Não
importa quem vença, Bolsonaro terá que mudar
Arthur Lira (PP) ou Baleia Rossi (MDB)? Simone Tebet (MDB) ou Rodrigo Pacheco (DEM)? A disputa para o comando da Câmara e do Senado entra na semana decisiva, e o envolvimento direto do presidente da República nas negociações comprova que tudo voltou ao normal na política brasileira.
A
Lava-Jato abalou as estruturas do sistema partidário, e a eleição de Bolsonaro
foi anunciada como o fim da “velha política”. Apenas dois anos depois, o
presidencialismo de coalizão, explicado lá atrás, em 1988, por Sérgio
Abranches, dita mais uma vez o ritmo de funcionamento da nossa instável
democracia.
A
partir da próxima segunda-feira a (01/02) o destino do país estará nas mãos de
filhos de políticos tradicionais - Benedito de Lira, Wagner Rossi e Ramez
Tebet. Pacheco, por sua vez, vem de uma família de proprietários de empresas de
ônibus, um setor tradicionalmente dependente e credor de poderosos. Brasília
girou, girou, e parou no mesmo lugar.
Também não é estranho que os quatro principais candidatos à presidência das Casas Legislativas venham de partidos herdeiros dos dois grandes blocos conservadores sob os quais se estruturou nosso sistema político desde a ditadura militar. Enquanto PP e DEM são filhos legítimos da Arena, o MDB de hoje, apesar de ter se despido do “P”, nunca deixou de ser o que restou de mais retrógrado da legenda original de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves.
Como
um pêndulo, todos os presidentes brasileiros desde a redemocratização tiveram
que recorrer aos filhotes da velha Arena ou do velho PMDB para se equilibrar no
poder - embora nem todos tenham conseguido completar a travessia sem cair.
Sarney
convocou, em diferentes momentos, caciques como Jorge Bornhausen, Hugo Napoleão
e Prisco Viana (egressos da Arena) e Iris Rezende (PMDB) para tentar dar base
de sustentação ao Plano Cruzado (1986), influenciar a nova Constituinte para
obter um quinto ano de mandato (1987/1988) ou abafar uma CPI e um pedido de
impeachment (1989).
Quando
as denúncias de corrupção começaram a pipocar, no início de 1992, Collor, que
se elegeu prometendo que “um novo tempo iria começar”, trouxe para seu governo
raposas como Célio Borja, Affonso Camargo e Reinhold Stephanes. Tudo em vão.
Fernando
Henrique se elegeu anunciando uma “aliança programática” do PSDB com o PFL
(atual DEM). Porém, à medida em que as reformas emperravam, ou a sua
popularidade afundava com as denúncias de compra de votos para a reeleição e as
crises do Real, teve que ir fazendo concessões e abrigar em seu ministério
figuras como Renan Calheiros (Ministro da Justiça), Eliseu Padilha
(Transportes) e Ney Suassuna (Integração Nacional).
Lula
e o PT também chegaram ao Planalto garantindo renovação, mas já ao fim do
primeiro ano tiveram que aceitar Eunício Oliveira e Alfredo Nascimento. Veio o
mensalão e embarcaram Saraiva Felipe, Hélio Costa, Márcio Fortes e Silas
Rondeau e companhia limitada. No segundo mandato ainda se juntaram Carlos Lupi,
Geddel Vieira Lima e Wagner Rossi - tudo em nome da governabilidade.
Dilma
já iniciou seu mandato com um amplo ministério que mesclava petistas-raiz com
uma ampla base onde cabiam Edison Lobão, Garibaldi Alves, Fernando Bezerra,
Mário Negromonte, Carlos Lupi e Alfredo Nascimento. Quando sua popularidade
despencou, teve que nomear Marcelo Crivella, Gilberto Kassab, Helder Barbalho,
Armando Monteiro e Henrique Eduardo Alves. Nada disso impediu sua queda no
início de 2016.
A
história brasileira demonstra que crises econômicas, aprovação popular em baixa
e dificuldades de sustentação no Congresso sempre forçam o presidente da
República a ceder à “velha política” - representada tanto pelo Centrão quanto
pelo “pemedebismo”, como diria Marcos Nobre, atual presidente do Cebrap e que
por muito tempo ocupou este espaço.
Desde
a posse, Bolsonaro mexeu pouco no seu time, na maioria das vezes motivado por
intrigas internas (Bebianno, Santos Cruz, Abraham Weintraub e Marcelo Álvaro
Antônio) ou desentendimentos com o ex-capitão (Mandetta e Moro). À exceção da
nomeação de Fábio Faria, até hoje o presidente resistiu a abrir as portas de
seu primeiro escalão para construir alianças partidárias.
Com
índices de rejeição em alta e os colapsos na saúde e na economia, Bolsonaro
certamente terá que engolir em seco e fazer como todos os seus antecessores
para dissipar a tempestade perfeita que se forma no horizonte.
Olhando
o ministério atual, há postos cativos de militares, evangélicos, olavistas,
agronegócio e da predileção pessoal do presidente - além de Paulo Guedes, que
anda bastante sumido ultimamente. Numa eventual reforma ministerial, pastas com
grande orçamento em tempos de pandemia e de uma eventual terceira onda do
auxílio-emergencial serão bastante cobiçadas pelo Centrão: Saúde, Educação e
Cidadania.
Independentemente
de quem vença as eleições para as presidências da Câmara e do Senado, Bolsonaro
certamente sairá perdendo.
*Bruno Carazza é mestre em economia, doutor em direito e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”.
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