Pouco menos de dois anos bastaram para Paulo Guedes perceber que seu poder de ditar a agenda econômica é menor do que pensava
Em novembro de 2018, logo após ser confirmado como ministro da Economia do futuro governo de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes sugeriu que era preciso dar uma “prensa” no Congresso para aprovar a reforma da Previdência o mais rápido possível. Eram tempos de enorme confiança por parte de Paulo Guedes, na condição de futuro “superministro” com plena autonomia para ditar a agenda econômica. Pouco menos de dois anos de governo, contudo, parecem ter bastado para que ficasse claro ao “superministro” que sua capacidade de dar uma “prensa” no Congresso – ou mesmo no próprio governo – para fazer valer suas ideias era bem menor do que fazia crer a lenda criada em torno de seus “superpoderes”.
Na quarta-feira passada, o ministro deu a entender que capitulou. Disse que vai abandonar o “voluntarismo” em sua relação com o Congresso e que, doravante, será apenas formulador de propostas de sua área, sem se envolver em negociações com os parlamentares. Estas, segundo disse, ficarão a cargo dos articuladores políticos do Palácio do Planalto.
Como sempre, Paulo Guedes tentou dourar a pílula. Disse que agora está “dormindo mais tranquilo” porque o governo tem uma base aliada no Congresso e com ela provavelmente imagina ser possível emplacar suas propostas – embora esse bloco seja numericamente insuficiente até para aprovar projetos de lei, que dirá complexas reformas constitucionais.
O fato é que o ministro Paulo Guedes quase sempre pautou sua relação com o Congresso esperando subordinação reverente dos parlamentares. Acreditava que os projetos de interesse do governo e de sua pauta pessoal seriam aprovados sem maiores discussões ou modificações porque, afinal, “o presidente tem os votos populares”, como argumentou ao defender que se desse uma “prensa” no Congresso.
Como se sabe, não foi bem assim que a coisa se deu. Na prática, a agenda econômica foi monopolizada pelo Congresso, que formulou, discutiu e aprovou as principais medidas desde que Jair Bolsonaro assumiu, com escassa participação do presidente ou de seu “superministro” da Economia. E não foram poucas as vezes em que projetos apresentados pelo governo foram ignorados ou substancialmente modificados pelos parlamentares, alguns dos quais por serem simplesmente inexequíveis.
Mas talvez a verdadeira origem da fraqueza evidente do “superministro” esteja dentro do próprio governo. Paulo Guedes tem dificuldade para obter apoio às suas ideias até do presidente Bolsonaro, que não poucas vezes o desautorizou publicamente. A mais recente demonstração de impotência foi o fiasco do “big bang” prometido pelo ministro da Economia – uma série de medidas destinadas a refundar a economia nacional, como sugeria o esplendoroso nome dado por Paulo Guedes ao pacote. Na véspera do prometido anúncio desse pacote, há alguns dias, o presidente Bolsonaro mandou suspender a apoteose cósmica de Paulo Guedes porque não gostou da proposta para o Renda Brasil, programa com o qual pretende substituir o Bolsa Família e imprimir sua marca na área social. Por ora, ficou o dito pelo não dito.
O fato é que a agenda original de Paulo Guedes encontra cada vez menos apoio de Bolsonaro e do Congresso. Parece que faz uma eternidade, mas foi há apenas alguns meses que o ministro da Economia disse que a melhor forma de enfrentar a pandemia, que estava dizimando empregos e renda, era promover reformas – como se não houvesse a necessidade urgente de impedir que milhões de brasileiros passassem fome. Esse alheamento da realidade, somado à crescente sensação de que o ministro da Economia não consegue entregar o que promete e de que não fala a mesma língua que o presidente da República, mina cada vez mais sua autoridade entre os políticos e entre colegas.
Assim, o anunciado recolhimento de Paulo Guedes nada mais parece ser do que a admissão, a contragosto, de que é incapaz de fazer política – único meio legítimo de arregimentar apoio numa democracia – e de que será coadjuvante justamente no momento em que o governo terá de tomar decisões cruciais para as contas públicas nos próximos tempos.
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