sexta-feira, 1 de julho de 2016

Péssimas ideias - Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

A tarefa é inglória, mas vou defender o deputado Jair Bolsonaro. Ou melhor, vou defender que ele tem o direito de exprimir qualquer ideia bizarra que lhe passe pela cabeça sem ter de responder por incitação ao crime.

Penso até que a Primeira Turma do STF, que decidiu torná-lo réu por ter dito asneiras envolvendo uma deputada e o delito de estupro, se apoiou num fóssil jurídico, que é o artigo 286 do Código Penal, para fazer populismo. Numa só tacada, deram um chega para lá numa figura que pessoas civilizadas desprezamos e ainda fizeram uma média com as mulheres.

Não tenho nada a favor de Bolsonaro e nada contra as mulheres, mas me parece difícil conciliar as interpretações mais modernas e amplas do princípio da liberdade de expressão com o tipo penal de incitação ao crime, que já deveria ter sido extirpado do código. Esse é um enquadramento que serve bem para calar ideias e criminalizar grupos, mas que pouco ou nada faz pela paz social.


Se alguém acha que uma conduta hoje qualificada como crime é positiva, deve ter plena liberdade de dizê-lo. A polícia e os tribunais só devem ser acionados se a pessoa tentar cometer o ato. O próprio STF já adotou essa linha, quando declarou que as marchas da maconha são legais.

E não é só a incitação ao crime que deveria ser revogada. Na mesma categoria entram a apologia do crime, leis de desacato, de difamação de religiões e alguns aspectos dos delitos contra a honra. Não estou propondo nada que abalará os alicerces do Estado e da família. Em seguidos relatórios publicados desde os anos 90, a bem-comportada OEA pede que seus membros anulem alguns desses dispositivos, por julgá-los incompatíveis com o artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

No mais, como já ensinava Stuart Mill, precisamos que as péssimas ideias, terreno em que Bolsonaro excele, circulem para que as boas possam confrontá-las e, assim, triunfar.

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