sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Na crise bancos lucram mais e empresas perdem

DEU EM O GLOBO

Os bancos brasileiros conseguiram aumentar seus lucros na esteira da crise global. Enquanto isso, grandes empresas - como siderúrgicas e mineradoras, que perderam mercado principalmente no exterior - viram seus resultados desabarem no ano passado. Um levantamento com 22 balanços publicados até ontem mostra que os lucros no setor produtivo encolheram 44% em 2009. A Vale, por exemplo, teve um lucro de R$ 10,249 bilhões, mas isto significou uma queda de 51,8%. O Banco do Brasil, que expandiu sua carteira de empréstimos e reduziu juros por ordem do presidente Lula, ganhou 15% mais e registrou o maior lucro, em reais, da história das instituições financeiras no país. O BB está investigando o vazamento do seu resultado para um órgão de imprensa.

Bancos ganham, empresas perdem

Com resultado recorde do BB, setor registrou lucro 15% maior em 2009. Ganho de companhias não financeiras caiu 44%

Wagner Gomes

Impulsionado pelo forte crescimento da carteira de crédito e também por receitas extraordinárias com a Previ, o Banco do Brasil anunciou ontem um lucro líquido de R$10,148 bilhões em 2009, o melhor resultado da história do setor, deixando para trás os principais concorrentes privados. Em relação a 2008, a variação chegou a 15,3%. O ganho do BB - que sofreu pressão do governo para aumentar as operações de empréstimo durante a crise financeira e reduzir os juros - também bateu com folga o balanço já divulgado por algumas empresas não financeiras. Só perde, por enquanto, para a Vale, que fechou o ano passado com ganho de R$10,249 bilhões. Em bases recorrentes, ou seja, sem considerar os efeitos extraordinários, o lucro do BB no ano passado foi de R$8,506 bilhões, ainda assim uma alta de 27,2%.

Com 22 balanços de empresas não financeiras publicados até ontem, entre eles o de Vivo e Light, além da Vale, o lucro líquido foi de R$19,928 bilhões, contra R$35,697 bilhões em 2008, o que representa queda de 44,1%. A rentabilidade sobre o PL também sofreu maior recuo que nos bancos: de 19,8% para 12%. A amostra foi afetada pelos resultados de empresas que dependem do mercado externo, caso da Vale, cujo lucro em 2009 despencou 51,8% (para R$10,249 bilhões).

Com o resultado do BB, chegou a R$37,797 bilhões o lucro acumulado por uma amostra de 20 instituições financeiras que já divulgaram seu balanço em 2009, o que representou um aumento de 15,19% sobre 2008. Considerando apenas os seis maiores bancos de varejo, essa variação foi de 14,8% (para R$36,128 bilhões).

Banco do Brasil investiga vazamento

O presidente do banco, Aldemir Bendine, disse, durante a entrevista coletiva para anunciar os resultados, que a instituição está investigando o vazamento da informação do balanço. O lucro foi publicado ontem pelo jornal "Brasil Econômico". Como o BB tem ações negociadas em Bolsa, todo o mercado deve ter acesso a informações como essa ao mesmo tempo.

- Estamos investigando a origem dessa divulgação. O banco tem tomado um cuidado especial em relação a esse vazamento de resultado. Nós alteramos recentemente a nossa publicação no site e na CVM com horário mais tardio, para que não houvesse esse tipo de situação. Infelizmente, de novo, isso se repetiu. Nós vamos procurar apurar esses fatos - disse Bendine.

O balanço do BB, que já considera os números integrais da Nossa Caixa e de parcela do Votorantim (compradas no início de 2009), foi engordado por uma receita extra de R$3 bilhões referentes à contabilização de ganhos atuariais não reconhecidos do plano de aposentadoria de seus funcionários. Ao longo dos anos, o BB e os funcionários contribuíram num volume maior do que a necessidade efetiva para financiar as obrigações futuras desse plano de aposentadoria. Esse excesso de contribuições acabou sendo investido em ativos que geraram ganhos extras para o fundo, segundo Marco Giovane Tobias, gerente de Relações com Investidores do BB.

O grosso do resultado no ano passado saiu mesmo dos empréstimos. A carteira de crédito total somou R$300,8 bilhões, 33,8% a mais do que em 2008, com destaque para o segmento de pessoa física (mais 88,1%, para R$91,79 bilhões). Nenhuma outra instituição registrou variação tão expressiva. No Itaú Unibanco foi de 2,4%, enquanto no Bradesco foi de 6,8%. Já as receitas com empréstimos aumentaram 22%, passando de R$33,221 bilhões para US$40,515 bilhões. Para 2010, o BB prevê uma expansão de 18% a 23% de sua carteira de crédito.

- O reforço na carteira de crédito foi o principal componente para o resultado recorde. Adotamos uma estratégia perfeitamente correta e fomos ousados - disse Bendine.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, comemorou o lucro.

- Mostra o acerto da estratégia anticíclica que nós adotamos e coloca os bancos públicos em lugar de destaque. O BB foi um dos principais baluartes da nossa política.

De acordo com compilação da Austin Rating, os ganhos com crédito dos maiores do setor financeiro foi de 14%, enquanto as receitas da área de tesouraria (aplicação em títulos públicos) avançou 18,1%. Isso foi mais forte no caso dos bancos privados, que no ano passado reduziram a concessão de empréstimos. No Itaú, as receitas com tesouraria subiram 44,7%, enquanto no BB cresceram 3,7% e na Caixa, 0,4%.

Bendine disse que, apesar de a crise ter provocado aumento da inadimplência, os índices de atraso se mantiveram abaixo dos registrados no sistema. Isso ocorreu porque os empréstimos foram concentrados em operações de menor risco, como o crédito consignado. A inadimplência média chegou a 3,3% no quatro trimestre de 2009, contra 2,4% em igual período de 2008 e 3,6% no terceiro trimestre do ano passado.

Colaborou Martha Beck

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