domingo, 4 de agosto de 2013

O superfaturamento de passagens na Esplanada

Documentos aos quais o Correio teve acesso mostram que agências de turismo cobraram do governo valores superiores aos repassados às companhias aéreas. Em um dos casos, a Secretaria de Políticas para as Mulheres pagou R$ 24.800 por um voo, com destino a Nova York, onde a ministra Eleonora Menicucci participaria de compromisso oficial. O bilhete, no entanto, custou metade disso. O Ministério Público Federal trata a prática como fraude, e o Tribunal de Contas da União decidiu editar, na semana passada, novas regras para a contratação das empresas.

Governo paga passagem aérea superfaturada

Governo paga passagem aérea superfaturada Agências contratadas pelo Executivo conseguem aumentar o próprio caixa ao comprar bilhetes por um preço e repassar o custo por valores muito superiores. Em 2012, o Executivo gastou R$ 890 milhões em viagens

Helena Mader, João Valadares

O superfaturamento de passagens na Esplanada true O vaivém de servidores públicos e de integrantes do primeiro escalão do governo pelos ares do Brasil e do exterior custou aos cofres públicos R$ 890 milhões no ano passado. O valor total é uma das pistas que revelam o descontrole dos gastos com passagens aéreas, motivado pela falta de planejamento na compra de bilhetes e também por uma irregularidade identificada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU): a adulteração de bilhetes para superfaturamento das tarifas e a cobrança de taxas inexistentes.

O Correio teve acesso a documentos que mostram como empresas contratadas por órgãos públicos alteram os bilhetes para cobrar do governo federal valores muito mais altos do que os efetivamente praticados pelas companhias aéreas. Diante do desperdício de recursos, o TCU aprovou, na semana passada, mudanças nas regras de contratações de agências com o governo. A meta é acabar com a sangria de recursos públicos.

O gasto de quase R$ 1 bilhão registrado no ano passado reúne apenas as compras da administração pública federal direta. A maioria das licitações dos órgãos públicos escolhe as agências de viagem que oferecem os maiores percentuais de desconto durante a concorrência pública. Para faturar os contratos milionários com o governo, algumas empresas praticam descontos superiores à possibilidade econômica, em percentuais muito acima das comissões recebidas das companhias aéreas. Para fechar essa conta, muitos empresários do turismo incluem nos bilhetes emitidos para o governo valores superiores aos cobrados pelas empresas aéreas, embutindo um lucro oculto. Representantes de várias agências ouvidos pela reportagem reconheceram que essa é uma prática usada para faturar contratos em licitações.

O Correio teve acesso a passagens emitidas para a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) da Presidência da República. Em julho do ano passado, a ministra Eleonora Menicucci viajou a Nova York para um compromisso oficial: a celebração dos 30 anos do Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres. O bilhete de classe executiva emitido pela agência Turismo Pontocom, com a logomarca da empresa, mostra uma tarifa de R$ 24.800,82. Mas um levantamento feito na companhia aérea que emitiu a passagem revela que o bilhete da ministra, na realidade, custou metade do preço: R$ 12.677,31. Os números dos e-tickets e dos localizadores são iguais, assim como as datas. O que muda é o preço.

Funcionários do setor de contratos da pasta, ouvidos anonimamente pela reportagem, revelaram que o problema já havia sido identificado, e que um servidor entrou em contato com a companhia aérea para verificar os valores reais do bilhete, diante do custo de mais de R$ 24 mil repassado pela agência. Dessa forma, foi descoberta a diferença.

Licitação
Em nota, a Secretaria de Políticas para as Mulheres informou que a contratação da Turismo Pontocom ocorreu por meio de processo licitatório, pelo critério de menor taxa para execução do serviço. "O órgão fez a gestão ativa do contrato, verificando a oferta de três cotações para autorização da aquisição de passagens áreas. Alguns casos foram questionados pela SPM e justificados pela empresa", diz a nota. Segundo a secretaria, o contrato terminou no fim do ano passado, e a pasta decidiu não renová-lo.

Em 2012, a Secretaria de Políticas para Mulheres gastou R$ 1.057.893 com passagens aéreas, dos quais R$ 997 mil foram repassados à Turismo Pontocom. A média mensal de gastos com bilhetes foi de R$ 88,1 mil em 2012. Este ano, com o fim do contrato com a empresa, o valor mensal foi reduzido em quase cinco vezes, caindo para R$ 19,5 mil. De janeiro ao fim de julho, a pasta destinou R$ 136,8 mil à compra de passagens.

Outro caso ao qual a reportagem teve acesso foi registrado no Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). Em março de 2012, a agência Daher, sediada no Recife, fechou contrato com o comitê no valor de R$ 8,9 milhões, com validade de um ano. Por meio de dois convênios assinados entre o CPB e o governo, os recursos destinados à compra de bilhete saíram dos cofres públicos e, por isso, devem ser auditados pelo TCU e pela Controladoria-Geral da União (CGU).

Em maio de 2012, já na vigência do contrato, o atleta paralímpico de vôlei Carlos Barbosa viajou entre Rio e São Paulo. Os bilhetes custaram R$ 355,98. Mas, na passagem maquiada, que traz um leiaute semelhante ao oficial da companhia aérea, com o acréscimo da logomarca da agência, a viagem saiu por R$ 1.061,12. O CPB informou não ter conhecimento do caso e garantiu que analisará a situação. A Agência Daher, que tem contrato com o CPB, foi procurada pela reportagem, mas não retornou as ligações.

Fonte: Correio Braziliense

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