O Estado de S. Paulo.
Esquerdas e direitas se uniram em torno de um bem maior: a preservação da própria democracia
A teoria dos jogos é um ramo da matemática
que pode inspirar o debate democrático. Imaginemos dois contendores que pensam
de forma diferente, mas vislumbram um bem maior. “Em alguns momentos o jogador
A tem de ceder, em outros é o jogador B. São os chamados ‘jogos de
coordenação’”, diz o economista Felippe Clemente, pesquisador da Universidade
de Lisboa e especialista no assunto. Ele é o entrevistado do minipodcast da
semana.
Transposto para o universo político, esse bem maior seria uma visão de futuro para um país. Todos os brasileiros estão de acordo, por exemplo, com o fato de que precisamos acabar com a pobreza. Liberais, conservadores, social-democratas e socialistas têm ideias diferentes sobre como fazer isso. Para cumprir o objetivo no futuro, cada corrente tem de ceder um pouco no presente. “A democracia é feita desses jogos de coordenação”, diz Clemente.
Nesta semana os brasileiros assistiram a
uma cena destinada a entrar para a história: chefes dos três Poderes,
acompanhados de todos os governadores, desceram juntos a rampa do Palácio do
Planalto. Esquerdas e direitas se uniram em torno de um bem maior: a preservação
da própria democracia.
Sim, porque essa cena grandiosa seguiu-se a
um dos momentos mais sórdidos de nossa trajetória recente: o dia em que delinquentes
bolsonaristas vandalizaram as sedes do Executivo, Legislativo e Judiciário. Um
quadro de Di Cavalcanti foi destruído a facadas, e o brasão da República foi
atirado à rua.
Em nota conjunta, os chefes dos Poderes
classificaram os bolsonaristas de “terroristas”, “vândalos”, “criminosos” e
“golpistas”. Todos os termos se aplicam de alguma forma. Só não se aplica a
palavra “patriota”, com a qual os bolsonaristas se autodefinem. Em sua fúria
destruidora, a horda achincalhou vários símbolos da Pátria.
Voltemos à teoria dos jogos. O Brasil tem
vários problemas importantes a resolver. Nenhum deles se relaciona com a
segurança das urnas ou banheiros unissex. Precisamos, entre outras coisas,
levar educação a nossos jovens e saneamento às moradias carentes, além de
preservar a floresta, que é nosso principal patrimônio como nação. São temas
dessa magnitude que devem compor nossa visão de futuro.
A democracia brasileira parecia uma
conquista consolidada, até que um nicho extremista passasse a clamar por golpe na
frente dos quartéis e, dias mais tarde, perpetrasse o crime que nos envergonhou
aos olhos do mundo. Ainda bem que nos unimos para defendê-la. A democracia é o
bem maior entre nossos bens maiores. Sem ela não há visão de futuro – nem mesmo
futuro. •
3 comentários:
O golpe não começou com os patriotários na frente dos quarteis. O boçal já sonhava com esse golpe desde o século passado vide meu artigo neste espaço O golpe que Bolsonaro vai dar. O que era uma obsessão individual virou um projeto de poder da direita internacional. Por sorte a campanha de Lula-Alckmin também virou um projeto de defesa da democracia da esquerda internacional.
Encontrei o artigo de Fernando Carvalho no blog do próprio.
Obrigado, Ademar Amancio. O blog do Gilvan tem um buscador no canto superior esquerdo onde a gente digita um assunto ou nome de articulista que aparece tudo.
Postar um comentário