Vitória
de Biden deve dar alento a estratégias eleitorais mais centristas; derrota vai
estimular correntes à esquerda
Joe
Biden construiu sua carreira política promovendo o diálogo bipartidário no
Congresso —ficou conhecido como um político
de centro que sabia compor com os republicanos quando necessário. Sua
candidatura à Presidência é uma aposta do Partido Democrata de que é mais
viável uma candidatura de centro que tenha apelo a uma base mais larga de
eleitores do que uma candidatura mais à esquerda que mobilize e estimule o
eleitorado.
Por
isso, uma vitória de Joe Biden terá grande repercussão sobre as estratégias
eleitorais da esquerda, inclusive fora dos Estados Unidos, reorientando o
debate que teve início quando Hillary Clinton foi derrotada por Trump em 2016.
A
esquerda do Partido Democrata argumenta que a vitória de Trump em 2016 se deveu
à concorrência com uma candidata centrista e pró-establishment, fria e sem
grande apelo com o eleitorado. Ela argumenta que Bernie Sanders, o principal
adversário de Hillary nas primárias, oferecia melhores respostas para os
problemas sociais e ambientais do país e que o engajamento que sua campanha
produziria aumentaria o comparecimento às urnas.
Já
a ala tradicional do Partido Democrata atribuía o sucesso de Trump não
ao programa centrista de Hillary, mas a uma combinação de regras eleitorais
arcaicas, jogo sujo do adversário e pequenos erros na condução da campanha.
Debate
semelhante ocorreu também em outros países. Nas eleições francesas de 2017, discutiu-se
se a melhor via para derrotar a extrema-direita de Marine Le Pen seria uma
candidatura centrista, como a de Macron ou Fillon, ou se seria mais efetiva uma
candidatura radical de esquerda, como a de Melénchon. O mesmo debate se deu no
Reino Unido em 2019, quando o Partido Trabalhista entrou na disputa com um
programa de esquerda, tentando recuperar o terreno perdido desde o Brexit.
Uma
vitória de Biden deve estimular estratégias mais centristas em outras partes do
mundo e também no Brasil. Por aqui, ela confirmaria o entendimento produzido
pelo resultado de eleições na região que mostraram que uma acomodação um pouco
mais ao centro permitiu ao MAS recuperar o poder na Bolivia e à esquerda
peronista retomar a Presidência na Argentina.
Por
outro lado, uma nova vitória de Trump, ainda que por pequena vantagem no
colégio eleitoral ou por manobra na computação dos votos, deve dar fôlego às
correntes de esquerda que esperam que uma considerável ampliação dos gastos
sociais ou uma tomada de posição mais clara nas guerras culturais seja o melhor
caminho para engajar o eleitorado e derrotar o populismo de direita.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
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