Restou, a nos
alentar, a ideia central da democracia como valor universal. A democracia, com
seus traços falhos e defeitos genéticos herdados da matriz humana, ainda assim,
com seus freios e contrapesos, com as suas sínteses e consensos progressivos
originados do livre jogo político e social, iria construir o mundo melhor
possível.
No entanto, a
partir da segunda década do século XXI, emergiu o que alguns chamam de
populismo autoritário iliberal. Figuras um tanto distantes do perfil de líderes
típicos da democracia liberal clássica assumem o poder. A cena começa a ser
dominada por personalidades exóticas e fora dos paradigmas tradicionais como
Trump, Putin, Orbán, Lukashenko, Netanyahu, Milei. Para quem imaginou um século
marcado pela “Pax democrática”, onde teríamos a combinação de democracia
política e economia de mercado calibrada por uma boa dose de políticas sociais,
nada mais frustrante.
Iniciei a
leitura de “A Hora dos Predadores” do ítalo-suíço Giuliano da Empoli, autor do
clássico “Os Engenheiros do Caos”. Em seu novo livro nos alerta sobre as
fragilidades da democracia contemporânea; a inércia de líderes democráticos,
sobretudo europeus; a hegemonia crescente dos oligarcas das Giants Big Techs e
de autocratas carismáticos; a naturalização das guerras e a manipulação como
ferramenta da conquista do poder a qualquer custo. A Inteligência Artificial,
os ciberataques, o manuseio de dados e a guerra de narrativas, alimentando o
autoritarismo e minando a democracia, o diálogo, a cooperação, a diplomacia.
Assisti a
primeira temporada de “MUSSOLINI: o filho do século”, que retrata o surgimento
e a ascensão do fascismo na Itália. É uma ilustração exemplar de como o
autoritarismo surge nas brechas deixadas pelo cansaço da sociedade com a falta
de capacidade de respostas da democracia para os seus problemas concretos e de
entendimento cooperativo entre lideranças democráticas e instituições.
Corta a cena.
Brasil, 2025. Governo e Senado mantêm impasse em torno da nomeação do novo
Ministro do STF. O STF esboça gerar jurisprudência, em abstrato, para regular
processos de impeachment de ministros de nossa Suprema Corte, invadindo
prerrogativas do Congresso Nacional. Grandes escândalos como o do Banco Master,
das fraudes no INSS, da refinaria REFIT e da ALERJ/CV, envolvendo líderes
políticos, realimentam a decepção dos eleitores com o sistema. Desidratação das
regras fiscais fragiliza as âncoras para o avanço da economia. A um ano das
eleições de 2026, o cenário é nebuloso e indefinido. Pesquisas retratam uma
sociedade fragmentada e dividida ao meio.
Diante de tudo isso, nem as boas notícias vindas do IBGE sobre a evolução da renda e a diminuição da pobreza, da miséria e da desigualdade nas últimas décadas, conseguem afastar os fantasmas que ameaçam nossa democracia.

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