Folha de S. Paulo
Não há pacificação sem justiça e não há
justiça sem direitos humanos
Imagino que Bolsonaro não
seja mais a favor do adágio "bandido bom é bandido morto", agora que
o bandido condenado é ele mesmo. A redescoberta recente de normas de direitos
humanos pelo grupo bolsonarista é, portanto, seletiva; não
expressa de forma alguma adesão irrestrita à proteção da dignidade humana para
todas as pessoas, inclusive golpistas. Jair, o presidiário, tem os mesmos
direitos que historicamente seu campo político desprezou com afinco. E isso
Jair deve agradecer ao tal povo dos direitos humanos.
No que chamaram de visita técnica ao Complexo Penitenciário da Papuda, parlamentares bolsonaristas, entre eles a senadora Damares Alves, listaram uma série de preocupações com as condições do local.
Questões de acesso inadequado à saúde,
alimentação e higiene foram levantadas por eles. Em dez anos, entre 2013 a
2023, o Brasil matou 17 mil presos. Cerca de 95% dessas mortes entre 2018 e
2022 ocorreram por causas evitáveis.
Jair, ao final, vai cumprir sua pena na
Superintendência da Polícia
Federal, não na Papuda. A razão, quem diria, também é por uma questão
de direitos humanos, qual seja: a igualdade de direitos com o caso de Lula.
Bolsonaro, o político, concordaria, ao contrário, em conceder a amigos
tratamento privilegiado e, a desafetos, tratamento inferior. Bolsonaro, o
presidiário, deveria ser grato ao fato de que direitos, diferentemente de
privilégios, não funcionam assim. Direitos humanos protegem a todos, inclusive
presos e, quem diria, inclusive Bolsonaro.
Não para por aí. O gosto doce que sentimos ao
ver generais golpistas na cadeia tem nome, chama-se justiça. Mais
especificamente, justiça de transição, outra norma de direitos humanos.
Nunca na história do país tivemos generais
presos por atentar contra a democracia. O ineditismo do momento atual revela o
que seria possível se tivéssemos feito um processo sério de justiça de
transição pelos golpes de Estado na história brasileira. Não há pacificação sem
justiça e não há justiça sem direitos humanos, inclusive para o Jair.

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