Mobilizados pelas redes sociais, sem vínculo político-partidário, sem lideranças e sem reivindicações unificadas, milhares de jovens ocuparam pelo menos 12 capitais brasileiras em protestos generalizados.
Num retumbante e espantoso movimento espontâneo de massa, mais de250 mil pessoas, a grande maioria jovens estudantes universitários e secundaristas, saíram às ruas das metrópoles do país para demonstrar aos governantes (de todos os partidos) que o grau de insatisfação com a classe política transbordou. No Rio, o protesto juntou 100 mil manifestantes e terminou em depredação de prédios públicos. Até em Los Angeles, 200 brasileiros se reuniram em solidariedade aos ativistas no Brasil. A má qualidade dos transportes e a corrupção foram reivindicações presentes em todas as cidades.
"Os protestos não vão parar"
A visibilidade internacional do Brasil gerada pela Copa das Confederações despertou na população a necessidade de revelar a insatisfação com problemas recorrentes, antes restritos ao boca a boca entre os cidadãos e às redes sociais. A onda de protestos nas cidades sedes do evento é só uma demonstração do que pode ocorrer durante o mundial de futebol do próximo ano, segundo especialistas ouvidos pelo Correio. No Distrito Federal, em quatro dias, moradores protagonizaram três protestos contra os gastos com os torneios internacionais em detrimento ao investimento em saúde, em educação e em segurança.
A repercussão das manifestações em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte e em Brasília chamou a atenção dos governos e repercutiu em diversos setores da sociedade. "Nada do que ocorre é aleatório, existe organização e aspectos políticos envolvidos nesse processo. E os protestos não vão parar. No ano que vem, temos Copa do Mundo e eleições. As demonstrações de insatisfação da população serão recorrentes", ressaltou o coordenador do curso de Segurança Pública da Universidade Católica de Brasília (UCB), Nelson Gonçalves.
Para a professora do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Haydée Caruso, o aumento de R$ 0,20 nas passagens de ônibus em São Paulo foi o estopim para o início dos protestos. "Foi uma janela que a sociedade percebeu para colocar as inquietudes para fora. Saímos de um momento de grande apatia. Brasília também se coloca diante desse cenário", analisou. Para a socióloga, pesquisadora na área de segurança pública, violência e cidadania, existe uma série de situações expostas de forma diferente em cada Estado. "Tem a ver com a forma como os grupos de cada localidade age, alguns mais violentos, outros não. O que não pode acontecer é uma atuação policial sem moderação, além de depredação do patrimômio público", complementou.
Haydée considera ainda que as redes sociais ajudam a dar uma dimensão maior e mais rápida aos movimentos. Com base nas novas tecnologias, um planejamento do governo poderia ter sido um diferencial nas últimas manifestações. "Os políticos e os gestores deveriam estar preparados para lidar com isso. Poderiam ter feito um esquema prévio. Se isso for considerado em 2014, a organização pode ser uma arma para garantir a democracia", defendeu.
Atuação policial
O ex- secretário Nacional de Segurança Pública, José Vicente da Silva Filho, ressalta que é difícil controlar a massa, sendo que a organização pode mudar o rumo de um protesto. Episódios como o de sábado, em frente ao Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, no qual 34 pessoas ficaram feridas, demandam a organização da polícia, mas também dos ativistas. "É necessário avisar antes o percurso do movimento, manter uma relação entre manifestantes e polícia. Assim, ninguém sai prejudicado. Principalmente, a população que não participa desses eventos", afirmou.
Para ele, a falta de foco e de liderança em uma manifestação pode ter consequências graves. "Movimentos com uma liderança legitimada são organizados. Em São Paulo, tivemos 241 manifestações neste ano e nada aconteceu. É preciso ter cooperação dos dois lados." José Vicente ressalta que o espaço público precisa ser cuidadosamente preparado para esse tipo reivindicação. "Não pode ser um chamado para convocar todo mundo sem organização. Uma manifestação mal organizada e mal liderada pode gerar ações agressivas das duas partes, provocar o encontro o facções rivais e corre-corre. E correria em uma multidão pode resultar em morte", completou.
Fonte: Correio Braziliense
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