O governo Dilma tem chamado a atenção por seu alto grau de intervenção na economia e nos negócios - apontam tanto analistas daqui quanto do exterior. Há nele, com certeza, alta dose de voluntarismo, que se baseia no princípio de que o governo tudo ou quase tudo pode, bastando, para isso, querer e acionar instrumentos adequados.
Assim, os juros têm de cair e permanecer lá embaixo, sem prejuízo relevante para a inflação. A moeda precisa ser desvalorizada (alta do dólar) sem vacilação, para dar competitividade ao setor produtivo. O caixa da Petrobrás deve ser acionado, seja para garantir preços dos combustíveis acessíveis ao novo consumidor, seja para fazer política de boa vizinhança com países da América do Sul - como Venezuela, Bolívia e Argentina. Em compensação, a Petrobrás está obrigada a participar de toda licitação de área nova do pré-sal, com ao menos 30% dos investimentos. E terá de conceder reserva de mercado para fornecedores nacionais. Do BNDES, por sua vez, ativado com generosas transferências do Tesouro, se espera que dê suporte a um punhado de empresas eleitas para serem os futuros campeões da área, como o grupos Oi, LBR, JBS-Friboi ou as do Grupo EBX. E as concessionárias de energia elétrica têm de operar com tarifas 20% mais baixas. E, até recentemente, qualquer empresário que aceitasse participar de concorrência para obras de infraestrutura teria de se conformar com retorno de apenas 6% - "porque opera com risco zero".
São exemplos do ativismo governamental, que pode ser entendido também como manifestação de um keynesianismo submetido a processos antropofágicos semelhantes aos propostos pelos modernistas da década de 1920.
Mas isso não é tudo. O outro lado da mesma moeda é a impressionante passividade também do governo Dilma.
A inflação, por exemplo, quase sempre provocada por fatores externos, e não por desarranjos internos, convergirá mais ou menos espontaneamente para o centro da meta - mesmo levando-se em conta que os juros permanecerão onde estão "por um período de tempo suficientemente prolongado", como dizem os documentos do Banco Central.
O crescimento do PIB, de 4,0% a 4,5% ao ano, virá naturalmente - asseguram as autoridades, a despeito dos gargalos de infraestrutura e da baixa produtividade da mão de obra num mercado que opera em regime de pleno emprego.
Os investimentos, ora essa, estão garantidos. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está, é verdade, atrasado ou sujeito a coisas esquisitas, como acontece com as obras da transposição do Rio São Francisco, mas, com um pouco de paciência, chegará a bom termo. Mais cedo ou mais tarde, o relutante "espírito animal" do empresário brasileiro se mobilizará. Ninguém se desespere se o reconhecimento do etanol e do biodiesel como commodities internacionais esteja sendo frustrado pela política de combustíveis. As soluções para os problemas virão a seu tempo.
O Mercosul está sendo deformado pelos furos e pelas travas impostas pela Argentina. Mas, aí também, é preciso flexibilizar as disposições dos tratados com alguma dose de tolerância para com os hermanos, que passam por poucas e boas...
Enfim, não é só voluntarismo. É também deixar rolar.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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