quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Elio Gaspari - A cena de Jefferson não fecha

O Globo

Ao fim, ele acertou o pé de Bolsonaro

Algum dia Roberto Jefferson contará o que ele tinha na cabeça no domingo. Por enquanto, de certo só há uma coisa: uma semana antes da eleição ele acertou o pé de Jair Bolsonaro.

Em décadas de atividade nos tribunais, no Congresso e até mesmo na televisão, ele provou-se pessoa experiente. Nos vídeos das oito horas de tumulto, mostrou-se no completo controle dos nervos. Deu dezenas de tiros de fuzil e lançou três explosivos na direção dos agentes federais que foram capturá-lo. Jefferson controlou seu roteiro. Como advogado, ao insultar a ministra Cármen Lúcia, ele sabia que sua prisão domiciliar seria revogada. Mártir, ele nunca quis ser.

Obteve o descontrole de seus aliados. Bolsonaro demorou para dissociar-se dele. Quando o fez, cometeu a imprudência de dizer que nunca apareceu em fotografias ao seu lado. Bastaram alguns minutos para que aparecessem duas. Esse tipo de reação ilustra a capacidade do capitão de atravessar o espelho da realidade, quer dizendo que nunca foi fotografado com Jefferson, quer praticando sua medicina particular.

Na sua ponta da coreografia, Jefferson trouxe para a cena de sua rendição o notável Padre Kelmon, celebrizado no debate presidencial na função de preposto do bolsonarismo.

Jefferson é um aliado tóxico. Quando ele se alinhou ao bolsonarismo, já havia feito história em 2005, cavalgando a denúncia do mensalão petista com a autoridade de parlamentar da base de apoio do governo. Teve seu grande momento dramático quando interpelou José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil, dizendo-lhe “Vossa Excelência provoca em mim os instintos mais primitivos”.

Os instintos primitivos de Jefferson deram-lhe a publicidade que pretendia. Seus instintos refinados buscavam algo que só ele poderá dizer o que é. Sabia que voltaria ao regime fechado. Dizia ser a semente de alguma coisa, mas não se sabe o que é.

Se dessa semente brotou alguma coisa, a planta mostrou a incapacidade do governo de agir numa crise. Foi assim no atacado da pandemia, e assim foi nesse episódio varejista. Num só lance, viu-se o produto da política armamentista de Bolsonaro. A resistência do ex-deputado tinha um componente teatral. O que acontecerá quando seu papel for repetido por um doido de verdade? Jefferson disse, falsamente, que não matou policiais porque não quis. Não quis porque não pretendia morrer.

O conjunto da obra de Bolsonaro e Jefferson mostra um país abalado por teatralidades enquanto convive com milhões de desempregados e gente passando fome.

Há quatro anos, quando foi eleito, Bolsonaro anunciou que acabaria com o ativismo. Produziu episódios de ativismo inédito, como os de Jefferson e do espetaculoso Daniel Silveira, que perdeu a eleição para o Senado, mas teve 1,5 milhão de votos no Rio de Janeiro. É um ativismo chinfrim, violento na retórica e imprestável nas propostas.

O Brasil tem uma indústria decadente e um agronegócio pujante, ameaçado por embargos internacionais. As universidades vivem ameaçadas de cortes. O SUS sofre um cerco da rapinagem. Morreram mais de 680 mil pessoas na pandemia, e as circunstâncias colocam no centro dos debates o surto de Roberto Jefferson.

7 comentários:

Anônimo disse...

Gaspari continua com seu olhar atento e suas palavras precisas e afiadas! Excelente coluna! Parabéns!

Mais um amador disse...

Ótima coluna !

Anônimo disse...

"O conjunto da obra de Bolsonaro e Jefferson mostra um país abalado por teatralidades enquanto convive com milhões de desempregados e gente passando fome."

O conjunto da obra do genocida é desastroso: desemprego e fome.
E o gado adora - e, com o plano guedes de diminuir remunerações, virá ainda mais fome.

Anônimo disse...

"O Brasil tem uma indústria decadente e um agronegócio pujante, ameaçado por embargos internacionais."

Quatro anos do genocida e a indústria está bem pior do q nos tempos de PT.
O Agro q exporta corre sério risco de embargos internacionais - risco inexistente com LULA.

Tento entender. O q leva empreendedores a apoiar o palerma da República q, sem dúvida, os prejudica. Só pode ser ideologia, o ódio ao PT.

Mas tomar decisões empresariais com base em ideologia, ignorando a melhor opção financeira, É BURRICE.

Ah, agora entendi.

Anônimo disse...

Pior é o Jegue Paulo ir à Washington falar mal do Brasil. Esse cara caolho vive numa redoma de snobismo de ego, impotência mental e malandragem. Fora Paulo Jegue!!!!

Anônimo disse...

Mal-an foi ao FMI, Lula pagou para sair
e criou as reservas que o Paulo Jegue ambiciona torrar. A cabeça desse pedante só funciona para praticar o mal. Tal chefe tal posto Ipiranga.

ADEMAR AMANCIO disse...

O Brasil retroagiu,somos agrários novamente.