Após o governo anunciar plano de demissão voluntária para tentar conter gastos, o Ministério Público Federal aprovou aumento de 16,7% para procuradores, que dependerá do STF e do Congresso. União vai propor que servidor que reduzir jornada possa ter segundo emprego.
Em causa própria
Procuradores da República ignoram crise e aprovam reajuste de 16,7% para os seus salários
Jailton Carvalho, O Globo
-BRASÍLIA- No auge da popularidade conquistada por procuradores na Operação Lava-Jato, o Conselho Superior do Ministério Público Federal deixou de lado a mais aguda recessão do país e até as ressalvas do procurador-geral, Rodrigo Janot, para aprovar, ontem, proposta de aumento salarial de 16,7% para a categoria. Se a proposta, incluída no orçamento de 2018 da instituição, for levada adiante, procuradores furariam o teto salarial do serviço público, que hoje é de R$ 33,7 mil, salário de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, como esse tipo de manobra é proibido por lei, os conselheiros esperam, com a decisão de ontem, empurrar os ministros do STF para uma campanha por aumento dos próprios salários. Isso abriria caminho para o reajuste de salários de juízes por todo o país, num efeito cascata bilionário.
O orçamento do MPF aprovado ontem pelo Conselho só tem validade se for aprovado pelo Congresso Nacional e, ainda assim, com os salários dos procuradores vinculados aos vencimentos dos ministros do STF. Na próxima semana, os ministros do Supremo terão reunião administrativa para discutir várias questões, entre elas reajuste salarial.
— Mas a proposta não chega nem perto desse percentual aprovado pelos procuradores — disse uma fonte com acesso ao caso.
O reajuste de 16,7%, que não constava da proposta original de Janot, foi incluído no orçamento a partir de sugestão de subprocuradores com a concordância da futura procuradora-geral, Raquel Dodge. A iniciativa do aumento é da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Não há verba prevista para o incremento salarial. Para ser absorvido nas contas do Ministério Público, o reajuste implicaria o corte de R$ 116 milhões em outros setores da instituição para bancar a nova conta só em 2018.
Hoje, procuradores ganham salários básicos que variam de R$ 28,5 mil a R$ 33,7 mil. Com os ganhos indiretos, entre eles auxílio-moradia de R$ 5.262, auxílio-alimentação e auxílio transporte, acrescidos do aumento de 16,7%, a remuneração dos procuradores passaria de R$ 40 mil. O auxílio-moradia é extensivo inclusive a procuradores da República que têm casa ou apartamento na mesma cidade onde trabalham. A remuneração pode ser ampliada ainda porque procuradores, a exemplo de juízes, têm férias de dois meses. Alguns convertem férias em salários. O último reajuste dos procuradores foi de 4,6%, em janeiro de 2015.
A reunião do Conselho Superior tinha como objetivo central a discussão do orçamento geral do Ministério Público. Era esperado também debate sobre verbas e rumos da Lava-Jato e outras operações de combate à corrupção. Mas a tônica do encontro, de mais de cinco horas de duração, foi o reajuste. Em determinado momento, Janot disse que caberia à sucessora definir se haveria ou não condições de propor o aumento.
Ainda nas discussões, o presidente da ANPR, Robalinho Cavalcanti, criticou a presidente do STF, Cármen Lúcia. Para o procurador, a ministra teria sido uma das responsáveis pelo não reajuste de magistrados e procuradores ano passado.
— A ministra Cármen Lúcia é inatacável do ponto de vista moral. Isso não significa que a atuação dela como gestora não mereça alguns reparos. Ano passado ela cometeu erros graves — disse Robalinho.
Ainda durante o debate, o subprocurador-geral Carlos Frederico chegou a sugerir a proibição de cortes nas verbas de manutenção das unidades do Ministério Público Federal (MPF) e na Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo ele, algumas unidades do MPF estão passando por dificuldades financeiras.
O Conselho decidiu aprovar a criação de comissão especial para definir os cortes sem qualquer restrição das áreas que podem ou não ser atingidas.
— Não tenho nenhum estudo que diga que não será necessário mexer na manutenção das unidades. Essa seria a última decisão a ser tomada — disse Raquel.
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