domingo, 6 de abril de 2014

Contratos de serviços da estatal são 'caixa-preta'

Decreto presidencial de 1998 e decisão do Supremo dão à Petrobrás a prerrogativa de dispensar licitações na área; em um ano, foram 6.500 acordos

Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A Petrobrás omite dados dos contratos que assina sem licitação. Documentos obtidos pelo Estado apontam que a estatal fechou pelo menos R$ 19,3 bilhões sem processo licitatório no primeiro biênio do governo Dilma Rousseff, a maior parte ligada a serviços.

Escorada em um decreto presidencial de 1998, do governo Fernando Henrique Cardoso, a Petrobrás tem prerrogativa de contratar à margem da Lei de Licitações uma gama variada de serviços, que abrange de construção a manutenção de prédios, aluguel de equipamentos, como helicópteros, vigilância, gastos com advogados e patrocínios culturais.

Supremo. A petroleira se respalda, ainda, em decisões do Supremo Tribunal Federal, que a autorizam a ficar "de fora" das compras tradicionais impostas aos órgãos públicos. A justificativa é que para uma empresa desse setor é preciso agilidade no desenvolvimento das atividades operacionais com economia.

Com base no decreto-lei 2.745/98, a Petrobrás dispensou a licitação em contratos que somam R$ 12,5 bilhões. Outra forma de não aplicar a Lei 8.666/93, é usar a prerrogativa de considerar inexigível o processo licitatório. Tendo como respaldo esse argumento, foram fechados contratos de mais de R$ 6,8 bilhões. Ao todo, em um ano, a Petrobrás assinou mais de 6.500 contratos de serviços.

Regras. Segundo a empresa, entre os casos previstos na legislação em que a licitação é dispensada ou mesmo inexigível está a inviabilidade de competição, em negócios, por exemplo, em que o fornecedor é detentor de patente ou direito autoral. Primeiro, a empresa afirmou, em nota ao Estado, que não divulga informações sobre contratos. Em seguida, esclareceu que, embora existam exceções, "a licitação é a regra para toda e qualquer contratação de obras, fornecimento de bens ou serviços para a Petrobrás".

Os argumentos que permitiram à estatal usar de um "procedimento licitatório simplificado" foram acolhidos pelo STF, que liberou a companhia da necessidade de seguir todas as exigências comuns à máquina pública em situações em que a competição não for possível ou quando houver desvantagem econômica para a petroleira. A autorização, via decreto-lei, foi dada depois que a União deixou de ter o monopólio na cessão ou concessão de jazidas de petróleo ou gás natural, em 1995.

Acima. A contratação na modalidade convite, prevista na Lei de Licitações, é a mais usada pela Petrobrás. Mas mesmo nesse caso, a empresa sai do script da Lei de Licitações, oferecendo aos concorrentes contratos muito acima do valor permitido. Nesse período dos dados aos quais o Estado teve acesso, esse tipo de contratação, pela qual no mínimo três interessados apresentam as propostas, foi responsável por negócios da ordem de R$ 39 bilhões, 62% do total contratado pela empresa entre julho de 2011 e o mesmo mês de 2013.

No entanto, a Lei de Licitações estabelece limites para esse tipo de modalidade. Para obras e serviços de engenharia, o valor estimado para a contratação não pode ultrapassar R$ 150 mil; a Petrobrás, no entanto, celebrou inúmeros negócios com valores vinte vezes superiores a esse teto.

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