Em 2015, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a doação de pessoas jurídicas para campanhas políticas, houve quem apregoasse que a decisão da Suprema Corte inviabilizaria a democracia. Segundo esses alarmistas, as campanhas eleitorais eram necessariamente muito caras, também por força das dimensões territoriais do Brasil. Sem o dinheiro das empresas, o sistema eleitoral simplesmente ruiria, num verdadeiro desastre democrático.
Agora, transcorrida a primeira eleição nacional sem o financiamento por pessoas jurídicas, ficou claro que tais prognósticos não tinham fundamento. Foi perfeitamente possível fazer campanha eleitoral sem dinheiro das empresas. Com isso, foi enterrado de vez o argumento de que as doações de pessoas jurídicas para partidos políticos seriam um mal necessário, como se o sistema eleitoral precisasse fechar os olhos para as distorções causadas pela interferência de empresas na política - as empresas não têm direitos políticos - a fim de assegurar condições econômicas para a realização das campanhas. As empresas não deram dinheiro e a campanha eleitoral transcorreu normalmente.
Trata-se de uma mudança saudável. O País conseguiu se livrar, sem maiores traumas, de uma interferência que gerava inúmeras distorções na representação popular e abria as portas para a corrupção. Mais do que uma doação de caráter filantrópico ou de promoção de determinados ideais políticos, os recursos econômicos que as empresas destinavam aos partidos políticos representavam um poderoso investimento para a consecução de seus interesses corporativos. A interferência econômica deturpava a política.
As eleições de 2018 revelaram também outro dado muito positivo. Não é apenas do dinheiro das empresas que a campanha eleitoral pode se ver livre. Ela também não precisa ser refém do dinheiro público. Reportagem do Estado mostrou que, na campanha eleitoral deste ano, mais da metade dos candidatos não usou recursos do Fundo Eleitoral. Por exemplo, houve 8.591 candidatos a deputado federal em todo o País. Desse total, 4.817 não receberam nenhum recurso do chamado “Fundo Especial de Financiamento de Campanha”, criado especialmente para destinar dinheiro público às campanhas. Em 2018, o valor do fundo foi de R$ 1,7 bilhão.
Os números do financiamento eleitoral deste ano desmontam a tese da suposta necessidade de dinheiro público para financiar os partidos políticos. Muitos candidatos foram eleitos sem usar dinheiro do contribuinte. Além disso, houve também quem tenha usado bastante dinheiro público na sua campanha e mesmo assim foi rejeitado pelas urnas. Dos recursos públicos que o PT recebeu, o partido destinou R$ 4 milhões à campanha da ex-presidente Dilma Rousseff para o Senado. Ela ficou em 4.º lugar na disputa em Minas Gerais. A candidata ao Senado pelo PSB em Goiás Lúcia Vânia recebeu R$ 3,5 milhões dos cofres públicos para a sua campanha e também não foi eleita.
Na Câmara dos Deputados, foi notório o fracasso de duas candidatas. Danielle Cunha, filha do deputado Eduardo Cunha, recebeu R$ 2 milhões do Fundo Eleitoral e mesmo assim não conseguiu se eleger. Cristiane Brasil, filha do presidente do PTB, Roberto Jefferson, recebeu R$ 1,85 milhão do Fundo, mas não obteve votos para a vaga de deputada federal.
Neste ano, ficou claro que a alegada imprescindibilidade dos recursos públicos para a campanha eleitoral é tão frágil quanto a argumentação a favor das doações de pessoas jurídicas. O sistema eleitoral subsiste muito bem sem essas duas interferências nefastas.
Em 2015, o País deu um grande passo ao proibir as doações de pessoas jurídicas. Cabe agora, com a comprovação empírica de que o dinheiro público não é essencial para a campanha eleitoral, também eliminar o financiamento público, que gera graves desequilíbrios. Os partidos políticos são entidades privadas, que não devem ser sustentadas com dinheiro público. Acabar com o dinheiro público na campanha não é uma utopia e tampouco uma loucura. É um passo plenamente possível, que fortalece o papel do cidadão no processo político.
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