- O Estado de S. Paulo
O peixe morre pela boca. Lula não é peixe, nem está para morrer, mas de sua boca, ultimamente, saem petardos que prejudicam a ele próprio e ao movimento que lidera.
Nem sempre o falar de forma compulsiva e com a intenção de confundir interlocutores e plateias beneficia quem o faz. Brincar com as palavras pode muito bem levar a que se brinque com fogo. Não é o que se espera de um político com “p” maiúsculo.
Ao dizer que o MP e os empresários “inventaram a palavra propina” para culpar e difamar os políticos, Lula mente. Quer fazer com que se acredite que as propinas não passavam de “doações empresariais”, prática que teria sido usual desde a proclamação da República. “A diferença – esclarece – é que agora transformaram as doações em propina, e tudo ficou criminoso”.
É contorcionismo demais.
Depois de tantas apurações, investigações e condenações, a opinião de Lula soa como mera provocação, artifício usado para chamar atenção e reforçar a blindagem que o protege. Serve para manter inebriada a legião de seguidores que o veem como um “perseguido”, uma vítima dos poderosos. E tenta construir uma ponte para se projetar como líder dos políticos encurralados.
As frases de Lula não explicam como é que tantos políticos, ele próprio, ficaram milionários com as tais “doações empresariais”. É um enriquecimento suspeito, um escárnio contra o povo trabalhador que o ex-presidente sempre alega defender. São frases que misturam alhos com bugalhos, numa manobra espúria para salvar a pele dos políticos envolvidos com a corrupção. E sair bem na foto.
Só que não.
Com elas, Lula emporcalhou e esvaziou de dignidade a tese que ele e seu partido defendem, a de que a criação de um fundo público de financiamento de campanhas é a única medida que salvará a política no Brasil.
Disse bem o jornalista João Domingos: o discurso de Lula está na “vanguarda do atraso”. Atrapalha, trava, confunde, empurra para trás.
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*Professor titular de teoria política e coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Unesp
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