Folha de S. Paulo
Declarações do próximo presidente americano
sobre Canadá, Groenlândia e Panamá embora amalucadas inspiram preocupação
Trump vai mesmo anexar o Canadá, adquirir a
Groenlândia e invadir o Panamá? O ex e futuro presidente americano
tem uma relação difícil com os fatos, as leis e a ética, de modo que
declarações que, na boca de outro líder global, soariam como más piadas se
tornam, quando proferidas por Trump, merecedoras de consideração.
A ideia de transformar o Canadá no 51º estado dos EUA provavelmente não passa de uma brincadeira. Não porque Trump tenha respeito pela soberania dos países vizinhos, mas pelos mais comezinhos cálculos político-partidários.
O Canadá é mais populoso e mais esquerdista
do que a Califórnia, o mais povoado e liberal dos estados americanos.
Convertê-lo no 51º estado significaria ceder a progressistas mais votos no
Legislativo e no colégio eleitoral —algo a que nem Trump nem os republicanos
estão dispostos.
Já a proposta de arrematar a Groenlândia,
embora tampouco pareça factível, pode ser mais do que um mero chiste. Trump,
decerto, cobiça esse território autônomo com vínculos com a Dinamarca e
o compraria se estivesse à venda, mas não está. E mesmo Trump precisa pensar
duas vezes antes de usar a força contra um aliado da Otan.
O mais provável é que Trump esteja recorrendo
a bravatas para pressionar a Dinamarca a investir mais na segurança do
território. Durante décadas, os EUA pagaram o grosso das despesas com segurança
da Europa.
Num certo sentido, isso já deu certo. A
Dinamarca acaba de anunciar um pacote de defesa de US$ 1,5 bilhão para a
Groenlândia. Entre as medidas, está a criação de duas novas unidades de
patrulha por trenós puxados por cães. Resta saber se Trump se dará por
satisfeito.
As ameaças contra o Panamá são mais críveis.
Os EUA invadiram o país em 1989 e poderiam fazê-lo de novo. Mas a única virtude
de Trump é que ele não gosta de ver os EUA envolvidos em guerras, então é
plausível que esteja falando grosso para arrancar do governo panamenho
concessões comerciais relativas ao uso do canal.
Sabemos que o mundo caminhou para trás quando
precisamos levar piadas mais ou menos a sério.
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