Folha de S. Paulo
Novo livro de Benjamín Labatut embaralha
realidade e ficção na vida de cientistas
Adoro ficção, mas leio pouca, e a culpa é
sua, leitor. É que, para tentar comentar na coluna um livro novo toda semana,
dedico quase todo o meu tempo de leitura a obras de não ficção. Penso que, nas
páginas de um jornal, o que não é ficção deve ter prevalência sobre o
inventado. Abri uma exceção para "MANIAC", o novo livro de Benjamín Labatut (já há edição brasileira), e não me
arrependi.
Labatut opera nos limites entre a ficção e a realidade. Como em seu primeiro livro, a matéria-prima é a vida de cientistas e outros personagens salientes em momentos-chave da história. Sem violentar os fatos, ele se dá a liberdade de imaginar situações e fluxos de consciência para iluminar encruzilhadas científicas e morais. No caso de "MANIAC", os escolhidos são o físico austríaco Paul Ehrenfest, o matemático húngaro John von Neumann e o jogador de go sul-coreano Lee Sedol.
Cada um à sua maneira, eles passam por
situações de ruptura em meio a mudanças de paradigma. Ehrenfest testemunha o
assalto da mecânica quântica sobre a física tradicional.
Testemunha também a ascensão do nazismo. Judeu e pai de um garoto deficiente,
ele mata o menino e se suicida. Von Neumann, também judeu, consegue deixar a
Europa. Vai para os EUA, onde contribui para a criação e utilização de bombas
atômicas, entre outras revoluções científicas de que participou. Sedol é uma
das primeiras vítimas da inteligência artificial, para a qual perdeu um
torneio.
Com maestria, Labatut transforma assuntos
potencialmente áridos em leitura agradável. "Agradável" talvez não
seja o melhor adjetivo, já que dela emergem dilemas morais impossíveis. Sou,
porém, mais simpático a Von Neumann do que é Labatut. Gostemos ou não, foi o
hiper-racionalismo, por vezes pintado como monstruoso, do húngaro,
consubstanciado na doutrina militar da destruição mútua assegurada, que poupou
o mundo de um conflito a quente entre EUA e URSS.
Um comentário:
Quer dizer que ele lê um livro por semana,quem dera!
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