O Estado de S. Paulo
Mpumalanga mostra que o mundo está disposto a investir em quem olha para frente
A Província de Mpumalanga, na África do Sul,
é famosa pelo Parque Nacional Kruger, onde se podem observar elefantes, leões,
leopardos, rinocerontes e búfalos – os “big 5” dos turistas que fotografam
animais. Nos próximos anos, é possível que a região fique conhecida por um
motivo mais nobre. Ao que tudo indica, será um exemplo internacional do que os
ambientalistas chamam de “transição justa”.
Um dos casos mais inspiradores apresentados na COP-27, no Egito, foi o plano de descarbonização da África do Sul. O país precisa de bilhões de dólares para mudar sua matriz energética, cuja base é o carvão produzido em Mpumalanga. Na COP-26, na Escócia, apresentou um plano a possíveis investidores. A repercussão foi enorme. Entre a Escócia e o Egito, a África do Sul captou US$ 8,5 bilhões – e colocou o projeto em marcha.
“Trata-se de um plano de longo prazo,
crível e detalhado. Esse é o diferencial”, diz Gustavo Pinheiro, coordenador de
economia de baixo carbono no Instituto Clima e Sociedade. Ele é o entrevistado
no minipodcast da semana. O projeto inclui produção de energia eólica e solar,
carros elétricos e hidrogênio verde.
O plano não se concentra apenas em atrair
investimentos, mas também em criar alternativas para os trabalhadores do carvão
que ficarão desempregados em Mpumalanga. A isso se chama “transição justa”.
Programas de educação e treinamento serão financiados, em sua maior parte, pelo
governo do Reino Unido, responsável pelo maior aporte na fase inicial do plano
– US$ 1,6 bilhão.
A engenharia financeira dos programas de
transição energética vem sendo aperfeiçoada ao longo dos anos, mesclando
recursos de várias fontes. Doações de governos e de filantropia ajudam a
diminuir o risco do capital privado, num processo conhecido como “blended
finance”. Além do Reino Unido, Alemanha, EUA e França estão investindo no
programa sul-africano.
Como lembra Gustavo Pinheiro no
minipodcast, o Brasil já tem 80% de matriz energética limpa. Esse número pode
cair para 65%, segundo ele, por causa de vários penduricalhos incluídos na lei
de privatização da Eletrobras – que preveem, entre outras coisas, a criação de
termoelétricas a gás. É o Brasil chafurdando na lama do passado.
Em vez de investir em energia suja,
poderíamos seguir o exemplo da África do Sul e apostar na economia do futuro –
no caso, um futuro ambientalmente sustentável e socialmente mais justo. Nosso
potencial em energia eólica e solar é imenso, e o caso de Mpumalanga mostra que
o mundo está disposto a investir em quem olha para frente.
*Escritor, professor da Faap e doutorando
em ciência política na Universidade de Lisboa
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