quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Lu Aiko Otta - Lupa nos investimentos federais nos Estados

Valor Econômico

Lupa nos investimentos por Estado pode melhorar o direcionamento de políticas públicas para regiões e setores mais necessitados

O Estado cuja economia foi mais impactada pelos investimentos federais no período de 2000 a 2020 não está no Nordeste, Centro-Oeste ou Norte do país, diferentemente do que se poderia supor. É o Rio de Janeiro. Foram R$ 123,4 bilhões, liderados pelos investimentos da Marinha em seu projeto de construção de submarinos.

A segunda colocação é de Minas Gerais, que recebeu R$ 86,7 bilhões principalmente para obras em rodovias. A terceira unidade da Federação entre destinatários de investimentos da União foi São Paulo, com R$ 77,8 bilhões, liderados por ações em desenvolvimento urbano, unidades de saúde e urbanização de assentamentos precários.

É o que mostram dados da plataforma Infere, lançada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) na comemoração de seus 60 anos.

O objetivo do pesquisador Nelson Fernando Zackseski, responsável pela plataforma, é refinar dados que mostram onde os investimentos federais viram canteiros de obras, máquinas, empregos. Futuramente, ele quer chegar a um cálculo sobre a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) em cada Estado.

“É um passo para fazer modelos macroeconômicos de simulação de reforma tributária, de juros, de todos esses movimentos que podem ser calculados com antecedência, para termos uma previsão sobre qual será o impacto em cada unidade da Federação ou região”, informou.

Formulado a partir de bases de dados do Orçamento federal, o Infere não capta o impacto dos investimentos das empresas estatais. Ainda assim, a plataforma oferece a pesquisadores um detalhamento de dados inédito neste século.

A regionalização de gastos federais foi calculada pela Fundação Getulio Vargas até 1985, contou Zackseski. O trabalho foi encerrado e posteriormente retomado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 1991 e 2000. O pesquisador disse que atuou em parceria com o instituto à época. “Então, essa informação só eu que consigo produzir.”

O Balanço Geral da União (BGU), publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional, traz a regionalização dos investimentos, mas em um recorte diferente. Por exemplo, considera como de caráter nacional os investimentos nos submarinos. Também classifica em “nacional” os contratos de manutenção de rodovias do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit).

Assim, cerca de 55% dos investimentos não estão detalhados por unidade da Federação ou por região, afirma Zackseski. É aí que ele centra seu trabalho.

A lupa nos investimentos por Estados pode melhorar o direcionamento de políticas públicas para as regiões e setores mais necessitados, avaliou o diretor de Planejamento e Economia da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Roberto Figueiredo Guimarães. “Há décadas, o planejamento deixou de ser prioridade dos governos brasileiros, que tiveram que lidar com a hiperinflação, endividamento público e reformas estruturais”, comentou.

“Avançar em estimativas de FBCF certamente vai ter impactos positivos nos modelos de previsão de PIB”, comentou o professor Joelson Sampaio, da Fundação Getulio Vargas. A plataforma ainda ajuda a melhorar a transparência e o controle sobre os investimentos federais nos Estados, observou.

Nada disso afasta, porém, o fato que os investimentos públicos e privados estão muito aquém do necessário ao país. Para Zackseski, empreendimentos que “não acabam” nem devem ser interrompidos, como a transposição do São Francisco ou o projeto dos submarinos, deixam pouco espaço para projetos novos que poderiam trazer impacto na transformação regional.

O drama, como sempre, é a restrição fiscal.

São Pedro e o ajuste

O governo projeta em relatório divulgado na última sexta-feira que cumprirá a meta fiscal deste ano. Mesmo assim, seguem as preocupações do mercado com as contas públicas.

Um motivo são os R$ 40,5 bilhões em créditos extraordinários para emergências no Rio Grande do Sul e as queimadas, além da recomposição de verbas do Judiciário.

São despesas que não entram nas contas da meta fiscal. Porém, elevam a dívida pública, que é o principal item de atenção do mercado.

Nem tudo o que foi autorizado em gastos para enfrentar calamidades será usado, informa-se nos bastidores. Estão nessa conta, por exemplo, os R$ 7,5 bilhões destinados à importação de arroz, que não foi realizada.

Dos R$ 53,7 bilhões autorizados para a calamidade no Rio Grande do Sul, R$ 34,8 foram empenhados (comprometidos com um gasto específico) até agora.

Também é possível que fique sem uso parte dos créditos para queimadas, que estão em R$ 514,4 milhões e podem aumentar. A expectativa é que o início das chuvas no centro do país, aguardado para os próximos dias, refreie a edição de novos créditos extraordinários. Até São Pedro está sendo chamado a contribuir com o ajuste fiscal.

 

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