• Para atender a condicionantes políticos e ideológicos, governo quer recriar a CPMF, um gravame de má qualidade, em vez de se dedicar como deveria ao corte de gastos
O anúncio do chamado esforço fiscal para cobrir o déficit de R$ 30,5 bilhões da proposta do Orçamento de 2016 em nada inovou no tema, apesar de todas as reuniões de fim de semana entre a presidente Dilma e ministros. Mais uma vez, as promessas de cortes efetivos nas despesas públicas são incertas, enquanto o que o Tesouro arrecadará a mais junto aos contribuintes, pessoas jurídicas e físicas, se trata de uma receita garantida, segura.
As medidas alinhadas em entrevista coletiva pelos ministros da Fazenda e Planejamento, Joaquim Levy e Nelson Barbosa, atendem à visão que têm PT e aliados das despesas públicas: preservação dos chamados gastos sociais e uso de impostos para fechar a conta.
Todo o discurso em defesa de cortes funciona como biombo a fim de, além da revisão para cima de alguns impostos, permitir a volta da CPMF, agora com uma alíquota de 0,2% — ou “dois milésimos”, como procurou atenuar Levy —, sonho lulopetista desde que o imposto foi derrubado pelo Senado no final de 2008.
Agora, os R$ 32 bilhões previstos de arrecadação anual do imposto ressuscitado serão integralmente da União, para atenuar a explosão do déficit da Previdência — R$ 88 bilhões este ano e R$ 117 bilhões no ano que vem.
Quanto a ações para eliminar a causa básica desta explosão — o uso do salário mínimo como indexador da Previdência e outros gastos ditos sociais —, nenhuma palavra. A própria proposta de reforma da Previdência, emergencial, continua na fila de espera.
Está claro que o Planalto não se dispõe a assumir a crucial missão de executar as reformas necessárias para atacar a raiz do sério problema de um Orçamento cujas despesas aumentam mesmo na recessão, quando há redução das receitas tributárias.
Cooptado para fazer a defesa da volta da CPMF e da elevação de impostos em geral, Joaquim Levy deu o exemplo da compra de um bilhete de cinema, sobre o qual incidirão os tais ínfimos “dois milésimos”. Ora, o problema é que, sabe bem o economista Joaquim Levy, a CPMF incide em cascata sobre todas as fases da produção e comercialização de bens, de serviços, sobre o consumo, as operações financeiras, tudo. Portanto, o aumento do custo de produção no Brasil, já elevado, será bem maior que os “dois milésimos”. E em nada atenua dizer que a CPMF recauchutada terá o prazo de validade de quatro anos. Ninguém acredita, e com sólidas razões.
No âmbito das despesas, é correto o governo tentar estender o calendário de reajustes para o funcionalismo, no ano que vem. Mas por ser o Planalto muito permeável a pressões sindicais, e as do serviço público são especialmente eficazes em governos do PT, este é um ponto sobre o qual também pairam dúvidas.
Se houvesse interesse concreto do governo em fazer o ajuste pelos gastos, como deveria, ele apressaria a votação da emenda constitucional da DRU (Desvinculação de Receitas da União), já encaminhada ao Congresso.
A DRU é uma invenção desenvolvida no Plano Real, em 1994, para desengessar parte do Orçamento, em que os gastos vinculados a setores — como Educação, Saúde — amarram cerca de 90% das despesas.
Para poderem administrar, os tucanos criaram este mecanismo, que, sempre renovado, mesmo em governos do PT, libera uma parcela dos gastos públicos. Hoje, 20%. Já a proposta da própria Dilma é ampliar a desvinculação para 30%, vigorando até 2023. Ajudaria bastante nos cortes.
É assombroso que num Orçamento de R$ 1,2 trilhão o governo não consiga fazer cortes de pouco mais de R$ 30 bilhões, e opte pela volta de um imposto de péssima qualidade como a CPMF e pela elevação de alíquotas do imposto de renda. Mesmo que a carga tributária do país, na faixa dos 37%, já seja muito alta e funcione como fator negativo na competitividade brasileira no exterior.
Além de a via do aumento das receitas ser um desestímulo aos investimentos, necessários para o país superar a recessão. Está evidente que fatores políticos e ideológicos condicionam o ajuste.
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