Para levar o Brasil de volta ao crescimento, o governo terá de renegar a política econômica seguida nos últimos quatro anos, adotar a "impessoalidade nos negócios do Estado" e abrir espaço para o setor produtivo trabalhar, segundo o discurso de posse do novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Ele pode ter sido menos direto e usado uma linguagem mais branda para apresentar suas ideias, mas foi bastante claro na mensagem essencial: o "modelo" implantado no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff desarranjou as finanças públicas, mexeu desastradamente na atividade empresarial e prejudicou o crescimento econômico. O ministro se absteve de qualquer menção explícita a seu antecessor, Guido Mantega, ausente da cerimônia. Mas fez referência a "médicos que brilhantemente souberam conduzir a pasta da Fazenda".
Talvez alguém se tenha lembrado de Joaquim Murtinho, engenheiro civil, médico homeopata e ministro de Campos Sales, lembrado como condutor de uma dura política de estabilização financeira. Mas a intenção de Levy era, obviamente, elogiar o ex-ministro Antonio Palocci, seu chefe na primeira gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A homenagem foi além das palavras.
Para formar sua equipe o novo ministro convocou alguns importantes componentes do time de Palocci. Um deles, Jorge Rachid, funcionário de carreira, foi secretário da Receita Federal até 2008, quando o ministro Guido Mantega o demitiu.
O programa indicado pelo novo ministro vai muito além da arrumação das contas públicas, embora deva ser conduzido, principalmente, por meio de instrumentos fiscais. O governo deverá abandonar a política de incentivos tributários a setores selecionados. Além de custosa para o Tesouro, essa estratégia foi um fracasso como tentativa de promoção do crescimento. O ministro poderia ter mencionado, se quisesse defender a mudança, o baixo ritmo de expansão econômica do País nos últimos quatro anos, a estagnação da indústria e a redução do emprego industrial.
Custosa e ineficiente, essa política ainda envolveu, segundo o discurso, a violação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Essa lei, como lembrou o ministro, determina a adoção de "medidas compensatórias para qualquer benefício fiscal ou redução de impostos".
O governo obviamente conhecia essa determinação e por isso tentou mudar o artigo 14 da lei, no qual se estabelecem as condições para a concessão ou a ampliação de incentivo ou benefício.
A menção à Lei de Responsabilidade Fiscal foi especialmente oportuna. A definição de regras para disciplinar o manejo das finanças públicas, em 2000, foi um dos grandes avanços políticos e econômicos dos últimos 20 anos - um passo de enorme importância para a modernização institucional e administrativa do País. Graças a essa legislação, tornou-se mais difícil - apenas para citar um item de grande significado - o uso do gasto público para fins eleitorais em períodos de campanha.
As tentativas de enfraquecimento da Lei de Responsabilidade Fiscal coincidiram, especialmente nos últimos quatro anos, com o abandono progressivo, embora nunca declarado, do tripé da política econômica - meta fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante. No fim do primeiro governo da presidente Dilma Rousseff esse tripé só existia nominalmente. Nos últimos cinco anos a inflação anual esteve sempre na vizinhança de 6%, as intervenções no câmbio se tornaram frequentes e a política fiscal foi desfigurada pelo uso da internacionalmente famosa contabilidade criativa.
O desastre fiscal e a inflação persistente foram componentes de um cenário de amplas distorções, com incentivos fiscais a setores selecionados e crédito favorecido a grupos escolhidos como campeões nacionais. A corrupção foi um complemento vistoso desse quadro de desmandos e de apropriação partidária do Estado. O novo ministro usou a palavra patrimonialismo para referir-se à "pior privatização da coisa pública". Uma das missões principais de Joaquim Levy será, portanto, a reestatização do setor público. Esse é um programa essencialmente antipetista. Será sustentado pela presidente?
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