sábado, 18 de abril de 2020

Em disputa com Maia, governo Bolsonaro acena com cargos ao centrão para formar base

Presidente oferece espaços no 2º escalão para diminuir seu distanciamento com Congresso

Julia Chaib , Danielle Brant , Renato Onofre e Talita Fernandes – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Enquanto intensifica ataques ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tratado como seu adversário, o presidente Jair Bolsonaro tem feito acenos e oferecido espaços no segundo escalão do governo para atrair o chamado centrão e diminuir o seu distanciamento com o Congresso.

Nesta sexta (17), o ministro Walter Braga Netto (Casa Civil) recebeu três líderes do bloco no Planalto. O gesto político ocorreu um dia após Bolsonaro atacar Maia e dizer que o presidente da Câmara quer tirá-lo do poder.

Oficialmente, o líder do Republicanos, Jonathan de Jesus (RR), o líder do PL, Wellington Roberto (PB), e o do PP, Arthur Lira (AL), foram recebidos pelo militar e também pelo presidente com a justificativa de apresentar a eles o centro de comando das ações de combate ao coronavírus.

Contudo, a visita faz parte da estratégia do Planalto de minar a força de Maia e tentar trazer para a base do governo esses partidos, que somam apoios importantes no Parlamento —só PP, PL e PSD têm 116 dos 501 deputados em exercício.

Segundo a Casa Civil, também foram à visita parlamentares do PSL, como Carla Zambelli (SP) e Sanderson (RS).

O centrão é formado por DEM, PP, PL, Republicanos, Solidariedade, PSD e outros partidos e foi fundamental na eleição de Maia no ano passado. O grupo controla a pauta legislativa da Câmara e, até então, dava ao presidente da Casa apoio integral para ser um contrapeso a Bolsonaro.

Na quinta (16), Bolsonaro acusou o presidente da Câmara de conspirar para tirá-lo do posto e qualificou como péssima a atuação do deputado.

"Parece que a intenção é me tirar do governo. Quero crer que esteja equivocado", disse Bolsonaro, em entrevista à CNN Brasil, ao comentar a aprovação pela Câmara de um projeto de socorro aos estados.

Pouco depois, Maia rebateu as acusações e afirmou que Bolsonaro usou “um velho truque da política” de trocar a pauta para tentar desviar a atenção da demissão de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde.

A ida de líderes do centrão ao Planalto nesta sexta foi interpretada por aliados de Maia como um gesto de que esses parlamentares estão tentados a ceder ao apelo do governo.

Aliados de Bolsonaro, por exemplo, já teriam colocado à disposição de alguns partidos espaços importantes. Segundo parlamentares, o PSD poderia indicar nomes para a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e o PP, para o FNDE (Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação).

A escalada de ataques contra Maia só teria sido decidida depois que Bolsonaro teve um aceno mais forte dos líderes de PP, PSD e PL de que ajudariam a compor sua base no Parlamento.

O presidente precisava dessa sinalização como um contrapeso ao provável desembarque do DEM de seu governo.

Depois do ataque a Maia e da demissão do ministro Luiz Henrique Mandetta da Saúde, Bolsonaro praticamente sacramentou a saída do partido --outro integrante do DEM, o fiel ministro Onyx Lorenzoni, aguarda apenas a criação do Aliança pelo Brasil, partido do presidente, para se filiar à legenda.

A aproximação dos três partidos do Planalto é vista com desconfiança no Parlamento. Nas palavras de um líder que não quis se identificar, o governo entrou no modo desespero e está se aproximando “do centrão raiz”, que troca apoio por cargos.

Apesar disso, como há receio de que Bolsonaro não cumpra a sua palavra, líderes têm resistido a atender aos apelos do presidente.

O movimento de aproximação do centrão também tem como pano de fundo a eleição à presidência da Câmara, em fevereiro de 2021.

Dentro do bloco político já há uma avaliação de que Maia tem tensionado a relação com Bolsonaro para se fortalecer e tentar ficar no cargo, com uma manobra para alterar a regra que impede uma reeleição dentro de uma legislatura.

A leitura feita por um grupo, ainda minoritário, é que a manutenção do protagonismo de Maia pode inviabilizar qualquer movimento contrário a ele em fevereiro de 2021.

Do lado do Palácio do Planalto, aliados de Bolsonaro veem nesse movimento um sinal de fragilidade de Maia e querem aproveitar para se posicionar na disputa pelo comando da Câmara no ano que vem.

Em tese, Maia não pode ser candidato, mas aliados tentam articular uma saída jurídica e legislativa para que ele fique no cargo por mais dois anos, em um movimento que também pode beneficiar o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Maia está no seu terceiro mandato consecutivo à frente da Câmara.

Publicamente, diz que não tem pretensão de ficar no cargo. Internamente, porém, não esconde que quer ter a palavra final para indicar, pelo menos, seu sucessor.

Um dos nomes favoritos do presidente da Câmara para sucedê-lo é do líder da Maioria, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Maia também vê com bons olhos uma alternativa de fora do bloco como o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP).

O presidente da Câmara tentou conter o movimento de aproximação de Bolsonaro. Individualmente, chegou a pedir aos líderes que não se reunissem com o presidente de maneira isolada.

Nas últimas duas semanas, os presidentes do Republicanos, Marcos Pereira (SP), e do PSD, o ex-ministro Gilberto Kassab, acompanhados de líderes da Câmara e do Senado, estiveram com Bolsonaro.

Além das conversas com o presidente, deputados do MDB, Solidariedade e até do PSDB foram ao Planalto na última semana para reuniões com ministros palacianos. A ida deles ao encontro foi lida por integrantes do governo como um gesto de descontentamento com Maia.

O presidente da Câmara tem se recusado a sentar para conversar com integrantes do governo e mantendo críticas ao Planalto em suas entrevistas coletivas diárias e conversas com empresários.

Auxiliares do chefe do Executivo avaliam que não cabe ao Poder Legislativo fazer pronunciamentos diários sobre a crise do novo coronavírus e que o deputado do DEM tem se valido desse expediente para se manter no campo de oposição.

O governo também sente a falta do contraponto que Davi Alcolumbre fazia na relação com o Legislativo.

Durante o período da pandemia, o presidente do Senado ficou fora da cena política por quase duas semanas, após ser diagnosticado com o novo coronavírus.

Quando voltou à rotina, ele se mostrou mais próximo a Maia do que ao governo. O ponto de inflexão do presidente do Senado foi a doença. Alcolumbre chegou a parar num hospital em Brasília por dificuldades para respirar.

Nesta sexta, com anuência do presidente do Senado, líderes partidários fecharam acordo para não votar a medida provisória do Emprego Verde e Amarelo, que reduz encargos para patrões que contratarem jovens no primeiro emprego e pessoas acima de 55 anos que estavam fora do mercado formal. A medida perde a validade na próxima segunda-feira (20).

O presidente do STF, Dias Toffoli, fez um gesto de apoio a Maia na sessão virtual desta sexta. O ministro voltou a defender um pacto institucional e elogiou o Congresso.

"O Estado é um só. Você pode ter visões diferenciadas , mas tem que ter responsabilidade. Eu penso que seja o Poder Executivo federal, os governadores de estados e os prefeitos têm tido uma atuação muito responsável. O Congresso Nacional, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, têm tido uma atuação muito responsáveis", afirmou Toffoli em uma live organizada do Banco Safra.

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