Nessa altura pouco importa se o ex-presidente Lula sabia ou não sabia se a
amiga Rosemary Noronha fazia e acontecia nos escaninhos da administração
pública.
A versão de que se sente "apunhalado pelas costas", repetindo a
fórmula de escape – "fui traído" – adotada no caso do mensalão, fala
por si em matéria de descrédito.
O importante é que se saiba como, quando, onde, por que, qual a extensão e a
dimensão das ligações, sob a proteção de quem atuava a quadrilha da venda de
pareceres descoberta pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro.
Demissões, pentes-finos em contratos, extinção de cargos, tudo isso é bom e
necessário. Mas é insuficiente e ainda soa algo artificial quando se vê o
governo preocupado com o estado de nervos da ex-chefe do escritório da
Presidência em São Paulo.
Ela perdeu o emprego, as sinecuras da família, tem a vida devassada, não
recebeu das autoridades companheiras a atenção que considerava devida depois de
mais de 20 anos de convivência e, por isso, seria um perigo ambulante.
Fala-se isso com naturalidade no PT como se fosse argumento aceitável para
evitar que Rosemary vá ao Congresso explicar suas atividades.
Admite-se a convocação do ministro da Justiça, do advogado-geral da União,
mas aquela que fazia a ponte de negócios em troca de pequenos (ao que se saiba)
favores e esteve na comitiva presidencial em 17 viagens internacionais de Lula,
não pode ir. Teme-se o "despreparo" e o "destempero da
moça".
O líder do governo no Senado, Eduardo Braga, não vê motivo para tal
convocação e o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto, considera uma
"aberração" se pensar em chamar o padrinho de Rosemary. É de se
perguntar por quê. A condição de ex-presidente não faz de ninguém intocável. O
Congresso não é uma masmorra, é Casa de representação popular, foro ideal para
esse tipo de questionamento.
Esquisita a preocupação do Planalto em interditar testemunhas. Se a ideia da
presidente é mesmo apurar e punir, em tese seria a maior interessada em acabar
com essa história de blindagem e se postar de ouvidos bem abertos no aguardo de
revelações úteis.
O incentivo ao silêncio de quaisquer pessoas que possam contribuir para o
esclarecimento dos fatos subtrai confiabilidade dos propósitos saneadores do
Palácio do Planalto.
Espanta a sem-cerimônia com que se mobilizam as forças governistas no
Parlamento em prol das bocas fechadas. Surpreende a indiferença com que os
sinais de que algo anda errado. Por exemplo: segunda-feira o ex-ministro do
Meio Ambiente Carlos Minc deu uma entrevista ao jornal O Globo dizendo que na
época da indicação de Paulo Vieira (agora preso) para a Agência Nacional de
Águas, ouvira dos funcionários que ele "navegava em águas turvas, não era
flor que se cheire".
Pois bem, na ocasião não se buscou saber as razões de os servidores serem
contra a nomeação e agora ninguém no governo teve a curiosidade de perguntar a
Minc mais detalhes. Quando fica tudo por isso mesmo, não dá outra: a história
se repete.
Bate e rebate. A presidente Dilma Rousseff pode até vetar parcialmente a nova lei de
distribuição dos royalties do petróleo e o que se fala é que vetará a parte
relativa aos contratos em vigor. Com isso, vai contrariar 25 governadores,
milhares de prefeitos e a maioria do Congresso.
Gente que vota projetos, emendas, medidas provisórias, convites a ministros
para dar explicações, convocações de gente envolvida em escândalos e criação de
CPIs. Sem contar que embora seja raro acontecer, ainda têm o poder de derrubar
o veto. Na Câmara já há mobilização para pressionar o presidente do Senado para
pôr o veto em exame aos primeiros acordes de 2013.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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