quinta-feira, 4 de abril de 2024

Luiz Carlos Azedo - Esqueletos da Bahia assombram o Palácio do Planalto

Correio Braziliense

Lula é muito grato a Rui Costa pelo apoio que teve na Bahia. Também não é de jogar ao mar companheiros leais, mas tem que realizar um governo sem escândalos de corrupção

Tudo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não precisava era de uma denúncia de corrupção no governo da Bahia na gestão do hoje ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. A empresária Cristiana Prestes Tadeo, da empresa Hempcare, citou o ministro em delação premiada, na investigação da Polícia Federal (PF) que apura fraude na compra de respiradores durante crise provocada pela pandemia de covid-19, em 2020. O ministro nega, mas o assunto é nitroglicerina para o Palácio do Planalto.

O caso foi revelado pelo repórter Hugo Marques, da revista Veja. A empresária devolveu R$ 10 milhões aos cofres públicos, como contrapartida para ter benefícios processuais, além de dar detalhes e entregar documentos que comprovariam as irregularidades, como extratos bancários.

A Hempcare recebeu R$ 48 milhões do governo da Bahia, mas não entregou nenhum respirador pulmonar. A então vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que foi o braço direito do ex-procurador-geral da República Augusto Aras, que é baiano, negociou a delação.

Segundo a Veja, Cristiana admitiu que o contrato com a empresa Hempcare era desfavorável ao governo da Bahia. Uma das cláusulas previa pagamento adiantado. Além disso, a empresa não possuía as documentações necessárias para importar equipamentos hospitalares e nenhum agente público solicitou o certificado e registro da Anvisa.

Cristina teria recebido informações privilegiadas e, por causa disso, apresentou proposta de preço de US$ 28.900 por respirador. O contrato para venda de 300 aparelhos respiradores totalizou R$ 48 milhões, conforme cotação do dólar à época.

Rui era também presidente do Consórcio Nordeste, cujos estados receberiam os respiradores. A empresária disse que a contração da empresa foi intermediada por um empresário que se apresentou como “amigo” do então governador da Bahia e da mulher dele, Aline Peixoto.

A situação do hoje ministro se complicou porque o ex-secretário da Casa Civil do governo baiano Bruno Dauster disse em depoimento à PF que recebeu sinal positivo de Rui para avançar nas tratativas com a Hempcare. O então governador, segundo disse aos investigadores, foi o responsável por passar o contato de Dauster à empresa.

Danos de imagem

A Hempcare distribuía medicamentos à base de canabidiol e tinha capital social de R$ 100 mil. Conforme os registros, a empresa só contava com dois funcionários. Como o contrato foi assinado, e o valor de R$ 48 milhões adiantado, a empresa já não conseguiu fazer a compra dos equipamentos na China nem no mercado nacional.

Diante do atraso, Rui determinou a abertura de inquérito na Polícia Civil, mas a PF entrou no caso quando chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), porque desvio de recursos do SUS são casos da esfera federal. À época, havia uma grande polêmica entre o presidente Jair Bolsonaro, que denunciava irregularidades na compra de respiradores, e os governadores, que conseguiram na Justiça que o SUS obtivesse as vacinas contra a covid-19. Bolsonaro é negacionista e se recusou a tomar o imunizante, embora tenha conseguido um atestado falso de vacinação.

Por causa do inquérito, cresce o estresse entre Rui Costa e o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, mantido no cargo pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. O vazamento da informação aumentou a tensão.

Os esqueletos nos armários do governo da Bahia vieram bater à porta do Palácio do Planalto num momento de queda de popularidade de Lula por conta do desempenho insatisfatório do governo. Também há muitas reclamações contra o ministro da Casa Civil de parte de seus colegas da Esplanada.

Por sorte, o Congresso está desmobilizado, com as sessões suspensas na Câmara e baixíssima frequência no Senado. Entretanto, a oposição fará muito barulho na próxima semana e os aliados “mui amigos” de Lula se aproveitarão para aumentar o poder de barganha junto ao governo.

O presidente é muito grato a Rui pelo apoio eleitoral que teve na Bahia, decisivo para sua volta ao poder nas eleições de 2022. Também não é de jogar ao mar os companheiros leais, sobretudo os que permaneceram ao seu lado no período em que esteve preso em Curitiba.

Mas tem que realizar um governo sem escândalos, para exercer não só o poder político, como também a liderança da sociedade. Sua eleição foi um crédito de confiança que precisa ser honrado. Por isso, Rui não depende apenas da gratidão de Lula para permanecer na Casa Civil. O ministro precisa sobreviver ao desgaste da imagem.

 

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