quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Lu Aiko Otta - Tributária favorece quem empreende, diz Appy

Valor Econômico

Para secretário, novo sistema vai igualar o jogo da concorrência entre empresas

O novo sistema de impostos sobre o consumo vai favorecer o empreendedorismo, disse à coluna o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy. Um de seus efeitos será igualar o jogo da concorrência entre empresas, ao reduzir a quantidade de tratamentos específicos que hoje privilegiam setores com maior poder de pressão política.

“Quando o sistema se torna mais neutro, os mais eficientes são favorecidos”, comentou. “E o estímulo à eficiência é positivo para o empreendedorismo.”

O sistema tributário que se consolidou nas últimas quatro décadas abriu espaço para uma miríade de incentivos fiscais. “Hoje, às vezes é mais importante ter capacidade de negociação de um bom benefício fiscal do que ser eficiente”, disse o secretário. As empresas maiores também se beneficiam de planejamento tributário, algo fora do alcance das micro e pequenas, acrescentou.

Essa mudança no ambiente competitivo, porém, não ocorrerá de uma hora para outra. É um processo, explicou Appy. O novo sistema entrará em funcionamento aos poucos, começando com uma fase de testes em 2026, seguida por uma implementação gradual a partir de 2027 até 2033.

A reforma tributária, além disso, não eliminou totalmente os tratamentos diferenciados. Se não houvesse exceção alguma à regra geral, a soma das alíquotas da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), criados na reforma, seria 21,5%. Por causa das exceções, a alíquota-padrão está no momento em 27,97%, pelos cálculos do Ministério da Fazenda.

Além de aplainar o terreno da concorrência, a reforma vai trazer novas opções de tributação para as micro, pequenas e médias empresas, apontou Melina Rocha, consultora internacional em Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) e integrante do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas.

As empresas do Simples Nacional poderão optar por aderir ou não ao novo sistema. Existirá a possibilidade de recolher IBS e CBS pelo modelo novo e os demais tributos no sistema simplificado atual.

“A reforma é positiva porque traz todas as opções para o empreendedor”, disse. “Ele pode fazer os cálculos para ver qual regime vai usar.”

Foi também criada a figura do nanoempreendedor, que não precisará pagar os novos tributos. Vários países possuem instrumento semelhante. Aqui, o nanoempreendedor será aquele que fatura até R$ 3.375 por mês e não é microempreendedor individual (MEI).

No entendimento de Rocha, o sistema regular do IBS e CBS é favorável até mesmo para os nanoempreendedores.

Por não serem obrigados a recolher o IBS e da CBS nas suas vendas, esses empresários podem ficar com a impressão que não são tributados. Mas é uma impressão falsa, disse. Os nanoempreendedores pagarão IBS e CBS quando adquirirem insumos para sua produção. Porém, por estarem fora do sistema, não poderão recuperar os tributos pagos na forma de crédito. Um concorrente que esteja no sistema poderá fazê-lo.

De forma semelhante, as empresas que ficarem no Simples não poderão tomar crédito tributário sobre insumos adquiridos. Além disso, o crédito que elas gerarão a seus clientes será mais baixo, pois a alíquota no sistema simplificado é menor. Por outro lado, se estiverem no sistema regular, elas e seus clientes poderão tomar crédito tributário.

Rocha contou que, mundo afora, empresas muito pequenas foram dispensadas de pagar o IVA por dois motivos: facilitar a formalização e diminuir custos de conformidade.

Aqui no Brasil, porém, o novo sistema tributário terá uma base altamente tecnológica. A ideia é que seja bastante fácil de lidar, inclusive para os nano.

A apuração e declaração dos impostos será automática. O contribuinte receberá a declaração pré-preenchida. Haverá um sistema de recolhimento automático dos tributos, o “split payment”. A única obrigação do contribuinte será emitir a nota fiscal eletrônica, algo que as empresas do Simples já fazem atualmente.

A reforma tributária tem ainda um viés de empreendedorismo ao estimular a inovação, acrescentou Rocha. “Quando uma startup está no início das atividades, elas têm mais despesas em equipamento, em pesquisa e desenvolvimento e geralmente não têm nenhuma saída, nenhuma operação tributária”, disse. “A reforma garante que todo o IBS, mesmo em fase pré-operacional, de investimento, ou na fase em que a empresa está com mais despesas, poderá ser recuperado como crédito.”

No momento, o Congresso Nacional discute dois Projetos de Lei Complementar (PLPs) que detalham o funcionamento do novo sistema tributário sobre o consumo (PLP 68) e o comitê gestor (PLP 108) que o administrará.

O senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator do PLP 68, pretende concluir o texto para que seja votado no plenário até o início de dezembro. Depois disso, o texto será submetido à Câmara dos Deputados. Há coordenação entre as duas casas legislativas para concluir a tramitação ainda este ano.

Pode não parecer, mas a reforma tributária tem muito a ver com o empreendedorismo.

 

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