Diante disto, os paradigmas ideológicos ficaram obsoletos e não conseguiam explicar o mundo contemporâneo. As velhas visões sobre as relações entre sociedade e Estado eram repensadas. Um espaço de convergência surgiu entre o liberalismo e a esquerda democrática moderna. Mitos e dogmas eram revistos. Tudo indicava que no livre jogo da democracia iríamos encontrar as respostas. Dialogar, debater, contraditar, buscar consensos progressivos, avançar a realidade combinando as virtudes da economia de mercado, da democracia e as políticas sociais.
Eis que a partir dos idos de
2014 surge um novo fenômeno abalando os pilares da democracia: o populismo
iliberal. Nacionalismo exacerbado, autoritarismo político, confrontação com as
instituições, populismo digital, mobilização de ressentimentos e questionamento
aos sistemas eleitorais. No vácuo dos ressentimentos deixados pelo mundo
contemporâneo surge uma corrente popular de excluídos em busca de líderes
outsiders, que servissem de ferramenta contra o sistema política tradicional.
Os partidos políticos já vinham perdendo capacidade de vocalização com o
fenômeno das redes sociais e a fragmentação social. Esta onda teceu um fio que
interligou Donald Trump, Marine Le Pen, Boris Johson, Giorgia Melloni, Viktor
Orbán, Matteo Salvini, Erdogan e Bolsonaro.
Agora foi a vez de Javier
Milei, na Argentina, vencer com grande margem de votos. Milei se autodefine
como um anarcocapitalista ultraliberal. Figura histriônica, cujo o símbolo de
campanha era uma motosserra para cortar em pedaços a estrutura do Estado, agressivo
e com propostas ousadas como o fim do Banco Central e a dolarização da
economia, conseguiu captar o sentimento majoritário do povo argentino, diante
de uma herança peronista marcada por uma inflação de 150% a.a. e 40% da
população na faixa da pobreza.
Duas questões essenciais têm
que ser decifradas, sob pena de devorarem a democracia: a) por que setores
políticos não populistas, equilibrados, sérios, talhados para o diálogo
democrático, têm tanta dificuldade de se comunicar e se relacionar com a maioria
de cidadãos-eleitores despolitizados e insatisfeitos com o mundo que os cerca e
o sistema político tradicional? b) Como conectar as eleições presidenciais,
onde as ideias são firmes e mobilizadoras, com as eleições parlamentares, que
passam à margem das grandes ondas de opinião pública, garantindo condições de
governabilidade para o mandatário eleito?
Vale pensar sobre
isto!
*Economista e Professor. Ex-Deputado Federal
pelo PSDB-MG. Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais (2003-2010).
Diretor-Executivo do IFI – Instituição Fiscal Independente do Senado.
2 comentários:
Muito claro e didático! Parabéns ao autor e ao blog que divulga seu trabalho!
Verdade.
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