• Com a cabeça no travesseiro murmurei: não sei o que seria pior, perder a primeira partida ou perder a última
- Folha de S. Paulo /Ilustrada
Quando vi chegando o dia 12 de junho, data da estreia da Copa e do jogo do Brasil com a Croácia, comecei a sentir o mesmo frio na barriga que os nossos jogadores sentiam à medida que o dia D se aproximava. Eles porque tinham que vencer a partida, e eu por temer que eles a perdessem.
Claro que eu queria que eles ganhassem e acreditava na vitória, mas, de quando em vez, surgia, contra a minha vontade, a pergunta: e se o Brasil perder o jogo de estreia? Aí o tal frio me subia pela barriga até a garganta como uma descarga elétrica.
E era difícil me livrar desse temor porque, de acordo com minha teoria do fator acaso no futebol, qualquer time pode vencer qualquer time. Assim, embora achasse que a nossa seleção era superior à da Croácia, não eliminava a possibilidade de um resultado azarado.
Mas por que esse temor, se aquele seria apenas o primeiro jogo de uma série de três, sendo possível, portanto, reverter a situação mesmo se perdêssemos na estreia? Sim, a lógica é essa mas, neste caso, perder o primeiro jogo seria um desastre.
E sabem por quê? Porque a maioria do povo brasileiro, desencantado como está, não pode perder mais nada. Por essa razão, uma derrota de nossa seleção naquele primeiro jogo teria consequências imprevisíveis.
O leitor sabe muito o que penso do atual governo do nosso país e é de presumir-se que uma derrota da seleção teria repercussão negativa na candidatura de Dilma Rousseff.
É de supor-se que eu veria isso com bons olhos. Hipótese absurda. O que me mantinha apreensivo era a possibilidade de que esse desencanto que já domina a nossa gente pudesse se agravar ainda mais, levando muitos ao desespero e ao desatino.
As pesquisas de opinião mostram que grande número de eleitores se dispõe a votar nulo ou em branco, certamente porque não acredita nos políticos. Isso é muito grave porque abre caminho para aventuras de todo tipo, que podem ir da rebeldia anárquica à entrega do país a um salvador da pátria.
Bem, todo mundo sabe que o Brasil ganhou o jogo de estreia contra a Croácia, trazendo alívio às minhas apreensões. Mas sabe também que não foi fácil, pois começamos perdendo.
Imaginou o frio que senti na barriga quando Marcelo, por mero azar, marcou aquele gol contra? A bruxa está solta, pensei apavorado. De fato, não estava, para meu sossego e a felicidade geral da nação. Logo, Neymar fazia o gol de empate, deixando-me não digo tranquilo, mas esperançoso.
Daí para diante, a seleção foi se mostrando cada vez mais articulada e ofensiva. No segundo tempo, então, os brasileiros dominaram o jogo.
Nesse desempenho de nossa seleção, destacou-se a atuação de Oscar, que infelizmente não se repetiu no jogo contra o México. Mas a verdade é que, quando ele marcou o terceiro gol do Brasil, eu já havia esquecido todas as apreensões do começo e ria feliz a cada lance dos nossos garotos. Não só a partida estava ganha, a pátria estava salva!
Isso até o juiz apitar o final da partida e eu me levantar e aplaudir, feliz como os demais torcedores que assistiam ao jogo comigo: Cláudia, Newton e Mateus. Isso sem contar a Flora que, com um ano de idade, ria à toa, mal sabendo da boa de que escapáramos.
Bem mais tarde, sozinho na cama, já de noite, considerei que aquela havia sido apenas a primeira partida do Brasil, numa Copa do Mundo de que participam excelentes seleções. Pior foi a segunda, contra o México, que terminou em empate. Ainda assim, pode ser que cheguemos à final. E, se chegarmos, ganharemos a Copa ou a perderemos de novo?
Não quero sequer considerar essa hipótese. Pense bem: se a derrota do Brasil para o Uruguai em 1950 continua até hoje doendo na alma nacional, imagine você, se agora, sessenta e quatro anos depois, quando voltamos a disputar o título mundial em casa, perdermos outra vez! Com a cabeça no travesseiro murmurei: não sei o que seria pior, perder a primeira partida ou perder a última.
De qualquer modo, uma coisa aprendi com nossa primeira vitória; aprendi que há, no futebol, um elemento capaz de superar o fator acaso que, conforme minha teoria, torna possível um ótimo time perder a Copa: esse fator é o craque, que pode se chamar Neymar ou Ochoa.
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