O Globo
Na sexta passada, Jair Bolsonaro culpou o
teto de gastos pela falta de ações do governo. “Temos um teto e não temos
dinheiro. Queremos fazer, mas tem cada vez menos dinheiro”, queixou-se. Na
mesma entrevista, ele defendeu torrar R$ 2 bilhões para ressuscitar o voto
impresso. “Já falei com o Paulo Guedes. Tá garantido”, disse.
A incoerência é o menor dos problemas da
ofensiva presidencial. Ao atacar a urna eletrônica, o capitão prepara o terreno
para contestar uma possível derrota em 2022. O discurso atiça extremistas que
sonham com uma insurreição armada. “Vamos criar o caos”, avisou o ministro Luís
Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral.
A pregação golpista não é nova, mas Bolsonaro tem elevado o tom das ameaças. Em janeiro, sugeriu que pode imitar Donald Trump e sua invasão do Capitólio. “Se nós não tivermos voto impresso em 2022, vamos ter problema pior que os Estados Unidos”, prometeu. Em maio, disse que, “se não tiver voto impresso, não vai ter eleição”. “Acho que o recado está dado”, arrematou.
O capitão tem aliados para além da sua
tropa de fanáticos. O procurador Augusto Aras, que não perde uma chance de
mostrar serviço, já fez declarações em defesa do retrocesso. O deputado Arthur
Lira permitiu que a ideia avançasse na Câmara. A relatoria foi entregue ao
bolsonarista Filipe Barros, investigado no inquérito das fake news.
Como diz o ministro Barroso, o retorno ao
voto impresso é uma solução arriscada para um problema inexistente. O sistema
atual já é auditável e funciona há 25 anos sem registro de fraude. A pretexto
de aperfeiçoá-lo, a proposta do governo ameaça o sigilo do voto e cria ambiente
para tumultuar a eleição.
Com o capitão encurralado pelas pesquisas e
pelo avanço da CPI, os alertas começaram a surtir efeito. No último sábado,
presidentes de 11 partidos uniram-se em defesa da urna eletrônica. A frente
incluiu siglas governistas como PP e PL. Sinal de que a ficha começou a cair
até para os bolsonaristas de aluguel. Eles parecem ter percebido que não seriam
poupados numa virada de mesa.
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