O
que dirá se avançamos ou não em 2021 é a coexistência de duas variáveis: o
aumento no número de pessoas vacinadas e decréscimo nas contaminações
Andei
levando pancadas na rede. São os mesmos de sempre como dizia o personagem de
“Esperando Godot”.
Durante
muitos anos, quase que solitariamente apontei os erros que poderiam nos
conduzir ao desastre.
A
ausência de autocrítica os leva a buscar, compulsivamente, culpados, como se eu
fosse responsável por Bolsonaro e não os seus erros cometidos aos longo dos
anos. Aliás, já os enfrentei em eleições como aliados de Sérgio Cabral.
Jamais
votaria num Bolsonaro, conheço-o bem. Ao longo dos anos, mantive-me fiel a
Marina Silva, no passado, vítima de impiedosa campanha do PT.
Apenas
afirmei, assim que eleito, esperar que as instituições brasileiras triunfassem
sobre Bolsonaro. A pandemia não estava nos cálculos, e sim o golpe de estado.
Quando
senti a ameaça próxima de golpe, a denunciei e dispus-me a lutar contra, como
se fosse a última luta de minha vida.
As
pancadas me ensinam o avesso da lição. Elas me aconselham abertura para quem
confiava resiliência democrática, para quem combateu Bolsonaro de forma ineficaz,
para quem se absteve, votou em branco e até os que o elegeram e recuam
horrorizados, diante do resultado de sua escolha.
É
um caminho mais produtivo do que distribuir culpas.
Num
grupo que discutiu o livro “O discurso da estupidez”, de Mauro Mendes Dias,
recebi esta mensagem:
— Reflexão muito bem-vinda. Quanto mais pessoas puderem reconhecer a necessidade de mudar de posição, já estamos avançando. Um dos efeitos do discurso da estupidez é, exatamente, o de não poder mudar, seja pela devoção a crenças deformantes da realidade, seja devido ao gosto que ele suscita pela destruição do patrimônio de valores que nos tornam humanos.”
Nos
tempos de internet, sempre haverá esses ataques maciços. É uma cultura: basta
tirar uma frase do contexto. O importante é olhar para frente, sem raiva.
Diante
de nós surge a esperança da vacina. O Brasil tem um bom sistema de imunização,
dois centros de excelência para fabricá-la: Instituto Butantan e Fundação
Oswaldo Cruz.
Mas
há um grande obstáculo: o próprio Bolsonaro. Sua tática de sabotar a vacina é
espalhar mitos como o perigo de a pessoa virar jacaré.
Além
de cobrar a eficácia do processo, será necessária uma batalha pelas mentes e
corações.
O
que dirá se avançamos ou não em 2021 é a coexistência de duas variáveis: o
aumento no número de pessoas vacinadas e decréscimo nas contaminações.
Um
outro front onde será preciso unidade: a eleição na Câmara, de um modo geral,
distante, intangível.
Naturalmente
é uma escolha interna dos deputados, mas desta vez significa muito. Se
Bolsonaro conseguir capturar a Câmara e eleger seu candidato, não precisará
responder pelas acusações acumuladas, muito menos pelas que pode suscitar no
futuro.
Daí
a importância de se apoiar a Frente Democrática formada para eleger um
candidato independente do governo.
Ela
é um instrumento de maturidade política na qual desaparecem, ainda que
momentaneamente, todos os ressentimentos. Abre caminho para experiências mais
amplas de unidade, que podem ser decisivas para acabar com o pesadelo.
Constituída
por diversas correntes de um só partido, esta unidade foi criada nos Estados
Unidos e teve êxito na tarefa de evitar a reeleição de Trump.
O
interessante é que ao passar por uma experiência quase tão devastadora como
estamos passando no Brasil, foi possível mobilizar a partir de um tema que
parece abstrato e etéreo: a reconquista da alma do país. Para Biden, a alma
representa os valores e instituições americanos.
Os
países têm alma e ela pode ser reconquistada? É algo que daria uma longa
discussão. Muitas pessoas que viram o show do Caetano Veloso, por exemplo,
sentiram-se de volta ao seu país perdido. Outras manifestações artísticas podem
ter o mesmo efeito num Brasil tão diverso. É apenas uma pista.
A
outra, se me permitem a rápida menção ao período de festas, é que já fomos mais
fraternos, apesar das divergências. No tempo da luta pelas diretas, por
exemplo.
O que se perdeu com a política pode ser reconquistado através dela. Pelo menos, são os meus votos.
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