em Brasília, e que
à tarde estará no Rio de Janeiro, com apresentações das Forças Armadas.
Nesta semana também serão sabatinados pelo
JN os candidatos Ciro Gomes (dia
23), Luiz
Inácio Lula da Silva (25) e Simone Tebet (26).
Apesar de Bolsonaro fazer críticas
recorrentes à Globo e de já ter até orientado sua militância a não assistir a
emissora, a entrevista ao Jornal Nacional foi tratada pelo entorno do
presidente como um dos momentos mais importantes da campanha.
Bolsonaristas prepararam uma grande
mobilização nas redes sociais para aumentar a repercussão da sabatina. A
hashtag #BolsonaroNoJN foi usada em postagens nas redes sociais por ministros
do governo, por filhos do mandatário e por outros aliados.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o
ministro das Comunicações, Fábio Faria (PP), publicaram nas redes um vídeo no
qual Bolsonaro olhava para o celular e um interlocutor falava "olha a cara
do presidente preocupado hoje com o JN". Bolsonaro então respondia:
"Vou dar um beijo no [William] Bonner hoje."
A aposta de estrategistas da campanha era
que a participação do mandatário no telejornal de maior audiência do país
pudesse alavancar o presidente nas pesquisas e ajudar a expor ações do governo
federal.
A entrevista concedida em 2018, por exemplo, foi amplamente explorada por seus
apoiadores na época durante todo o período eleitoral.
Na ocasião, Bolsonaro defendeu a ditadura militar, espalhou fake news sobre
livros distribuídos às escolas e questionou o salário da apresentadora Renata
Vasconcellos.
O então candidato apresentou um exemplar do livro "Aparelho Sexual e
Cia." e disse erroneamente que a obra havia sido entregue em colégios
públicos. Na ocasião, porém, a Cia. das Letras, que editou o livro, afirmou que
a publicação nunca foi distribuída em escolas pelo MEC (Ministério da
Educação).
A Fundação Biblioteca Nacional, ligada ao Ministério da Cultura, comprou, em
2011, 28 exemplares do título, que foram distribuídos em bibliotecas públicas
—não nas escolas.
O MEC, em 2016, já havia negado que tivesse
adquirido exemplares desse título.
Nas negociações sobre a participação de
Bolsonaro no JN neste ano, a campanha chegou a exigir que
a sabatina fosse realizada no Palácio do Alvorada, argumentando que
Luiz Inácio Lula da Silva (2006) e Dilma Rousseff (2014) tiveram o mesmo
tratamento quando tentaram a reeleição.
O presidente depois cedeu e aceitou
ir aos estúdios da emissora no Rio de Janeiro. A participação no programa
acontece em um momento de crescimento de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de
voto, que ocupa o segundo lugar, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
Levantamento do Datafolha divulgado na
semana passada mostrou que o
presidente conseguiu diminuir para 15 pontos percentuais a diferença para o
líder Lula. A diferença entre os dois na pesquisa anterior, de 28 de julho,
era de 18 pontos.
Essa foi a primeira pesquisa Datafolha divulgada após o início do pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600.
4 comentários:
O que observamos ontem não foi uma entrevista de uma emissora com o presidente da república candidato a reeleição
O que nós vimos foi um tribunal de Inquisição em que os entrevistadores acusaram ironizaram, interromperam insinuaram mentiras, interromperam de novo… O jornalismo da Globo lixo se fez manifestar como sempre;
Vale tudo para denegrir a imagem do presidente Bolsonaro
Ora Sr. Anônimo, quando se entrevista um bandido como Bolsonaro, tem mesmo que ser inqisidor. Afinal ele mesmo sempre diz que bandido não merece ser bem tratado. Então, ele e seus filhos e asseclas que se preparem.
O primeiro anônimo reclama de barriga cheia. Os entrevistadores nem perguntaram sobre as rachadinhas, o enriquecimento familiar comprando apartamentos em dinheiro vivo, o operador financeiro Queiroz, a defesa da tortura, as milhares de mentiras desde o primeiro dia do mandato, a indicação do Eduardo Bananinha Bolsonaro para a embaixada nos EUA, a reunião ministerial de abril de 2020 e tantas otras cositas más...
Não vi a entrevista,verei dos outros candidatos.
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