Encerrado
o segundo turno, é hora de fazer contas para 2022
Fechadas
as urnas em todo o Brasil (com exceção de Macapá, cuja eleição foi adiada por
causa do apagão), é hora de contabilizar vencedores e perdedores, tentando
extrair sinais que possam iluminar o caminho da política rumo a 2022.
Diversos
rankings podem ser traçados. Em termos de número de prefeituras, o 2º turno não
trouxe nenhuma novidade em relação ao que já havia sido definido há duas
semanas. O MDB manteve a sua histórica liderança, seguido pelos dois principais
representantes do Centrão (PP e PSD) - PSDB e DEM completam o “top five”. Nessa
métrica, o que conta é a capilaridade, e aqui a centro-direita vai muito melhor
que a esquerda, cujos partidos melhor colocados foram o PDT (em 7º lugar), PSB
(8º) e PT (na 11ª posição).
Do
ponto de vista regional, entre os partidos que mais foram penalizados em 2018,
na esteira da Operação Lava-Jato, vemos o PT cada vez mais reduzido ao Nordeste
(seus melhores desempenhos relativos foram no Piauí, no Ceará e na Bahia) e ao
seu enclave acreano. Já os tucanos do PSDB mantêm seus domínios em São Paulo e
no Mato Grosso do Sul - chamando a atenção o fraco desempenho do partido no RS,
onde o governador Eduardo Leite só conseguiu garantir 5% das prefeituras.
Embora tenha mantido seu tradicional posto de dono do maior número de municípios no Brasil, o MDB se vê cada vez mais reduzido aos seus clãs, com domínio forte no Pará dos Barbalhos (43% das prefeituras), na Alagoas dos Calheiros (37%), no Rio Grande do Sul de Eliseu Padilha (28%) e do Norte dos Alves (23%), além do Amazonas de Eduardo Braga (22%). Mas nem tudo são flores: com exceção da vitória de Sebastião Melo em Porto Alegre, o MDB perdeu em todas as capitais desses Estados.
E
já que estamos falando de feudos políticos, eles também estão presentes no
campo das esquerdas. Partidos fortemente personalistas, em que famílias
influenciam as eleições por décadas, ainda têm grande dificuldade de ampliar
seus domínios Brasil afora, como é o caso do PSB da família Arraes, ainda
encastelado em Pernambuco (onde venceu quase um terço das disputas municipais,
inclusive no Recife, onde o bisneto João Campos venceu a neta Marília) e os
irmãos Gomes do PDT, que apesar de terem ganhado 40% das prefeituras no Ceará,
ainda têm baixa penetração em outros Estados (exceção feita ao Maranhão).
Na
tão comentada centro-direita, vemos o DEM se posicionando muito bem no cinturão
da soja, obtendo os seus melhores resultados em Goiás (25% dos municípios do
Estado), Mato Grosso do Sul (19%), Mato Grosso (17%), Tocantins (19%) e
Rondônia (16%). Já o Progressistas (antigo PP) e o PSD de Kassab tiveram seu
melhor desempenho não apenas no Nordeste (principalmente no Piauí, Bahia,
Alagoas e Sergipe), mas também no Sul, com o primeiro se dando bem no Rio
Grande do Sul e em Santa Catarina, enquanto os pessedistas destacaram-se no
Paraná.
Muito
se disse que a onda de renovação na política brasileira perdeu força, mas os
números indicam que 16% dos municípios brasileiros escolheram prefeitos que
nunca haviam disputado uma eleição antes - a maioria empresários, produtores
rurais, advogados e médicos. E aqui também se nota como as legendas mais à
direita do espectro político continuam conseguindo atrair mais novatos com
viabilidade eleitoral, numa tendência já observada em 2018, quando Bolsonaro
chegou ao poder. Entre os partidos que conseguiram emplacar neófitos nas
prefeituras, destacam-se o MDB (104), PP (93), PSD (92), DEM (69) e PSDB (64),
com os partidos mais à esquerda vindo bem atrás, com PDT (57, em 7º lugar), PSB
(39, 9º lugar) e PT (23, no 12º lugar).
Mais
do que atrair candidatos novatos com boas chances de estrear com vitória, os
partidos da centro-direita também se notabilizaram por conseguir “roubar”
políticos de outras legendas. Mergulhando nos dados sobre vinculação partidária
dos prefeitos vencedores em 2020, é possível verificar que entre os dez
partidos com o maior número de prefeituras, o Republicanos foi o campeão na
atração de candidatos de outras legendas - nada menos que 56% dos novos
prefeitos disputaram sua última eleição por outro partido. DEM e PSD também
tiveram em torno da metade dos candidatos vencedores no pleito atual foram
captados em hostes adversárias, principalmente MDB e PSDB.
Se
levarmos em conta a população que passará a ser governada a partir de primeiro
de janeiro nos municípios, a vitória de Bruno Covas sobre Guilherme Boulos na
cidade mais populosa do Brasil garantiu aos tucanos a maior fatia do “mercado
eleitoral” deste ano, com mais de 16% dos brasileiros. Num patamar abaixo, na
faixa de 11% a 12% vêm, pela ordem, MDB, DEM e PSD.
O
resultado do segundo turno jogou uma ducha de água fria nas pretensões dos
partidos de esquerda de sair da disputa com algumas vitórias importantes. É
verdade que houve o que comemorar, como a vitória do cirista Sarto e do
psolista Edmilson Rodrigues sobre candidatos bolsonarista em Fortaleza e Belém,
respectivamente. Mas as derrotas de Boulos, Manuela d’Ávila e Marília Arraes
acrescentam um gosto amargo a um indigesto resultado das esquerdas neste ano.
Tudo
somado, subtraído, dividido e multiplicado, o que podemos extrair de todos
esses números? Em primeiro lugar, ainda que Bolsonaro não tenha lançado o seu
próprio partido, o fato de que os poucos candidatos que ele apoiou terem sido
derrotados pode indicar um arrefecimento do bolsonarismo enquanto movimento.
Por outro lado, para quem não deseja vê-lo no Palácio do Planalto a partir de
2023, uma inclinação para a centro-direita parece ser um caminho muito mais
seguro do que uma guinada à esquerda.
Os
resultados deixam muito claro que se consolidou no Sul, São Paulo e Centro-Oeste
uma forte resistência ao PT e a seus antigos partidos satélites. Por outro
lado, o avanço dos partidos de Centrão no Nordeste sinalizam que o último
bastião do petismo pode ter caído.
De
eleição para eleição, todas as atenções a partir de agora se colocam sobre as
articulações dos partidos da centro-direita. As composições em torno das
escolhas para as mesas diretoras da Câmara e do Senado podem ser um boa prévia
do que pode acontecer até 2022.
*Bruno
Carazza é mestre em economia, doutor em direito e autor de “Dinheiro, Eleições
e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”.
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