domingo, 4 de fevereiro de 2024

Celso Rocha de Barros – A Nova Indústria Brasil

Folha de S. Paulo

Incentivar inovação deve ser prioridade do governo, mas pontos da NIB ainda não são claros

No último dia 22, o governo anunciou o programa Nova Indústria Brasil (NIB), que busca retomar a industrialização brasileira, interrompida nos anos 80 do século passado.

NIB foi recebida com desconfiança por quem lembra do fracasso de políticas intervencionistas de governos anteriores, como a tentativa de criar "campeões nacionais" ou as isenções fiscais do governo Dilma. Essas coisas foram caras, não reverteram a tendência de declínio do setor industrial brasileiro e falharam como tentativa de "pacto entre capital e trabalho": terminaram com os patos da Fiesp na rua. Um desastre.

Os críticos da NIB têm, portanto, lá suas razões. Mas não é o caso de descartar a NIB por princípio. Muitos países fazem política industrial com sucesso.

Em entrevista à Folha, o diretor de Planejamento e Estruturação de Projetos do BNDES, Nelson Barbosa, disse que os erros do passado não serão repetidos: a taxa dos empréstimos para o setor privado será a de mercado, ao contrário do que ocorreu no governo Dilma. Os empréstimos com taxa direcionada seriam voltados para setores que podem produzir externalidades positivas, como a conversão ecológica da economia ou a inovação tecnológica.

É uma diferença importante, e positiva. Mas o governo ainda precisa nos contar muito mais detalhes sobre o que pretende fazer, em especial quando nos couber pagar os impostos de alguém que ganhará isenção.
      
Tampouco me pareceu claro como será a integração das universidades e centros de pesquisa nos projetos de inovação tecnológica, e a própria ideia de "digitalização" (missão 4) me pareceu vaga (talvez por ignorância minha). Não achei suficientemente demonstrado que as medidas propostas bastem, por exemplo, para que indústrias de supercondutores se instalem no Brasil.

Concordo inteiramente que incentivar a inovação deve ser uma prioridade. Mas ainda não entendi no que o novo plano é melhor, nessa área, do que iniciativas anteriores, como a Lei do Bem, de 2005, que a NIB propõe atualizar de maneira ainda não muito clara.

Na verdade, parte importante da NIB está fora do que se convencionou chamar de política industrial: a conversão ecológica da economia (missão 5 da NIB) e os investimentos em infraestrutura urbana (missão 3), por exemplo, parecem mais investimentos em infraestrutura do que política industrial, e são duas boas ideias.

Por fim, devemos nos perguntar quem coordenará o imenso esforço de integração ministerial previsto na NIB. Em um texto produzido a pedido do governo brasileiro ("Innovation-Driven inclusive and sustainable growth: challenges and opportunities for Brazil"), a economista Mariana Mazzucato notou uma certa sobreposição de políticas: a Fazenda tem a conversão ecológica, a Casa Civil tem o PAC, o MDIC propôs as missões da NIB, o BNDES tem seus próprios projetos.

Mazzucato sugeriu a centralização do controle na Casa Civil ( pág. 9) ou no Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (pág. 14). Duvido que essa disputa seja pacífica.

Enfim, se o governo tiver consciência de que política industrial pode complementar, mas não substituir, reformas institucionais e investimento em capital humano, o debate é bem-vindo.

 

4 comentários:

Mais um amador disse...

Perfeito.
A conferir.

marcos disse...

"Enfim, se o governo tiver consciência de que política industrial pode complementar, mas não substituir, reformas institucionais e investimento em capital humano, o debate é bem-vindo."

Celso de Barros é militante do PT;viveu uns 10 anos à custa da gente fingindo que trabalhava no Bacen, enquanto mandava ver no seu blog NPTO, fazendo a campanha de Lula e Dilma.

Ora, quais são as reformas constitucionais que ele sugere ou sugeriu no NPTO, Em Pauta e FSP? Afinal, é ele quem diz, são complementares. Se são, deveriam vir depois!

Cínico,é rato pulando fora desse navio ridículo chamado NIB, que é apenas mais um...

MAM

Anônimo disse...

REINDUSTRIALIZAÇÃO É SEMPRE UMA PROPOSTA DO PRESENTE PARA O FUTURO.
■■O Brasil está no passado precisando vir para o presente.

■■■Realmente, aqui uma reflexão crítica relativamente bem feita de petista assumido ou assimilado desta mais uma proposta de reindustrialização feita por um governo do PT -- -a 1ª que alguma vez eu vi deste colunista.

■O autor fez uma reflexão crítica importante, mas não deixou que o seu viés escancarado o influenciasse::
=》 " Os críticos da NIB têm, portanto, lá suas razões. Mas não é o caso de descartar a NIB por princípio. Muitos países fazem política industrial com sucesso."

■■■Os R$300Bilhões anunciados em um " programa de reindustrialização" já seria desaconselhável de saída em qualquer país que não contasse com R$0.05 no cofrinho e ainda houvesse acabado de sair de mais um ano trágico na economia, em que o déficit foi maior que gigantesco 2% do PIB, a receita com impostos caiu mais de Rs40Bilhões, a dívida pública caminha para 80% do PIB, a geração de empregos perdeu 40% de fôlego em relação ao ano anterior, está havendo perda de renda per capta, a formação bruta de capital e a formação de capital humano é negativa.

■■Um país assim está precisando de reformas duríssimas e urgentes hoje para ficar de pé amanhã. De partida, se não completar de forma séria a Reforma da Previdência, não privatizar ou fechar a montanha de estatais que ainda controla e não fizer muito correndo uma Reforma Administrativa, um país que nos últimos 20 anos gastou R$1,7Trilhões em políticas dizendo que era para reindustrializar e se d.e.s.i.n.d.u.s.t.r.i.a.l.i.z.o.u não pode, sem se mexer um milímetro para se limpar dos seus erros gigantes, anunciar mais R$300Bilhões, a maioria em forma de subsídios, sim, para a indústria arcaica e poluente em um mundo que em poucos anos vai dar uma banana para os poluidores porque já não é mais possível enfumaçar o mundo.

■■■ Só vou colocar aqui uma pequena pecinha para decoração da mesa da proposta de reindustrialização antiga que já começa com o engodo de ser chamada de "Nova"::
=》50% dos alunos que completam o 2° ano do ensino fundamental no Brasil não sabem ler.

■■■Parece que há muitas outras coisas a serem feitas no Brasil antes de gastar mais R$300Bilhões dizendo que é para reindustrializar, em um mundo movido à informática e inteligência artificial e no Brasil de déficit fiscal e meninos que não sabem ler letreiro de propagandas de indústrias.

■E depois que retomar o saneamento do Estado e da economia, que foi bem iniciado em 1993 e seguiu até 2006 e depois foi em parte desfeito, talvez que ao fim das reformas saneadoras o governo nem precise, a não ser pontualmente, fazer nenhuma proposta de política de reindustrialização nem gastar centenas de $Bilhões para isso, porque os meninos que agora nem leem amanhã, com as reformas, poderão ler e é bem provável que eles mesmos façam essa reindustrialização, sem gastar um dinheiro que o Brasil não tem...E sem $Bilhões em corrupção.

marcos disse...

Muito bem, Edson Luiz.

MAM