terça-feira, 23 de julho de 2024

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão e Paulo Trindade Vieira * - Jogos Olímpicos: o que se ganhou, e se perdeu...

A abertura dos  XXXIII Jogos Olímpicos de Paris 2024 deverá ocorrer  esta semana (26). As competições se estenderão até 11 de agosto .  Estão inscritas 206 delegações , 10.500 atletas, falando 157 línguas diferentes,  e disputando 47 modalidades esportivas. O evento tem um custo estimado em   8  bilhões de euros, recursos aplicados, parcialmente, na remodelação de estádios, ginásios, pistas, piscinas e aparelhos.
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As Olímpiadas  foram criadas em 1896, tentando reproduzir os Jogos Antigos da Grécia. O Brasil participou, pela primeira vez,  em 1920, na Bélgica. De lá para cá  ganhou 150 medalhas, sendo 37 de ouro. Está entre os países com maior diversidade de práticas esportivas no mundo. Apesar do bom desempenho  na  vela e no vôlei, é o judô, no entanto, o esporte que mais medalhas rendeu para o Brasil.  Em Paris, a representação brasileira terá 277 atletas,  a maioria do  sexo feminino . 

 O evento memorável celebra um encontro de atletas com os maiores índices de virtudes  físicas e mentais  humanas. Com a participação de 200 países, os Jogos promovem, em geral,  uma  interrupção temporária  nos conflitos  e guerras no planeta, o que é chamado de "trégua olímpica" (ἐκεχειρία, ekecheiria). Em seguida, vem  competição paralímpica, de atletas com alguma deficiência que encontram no esporte uma "razão de viver".

Quando foram comemorados os 100 anos dos Jogos Olímpicos , nós professores e  alunos de jornalismo e publicidade da Universidade Católica de Brasília estávamos lá na Grécia , cobrindo o evento para 13 blogs, dois jornais, uma revista,  duas redes de televisão e de radio . Era um projeto pedagógico, de  educação informal, nascido em  sala de aula, visando a desprovincialização dos futuros jornalistas , um  primeiro passo  para a profissionalização .
Na ocasião, estavam sendo introduzidas, pela primeira vez, as tecnologias  digitais  e, ineditamente, nosso projeto foi  credenciado para   participar, inaugurando , no jornalismo , uma figura que hoje começa a se espalhar por todos campos das atividades  humanas: os avatares. Lá estava conosco a âncora  Athena Politéia,  construída por um grupo de adolescentes carentes  abrigados pela  Universidade , chamado de "alta habilidades",  mas de quociente de inteligência acima da média. Eram virtudes descobertas pelo educador  Darci Ribeiro, nas andanças e contatos com as  populações isoladas do interior do Brasil.. 

Athena Politéia estava digitalmente habilitada  para relatar os Jogos em dezenas de  idiomas diferentes. No grupo  falavam-se cinco ou seis línguas. Mas, as matérias eram escritas  em português, e repassadas para âncora digital, que ajustava os textos às`suas competências  linguísticas  . Éramos 19 estudantes e dois professores - eu, da História;  Paulo Trindade , da Educação Fisica,  mais o estudante de jornalismo e ciclista, Afonso Morais, com experiência em eventos pré-olímpicos. 

O projeto resultou em um livro, registrando a saga dos futuros jornalistas  de Brasília na cobertura dos Jogos Olímpicos,  intitulado "Projeto Clandestino". O título  marcava a resistência  pedagógica,  dos próprios colegas de magistério, que  classificavam o projeto como uma  "aventura de dois professores".  Mas, a reitora, Débora Niquini,  educadora reconhecida, com experiência internacional,  assumiu conosco e as famílias dos adolescentes a responsabilidade de dar viabilidade á iniciativa. O desembarque em Atenas foi precedido de um treinamento da equipe se estendeu  por um ano reunindo,  nos fins de semana,  mais de 200 interessados, para cumprir um plano de ensino específico de habilitação em  conhecimentos esportivos,  língua e  cultura helênica, ministrado por especialistas  em Jogos Olímpicos e Paralímpicos.

A legitimidade do  projeto  ganhou, de imedidato, o apoio do embaixador da Grécia, Andônio Nicolaides,  que, aliás, escreveu o prefácio do livro, relatando a realização do experiência pioneira. Por seu intermédio e dos religiosos maristas da Grécia, representados pelo  padre George Russos, o projeto foi abrigado  pelo  colégio   Lycée Patissia - Athene , uma das instituições de educação mais importantes do país, que  montou uma redação multimídia dentro da instituição,  equipada com tecnologias digitais para uso da equipe  brasiliense. 

 A  UNODC - Organização das Nações Unidas Contra as Drogas e a Criminalidade chancelou-o projeto, permitindo  o uso da sua logomarca no uniforme da equipe e  a companhia aérea Varig criou uma tarifa aérea especial. O presidente do Comitê Paralímpico das Américas, Andrew Parsons, ajudou a vencer a resistência do credenciamento , e o Comitê Olímpico da Grécia (ATHOC) assumiu a responsabilidade, abrindo uma exceção,  nunca antes registrada dentro do  COI- Comitê Olímpico Internacional,   credenciando os estudantes de jornalismo de Brasília.

Naquele momento, estavam em alta atentados a autoridades e eventos, inclusive em Athenas , nos dias que antecederam a abertura dos Jogos . O  grupo da UCB  elaborou uma "Manifesto pela PAZ", lido nos autofalantes dos Jogos, e desenvolveu uma "cobertura alternativa" que chamou de "Agenda Positiva" .  Configurou  ainda uma matriz de inclusão digital,  reunindo, numa  plataforma eletrônica, tecnologias das diferentes áreas midiáticas ; e  outra   social  em que se incluia, na equipe de cobertura ,  estudantes com deficiência física.

 A estratégia resultou em contatos e entrevistas com alguns medalhistas mundiais. Foram produzidas aproximadamente 300 matérias, em texto, áudio e imagem. O material circulou por um vasto espaço midiático , até em noticiários nacionais . O projeto foi notícia em na midia internacional . A experiência terminou por inspirar, na UCB, projetos finais de curso, dissertações , dois livros, e dois vídeos documentários de Tv e  perto de 4 mil. fotografias.

Encerrados os Jogos , depois cobrir eventos em Athenas, Delfos, Olímpia, Esparta, Delos, Tebas, berço da civilização do mundo ocidental, para além do provincianismo original, os estudantes foram liberados para voltar  ao Brasil pelo roteiro que escolhessem. Um grupo retornou de navio pela Itália, outro  de avião pela Alemanha, outro ainda por Paris e um quarto subiu o mar Adriático e atravessou a Europa por via ferroviária.

O livro "Projeto Clandestino" termina com uma frase lapidar do nosso anfitrião no Colégio, Patyssia,  George Russos: " Les fréres de notre communauté gardent le meiller souvenir des  jeunes qui ont passe´plus de deux mois avec nous". Eles ficavam  admirados com o fato de que  enquanto eles dormiam, nós trabalhávamos. Era a diferença de fuso horário.  Nossa despedida foi marcada com um jantar oferecido em um restaurante,  pelos empresários do bairro onde estávamos hospedados, e o colégio não nos cobrou um centavo pela estadia de 60 dias.  O projeto repetiu-se depois, com outros estudantes,  nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Pequim e de Londres. Até Londres (2012), nossa equipe  de futuros jornalistas foi a única credenciada pelo COI e pelo IPC   para  cobrir os Jogos. Gerou uma teoria: "educação informal" e uma metodologia de trabalho: "cobertura alternativa".

*Jornalistas e professores 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Pensei que o termo ''paralímpico'' não existisse,rs.