O Globo
Jogamos de lado, quando não recuamos, na
agenda climática e ambiental, a despeito dos esforços hercúleos de Marina Silva
O presidente Lula manteve o tema do plantio e
da colheita, que usou na mensagem de fim de ano em 2023, no vídeo natalino
deste ano. Mas o otimismo e o balanço detalhado das conquistas do ano passado
deram lugar a uma mensagem em tom genérico. A aposta em resultados ainda mais
fulgurantes no ano seguinte deu lugar a um tom mais cauteloso e emotivo — nesse
caso, claro reflexo da emergência de saúde pela qual ele passou na reta final
de um 2024 em que houve mais intempéries que bonança.
O governo não teve descanso nem espinha dorsal narrativa para se regozijar das conquistas deste ano. Tudo começou aos solavancos, com o Congresso abespinhado pela Medida Provisória mandada na virada do relógio.
A tragédia do Rio Grande do Sul canalizou
atenções e recursos que poderiam ter sido destinados a outras regiões e às
obras do Novo PAC, uma das muitas marcas de gestão que ficaram apagadas e não
produziram ganhos políticos para Lula ou para os ministros das pastas
abrangidas pelo programa.
Depois das cheias vieram as queimadas. Os
bons dados de combate ao desmatamento de 2023, que faziam claro e bem-vindo
contraponto aos anos de passagem da boiada de Jair Bolsonaro, deram lugar a um
ano em que garimpos voltaram a se instalar na Amazônia, e a Floresta e o
Cerrado arderam sob uma forte estiagem que provocou incêndios de proporções
monumentais.
No ano anterior à COP30, que acontecerá no
Pará, o Brasil perdeu aquela aura, que parecia ter recobrado com a vitória de
Lula, de ser visto como terra das oportunidades para o cumprimento dos
atrasados e cada vez mais defasados compromissos com redução de emissões,
investimentos em energia limpa e fim do desmatamento. Jogamos de lado, quando
não recuamos, na agenda climática e ambiental, a despeito dos esforços sempre
hercúleos da ministra Marina Silva.
Na seara econômica, a mais celebrada por Lula
em seu primeiro ano de mandato, algumas conquistas cantadas em prosa e verso se
repetiram, sobretudo o crescimento do PIB e a redução do desemprego. Mas o
controle da inflação e a queda do dólar, mencionados pelo presidente junto com
um, já àquela altura, superestimado “recorde” de investimento nas Bolsas,
ficaram pelo caminho num ano em que a crise de confiança na capacidade de
gestão fiscal do governo foi a tônica desde janeiro, com uma explosão de
descrédito neste bimestre final.
Alguns dos novos programas da gestão Lula 3,
em que o presidente e seus aliados depositavam muitas fichas, pois teriam
impacto eleitoral e político similar às marcas dos dois primeiros mandatos, se
perderam na poeira da estrada. A igualdade salarial entre homens e mulheres,
tão necessária e óbvia, segue uma promessa não concretizada. O Desenrola não
teve o mesmo impacto de iniciativas passadas, e o Pé-de-Meia, uma bela
iniciativa para conter a evasão escolar no ensino médio, ainda não teve o mesmo
poder de transformar vidas e realidades familiares de programas e políticas
como as cotas raciais nas universidades ou o ProUni.
Sem estandartes de grande visibilidade para
ostentar, o governo passou pelas eleições municipais como um cabo eleitoral
anêmico, e o resultado foi o que se viu: vitória dos partidos do Centrão, que
se beneficiaram da festa das emendas Pix, mesmo com as restrições do STF, e que
não dividiram os louros com Lula, de cujo governo são inquilinos espaçosos.
Com isso, outro aspecto exitoso do primeiro
ano deste mandato, destacado por Lula na mensagem alto-astral de 2023, não teve
grande destaque em 2024: a defesa da democracia, a união entre os Poderes e a
promessa de união dos divergentes.
Não por acaso, no curto pronunciamento deste
ano, o presidente preferiu um tom confessional, de agradecimento pelas orações
pelo seu restabelecimento, e trocou a expectativa de uma colheita farta pela
mensagem de que é preciso continuar semeando e adubando. O que ele segue
fazendo, tentando aparar arestas e apagar incêndios mesmo nesse apagar das
luzes de um ano de quebra de safra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário