Folha de S. Paulo
Casos no exterior apresentam alternativas
para enfrentar desafio da habitação, mas há resistência da sociedade
Com as eleições de
2024, o debate sobre os temas municipais vai se intensificar. Um dos dramas das
grandes cidades é o aumento da população em situação de rua. De acordo com
relatório do Ministério dos Direitos Humanos, o CadÚnico registra 236.400
pessoas vivendo em situação de rua, em 64% dos municípios brasileiros.
Não é uma questão trivial de resolver. Diversos fatores contribuem para a situação de rua, como a exclusão econômica, desemprego e déficit habitacional, juntamente com a ruptura de laços familiares e problemas de saúde física e mental. Segundo levantamento do Ipea, problemas familiares ou com companheiros motivaram 47,3% das pessoas em situação de rua a deixarem suas casas. Em comparação, o desemprego foi mencionado por 40,5%; o consumo problemático de álcool e outras drogas, por 30,4%; e a perda de moradia, por 26,1%.
Similarmente, 60% das pessoas em situação de
rua não residem na cidade de origem. O movimento geral é das periferias em
direção aos centros metropolitanos. Dos cerca de 236 mil, 10.586 são
estrangeiros. Segundo o estudo do Ipea, 69% das pessoas em situação de rua são
negras (51% pardos e 18% pretos), com uma média de idade de 41 anos. Jovens
entre 18 e 29 anos representam 15% e pessoas de 50 a 64 anos somam 22%.
Experiências internacionais trazem luz à
questão. Para sanar a falta crônica de moradia, o programa "Housing
First" da cidade de Newark, em Nova Jersey, oferece habitação simples e
permanente para pessoas sem-teto, independentemente de vícios ou emprego. Ao
longo do ano, a política alcançou uma redução de 58% no número de desabrigados.
O projeto também visa enfrentar a situação de
rua a partir do levantamento de dados em tempo real e do aprimoramento das
abordagens nas ruas. Além disso, os agentes públicos melhoraram o acesso e
serviços nos abrigos, aprimoraram o acesso a serviços de saúde mental e
ofereceram opções de espaço mais flexíveis. A iniciativa também disponibiliza
aconselhamento e assistência médica para abordar questões como dependência
química e problemas de saúde mental. Por que não simplesmente copiamos esse
tipo de modelo?
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No Brasil, há dois problemas. O primeiro é
que, mesmo quando há vagas em abrigos, muitos sem-teto se recusam a ir por
conta de regras arbitrárias, falta de espaço para carrocinhas e animais,
instalações precárias e superlotação, além de preocupações com segurança. O
segundo é a resistência dos moradores do entorno das moradias temporárias. Nos
últimos meses, uma obra foi vandalizada na zona leste de São Paulo e
moradores de rua relataram sofrer hostilidade e agressão.
Ou seja, ao mesmo tempo em que os eleitores
querem menos pessoas nas ruas, eles são contra as soluções possíveis. Esse
paradoxo abre margem para que políticos apresentem remédios mágicos e
equivocados como a destruição de pertences de moradores de rua ou mesmo
internação compulsória. Seres humanos fragilizados e sem condições de cuidar de
si mesmos precisam ser acolhidos. Esse objetivo precisa estar aliado à
segurança da população para circular nas vias públicas a qualquer momento do
dia.
Vale ficar em alerta contra candidatos que
apresentem soluções que não conciliam essas duas coisas. Que venham as eleições
em 2024.
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