O Estado de S. Paulo
PT e ministérios preparam ações pelos 60 anos do golpe de 1964 e militares ficam de orelha em pé
Passado o ato para lembrar um ano da barbárie
do 8 de Janeiro e celebrar a democracia, uma nova preocupação toma conta das
Forças Armadas. É que o PT e a Fundação Perseu Abramo, ligada ao partido,
preparam debates, exposições e documentário para marcar os 60 anos do golpe de
31 de março de 1964, que deu início à ditadura militar no Brasil. Além disso, o
Ministério dos Direitos Humanos articula com outras pastas uma série de
iniciativas para lembrar a data.
Nos bastidores, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, já começou o trabalho na caserna para evitar “provocações”.
Neste 8 de janeiro, por exemplo, ele atuou
para que clubes militares não soltassem notas agressivas ao ato Democracia
Inabalada, promovido no Salão Negro do Congresso. Agora, Múcio tem pedido que
não haja exaltação nos quartéis pela passagem do 31 de março.
A portas fechadas, generais reclamaram da
cerimônia desta segunda-feira, sob o argumento de que conflito não se comemora.
O presidente da Câmara, Arthur Lira, que não compareceu à solenidade, também
discordou do modelo do ato, classificado pelo Centrão como um palanque para o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT.
Atualmente, o maior receio de Múcio é o de
que as manifestações da esquerda para lembrar as seis décadas do golpe de 1964
reabram feridas e estimulem mais um capítulo da polarização e do “nós contra
eles”.
“Nós vamos fazer atividades para relembrar o
golpe de 64 e o desastre que a ditadura foi para o País”, afirmou à coluna o
presidente da Fundação Perseu Abramo, Paulo Okamotto. “Que militar civilizado
será a favor da ditadura?”
Em entrevista ao Estadão, na semana passada,
Múcio defendeu as Forças Armadas ao ser questionado sobre a participação de
militares nos atentados do 8 de Janeiro. “Eu admito que tinha algumas pessoas
ali de dentro que torciam pelo golpe, mas o Exército, a Marinha e a
Aeronáutica, não”, insistiu.
Múcio disse esperar que as investigações da
Justiça identifiquem logo os culpados, mas não quis usar o verbo cobrar. “Sou o
ministro do deixa-disso. O meu papel aqui é o de apaziguar.”
Mas, enquanto Múcio se autointitula
“conciliador”, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes faz
questão de destacar que a página da infâmia, seja em 1964 ou em 2023, jamais
sairá dos holofotes.
“Apaziguamento não representa paz, nem união.
Um apaziguador, como lembrado pelo grande primeiro-ministro Winston Churchill,
é alguém que alimenta um crocodilo esperando ser o último a ser devorado”,
discursou Moraes. A estocada não passou despercebida. Múcio e os comandantes
das Forças Armadas, porém, ficaram calados.
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