- O Estado de S. Paulo
O céu era o limite para Antonio Palocci Filho, mas, na versão do juiz Sérgio Moro, ele preferiu esgueirar-se por um “mundo de sombras que encobre sua atividade”, atirar-se no colo da empreiteira Odebrecht, fazer as maiores tramoias e reunir somas inimagináveis sob o pretexto da eternização do PT no poder. Palocci poderia ser tudo, mas acaba como um triste troféu de luxo entre os presos da Lava Jato.
Tivesse mantido a aura de médico sanitarista, prefeito bem-sucedido de Ribeirão Preto (SP) e ás do diálogo e da composição, Palocci teria todas as condições para disputar a sucessão de Lula em 2010. Tinha um patrimônio pessoal: sólidas relações em três mundos cada vez mais embolados, o político, o empresarial e o financeiro. E tinha um patrimônio herdado de Lula: o crescimento econômico de 7,5% naquele ano.
Seria imbatível dentro do governo, da base aliada e do próprio PT, já que José Dirceu tinha a máquina do partido, mas jamais foi próximo o suficiente de Lula para ser lançado por ele à Presidência e começou a balançar já no início da era petista, quando seu braço direito, Waldomiro Diniz, foi flagrado pedindo propina... a um bicheiro. Dirceu foi afundando até ser tragado pelo mensalão. Quanto mais ele submergia, mais Palocci emergia.
Dirceu caiu da Casa Civil de Lula em junho de 2005 e Palocci caiu da Fazenda menos de um ano depois, metido numa casa suspeita no bairro mais rico de Brasília e em figurinos bem diferentes do jaleco do médico do bem, cara bonachão, maridão exemplar, político acima de qualquer suspeita. Segundo o caseiro Francenildo Pereira, a tal casa era usada para orgias à noite e para acomodar pastas de dinheiro durante o dia.
O destino ainda deu uma segunda chance a Palocci. Por intermédio de Lula, virou o cérebro da campanha de Dilma Rousseff, caiu nas graças dela e voltou por cima a Brasília: do antigo Ministério da Fazenda, subiu para a chefia da Casa Civil, no Planalto. Mas ele desabou de novo, agora sob o peso de contas milionárias, empresas mal explicadas e negócios esquisitos que, tantos anos depois, continuam vagando como fantasmas – dele e do PT.
O “Italiano”, como Palocci é chamado nos e-mails da Odebrecht, deveria ser o guardião da economia nacional, mas cuidava era das contas milionárias do PT e era pau para toda obra da maior empreiteira do País. É suspeito de dar jeitinhos para ajustar regras de IPI numa medida provisória, favorecer a empresa no nebuloso negócio dos navios-sonda e mergulhar até no projeto de submarinos da Marinha, o Prosub. Como “é dando que se recebe”, Palocci é acusado pelos investigadores de dar uma força para a Odebrecht com uma das mãos e embolsar uma gorda porcentagem com a outra.
Lá atrás, com a queda de Dirceu e de Palocci em 2005 e 2006, Lula chegou a namorar a tese de um terceiro mandato, mas os amigos e o bom senso entraram em campo para dissuadi-lo dessa saída “bolivariana” e só restou para sua sucessão em 2010 o nome de Dilma, que não tinha a liderança política de Dirceu nem a habilidade pessoal e o trânsito de Palocci. Uma tragédia.
A vida não é feita de “se”, mas impossível não derivar para uma reflexão quando Palocci é preso pela Lava Jato: se fosse realmente grande, como se imaginava, ele poderia ter sido o candidato do PT à Presidência em 2010 e toda a história poderia ter sido muito diferente. Mas Palocci, segundo o despacho de Moro, preferiu usar as campanhas e os mais altos cargos da República para achacar empresários, fazer negócios escusos e amealhar a bagatela de R$ 128 milhões (fora os R$ 70 milhões ainda em investigação) para o PT. Moral da história: ao tentar eternizar o partido no poder, ele se transformou no oposto – em agente decisivo para ameaçar o PT de extermínio.
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