domingo, 7 de abril de 2024

Míriam Leitão – Economia e a popularidade

O Globo

A conexão não está tão clara, mas se a inflação estivesse alta, seria fator de queda de aprovação

O governo se perde no emaranhado dele mesmo, numa gestão que tem muitos pontos positivos e muitos ruídos desnecessários. Na economia, a administração surpreendeu os céticos, mas trava uma batalha por dia, sem união do governo em torno do projeto que está entregando ao país a inflação baixa e algum crescimento. Há uma impressão errada de que a economia não está trazendo popularidade. Experimentasse o governo uma política que levasse à alta de inflação, para ver no que isso resultaria. O mundo está com uma conjuntura muito específica, com o adiamento sucessivo do início da queda dos juros americanos. Num cenário assim, há menos tolerância de investidores com os erros nos países emergentes, como essa bagunça em torno da Petrobras.

A notícia de que a criação de empregos, não agrícolas, tinha sido mais forte do que o esperado nos Estados Unidos fez com que o Fed desse sinais de que em vez de começar a reduzir os juros em julho, seria em setembro. Isso muda o fluxo de capitais no mundo. Um integrante do Banco Central ao ver a notícia, me disse: “Já estou pegando minha toalhinha branca para entrar na sauna que o Fed vai nos colocar.” É uma forma de dizer que a redução dos juros aqui acaba sendo afetada. Na mesma sexta em que saiu esta notícia, o Brasil amanheceu no meio da brigalhada em torno do comando da Petrobras, assunto no qual o governo segue um roteiro de intrigas, vaidade e intervencionismo.

A Fazenda está tentando administrar um problema sempre difícil que é a renegociação da dívida dos estados. Perguntei a um integrante do governo, por que aceitaram fazer novas concessões a governadores, alguns dos quais têm sido gastadores.

— A gente teve que tomar a frente disso, estava começando a ter movimentos muito descontrolados, com algumas ideias não razoáveis que poderiam se acumular e ir para o Congresso ou o Judiciário. A gente acaba sendo impelido a buscar um caminho.

A solução passa por uma redução dos juros, que representará uma queda de receita futura de R$ 8 bilhões por ano.

— Você vai remunerar menos um ativo, o que é um custo não comparável ao prejuízo de um perdão parcial da dívida com efeito retroativo, ou ter que receber ativos por duas vezes o valor.

O Nordeste tem uma dívida menor e um dos pedidos é tomar dívidas em bancos públicos e privados por 20 anos em lugar de 12, para equiparar às captações internacionais. Mas fizeram dois pedidos que são mais nocivos, um aumento do Fundo de Participação dos Estados e o direito de não pagar integralmente os precatórios. Esse último foi a manobra do bolsonarismo, da qual o governo federal está se livrando a um custo alto.

Na semana passada, surgiu outra frente de conflitos com a decisão do senador Rodrigo Pacheco que levou à manutenção da desoneração dos municípios. Na Fazenda, a convicção é que isso é inconstitucional. Mas será difícil num ano de eleições municipais.

As batalhas do Ministério da Fazenda são muitas e complexas. Nem falei de todas. O ano, segundo pessoas que ouvi na área econômica, está muito mais tenso na relação com o Legislativo e, na convicção de uma das fontes que escutei, pode piorar, quando houver troca de comando nas duas casas do Congresso. O Banco Central está com os olhos na área externa.

— A preocupação principal hoje é o cenário internacional e isso é para todos os bancos centrais. A piora recente que a gente vê no preço dos ativos está ligada à ideia de que aumentou a incerteza e a dúvida sobre o que o Fed pode fazer — me disse um dirigente.

A preocupação com a popularidade é normal. O risco, na economia é que, no esforço de aumentar a aceitação, sejam tomadas decisões populistas. Isso leva a mais inflação e derruba o crescimento. O fim é menos apoio. Hoje a ligação entre economia e aprovação política é menos evidente. Isso em todos os países. Nos Estados Unidos, por exemplo, o economista Larry Summers, ex-secretário do Tesouro, escreveu um artigo dizendo que a economia está bombando, os economistas sabem, mas não o cidadão.

Ao tentar entender esse descolamento no Brasil é preciso ter em mente que, se o efeito da melhora da economia na aprovação não está claro, a piora na economia, com queda do PIB, inflação alta, e aumento do desemprego, certamente cobraria um custo alto. O certo para o governo é fortalecer a política que nos trouxe até aqui.

 

Um comentário: