quarta-feira, 22 de junho de 2022

Fábio Alves: A política da inflação

O Estado de S. Paulo

Os Bancos Centrais têm surpreendido e adotado medidas mais duras do que o mercado esperava

É crescente a percepção do mercado de que a pressão política em razão da disparada da inflação – e não necessariamente ingerência de governos – acabou guiando as mais recentes decisões de política monetária dos principais Bancos Centrais do mundo, que surpreenderam por terem sido bem mais duras do que os investidores esperavam.

“É a política da inflação se sobrepondo à economia da inflação”, diz o chefe do Blackrock Investment Institute e exvice-presidente do Banco Central do Canadá, Jean Boivin. Ele se refere, especificamente, ao desfecho da mais recente reunião do Banco Central Europeu (BCE), no último dia 9.

Na ocasião, o BCE manteve a taxa de juros de referência inalterada e sinalizou duas altas nas reuniões de julho e setembro. Mas, enquanto muitos esperavam a sinalização de um ritmo de altas de 0,25 ponto porcentual por reunião, o BCE deixou em aberto a possibilidade de elevar os juros em 0,50 ponto em setembro. E, para além de setembro, prometeu um “ritmo gradual e sustentado” de aperto monetário.

Boivin diz que, com essa sinalização, o BCE acabou subscrevendo a aposta agressiva dos investidores para a trajetória dos juros na Zona do Euro, mesmo que seja improvável que consiga entregar todo o aperto monetário projetado pelo mercado devido ao impacto na economia. Atualmente, a taxa de referência do BCE está negativa em 0,50%.

Apesar do recado mais duro sobre a trajetória dos juros, o BCE piorou suas estimativas para a inflação na Zona do Euro em 2022 (de 5,1% para 6,8%) e em 2023 (de 2,1% para 3,5%), ao mesmo tempo que cortou a projeção de crescimento do PIB neste ano (de 3,7% para 2,8%) e em 2023 (2,8% para 2,1%).

A desconfiança sobre a pressão política da inflação alta também contamina alguns analistas no outro lado do Oceano Atlântico, onde o Federal Reserve (Fed) surpreendeu todos e elevou os juros nos Estados Unidos em 0,75 ponto na sua reunião da semana passada. O BC americano também passou a projetar uma trajetória para os juros mais parecida com a precificação de mercado, com a taxa básica a 3,4% no fim deste ano.

Essa decisão mais dura veio apenas duas semanas depois de uma reunião entre o presidente americano Joe Biden e Jerome Powell, que comanda o Fed. O índice de popularidade de Biden atingiu recentemente o nível mais baixo desde o início do seu mandato, como reflexo dos elevados preços da gasolina e da disparada da inflação. O encontro entre um chefe da Casa Branca e um presidente do Fed é raríssimo de acontecer. É a política da inflação no topo das prioridades.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

A carestia é geral,ao menos no mundo ocidental.